Explode o número de pessoas fora do mercado de trabalho
Trabalhadores desalentados chegaram a quase seis milhões em fevereiro. Com desempregados e subocupados formam um exército de 32,6 milhões de profissionais subutilizados
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O número de trabalhadores desalentados chegou a 5,952 milhões em fevereiro. Recorde na série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, que começa em 2012, a cifra é 26,8% maior do que a registrada um ano atrás, no trimestre móvel encerrado em fevereiro de 2020. Significa que 1,259 milhão de pessoas desistiram de procurar novas vagas no período, por acreditarem que não terão vez no mercado.
Esse foi o oitavo mês consecutivo em que o desalento cresceu a uma velocidade superior a 20% no país. “O dado do desalento surpreendeu. Eu esperava que mais gente tivesse voltado ao mercado de trabalho em fevereiro, pois a pandemia ainda não tinha piorado como em março”, disse à ‘BBC’ o economista Bruno Ottoni, pesquisador do IDados e do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV).
“Esse aumento tem um motivo bem claro, que é a questão da pandemia. Tem muita gente com medo (de ficar doente), muita gente que sabe que as atividades estão fechando, e por isso acaba não saindo para procurar emprego”, pontua o economista.
“A pandemia expulsou parte das pessoas do mercado de trabalho, e elas não conseguiram voltar”, afirmou à ‘Folha de São Paulo’ Hélio Zylberstajn, professor sênior da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA-USP). Também coordenador do Projeto Salariômetro, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), ele defende que o país preciso cumprir duas etapas para recuperar os empregos.
“A primeira coisa é a vacina. E a segunda é voltar a crescer. Para isso, não tem jeito: é preciso atrair investimentos. O governo não consegue investir. A gente precisa de aportes privados para trazer o mercado de trabalho de volta para a vida”, argumenta.
“O mercado de trabalho reflete como lidamos com a pandemia. Enquanto não vacinarmos a força de trabalho, vamos ter dificuldades”, comenta Sérgio Firpo, professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper). Para o economista, o quadro provoca uma “depreciação do capital humano”. “É como se estivéssemos jogando fora recursos humanos neste momento. O capital humano se deprecia porque não é utilizado. Isso tem efeitos perversos”, lamenta
Desemprego também é recorde
Apesar de estarem disponíveis para trabalhar, os desalentados não entram no cálculo da taxa de desemprego. Para ser considerado desempregado, pelos parâmetros internacionais de estatística, é preciso estar ativamente buscando uma vaga. Essa dinâmica tem um impacto indireto importante sobre a própria taxa de desemprego, já que as pessoas que estão fora da força de trabalho não entram na conta.
O desalento reduz ainda a taxa de participação no mercado de trabalho, que é a relação entre a quantidade de pessoas que estão de fato empregadas ou à procura e o total de pessoas em idade para trabalhar – uma boa medida para enxergar o chamado “desemprego oculto”. Em fevereiro, a taxa de participação foi de 56,8%, 4,9 pontos percentuais a menos do que o registrado no mesmo período do ano passado, 61%.
Caso o percentual tivesse se mantido constante, conforme calcula Alberto Ramos, Diretor de Pesquisa Econômica para a América Latina do Goldman Sachs, a taxa de desemprego teria atingido expressivos 21,2% em fevereiro. Essa discrepância sinaliza que o desemprego tem um espaço mais restrito para melhorar.
“A taxa pode não reduzir de forma significativa quando a epidemia for controlada, à medida que os desalentados voltem a procurar emprego e retornem à força de trabalho em ritmo mais acelerado do que a criação de novas vagas”, escreveu o economista em relatório enviado a clientes.
Além do desalento, a Pnad Contínua acompanha a chamada subocupação: os que trabalharam no mês de referência, mas menos horas do que gostariam ou precisariam. Em fevereiro, 6,9 milhões de pessoas estavam nessa situação.
A pesquisa agrega esses e outros grupos na taxa de subutilização da força de trabalho. Mais ampla, a medida é um bom retrato dos problemas do mercado de trabalho que vão além da taxa de desemprego.
No trimestre móvel encerrado em fevereiro, o volume de pessoas subutilizadas no Brasil chegou a 32,6 milhões. Nesse total estão incluídos os 14,4 milhões oficialmente desempregados, os 5,9 milhões de desalentados, os 6,9 milhões subocupados e outros 5,4 milhões que compõem a força de trabalho potencial junto com os desalentados.
Bruno Ottoni batizou esse último grupo de “indisponíveis”. São os que gostariam de trabalhar e chegaram a procurar, mas não podiam no período de referência da pesquisa. Aí entram, por exemplo, mulheres que tiveram filhos e têm de ficar em casa porque não há disponibilidade de creches na região em que moram.
Da Redação