“Inteligente e nunca de holofotes”, diz parceira de Marisa em greve de 1980

Para a cientista social Zeneide Ribeiro, Dona Marisa deixou legado para as mulheres que ajudam na construção do País e lutam por uma sociedade melhor

Zeneide relembra a época em que a sua família e a de Dona Marisa passavam férias juntas na colônia do SMABC. Foto: Kamilla Ferreira/ Agência PT

“Uma mulher sensível, mas ao mesmo tempo forte e determinada. Tudo o que ela propunha, ela fazia”. É assim que Zeneide Ribeiro, esposa do ex-dirigente sindical e amigo de Lula, Devanir Ribeiro, descreve a amiga de longa data Dona Marisa Letícia.

Dona Marisa morreu nesta sexta-feira (3), às 18h57. Deixou o marido, Luiz Inácio Lula da Silva, e quatro filhos.

Juntas, Zeneide e Marisa, lutaram durante a greve dos metalúrgicos na década de 1980, protestaram contra a prisão de seus maridos, participaram da construção do PT e, mais do que isso, construíram uma amizade.

“A participação da Marisa e de todas as mulheres foram fundamentais e muito importante durante a greve. Enquanto os nosso maridos estavam presos, a gente participava das assembleias e incentivávamos os outros trabalhadores a não desistirem.”

Zeneide lembra da época em que seu marido, Lula e outros dirigentes foram presos depois da intervenção federal nos sindicatos dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e de Santo André e enquadrados na Lei de Segurança Nacional, em 19 de abril.

Na época, o Brasil ainda vivia sob a ditadura, no segundo ano de mandato do último dos generais-presidentes, João Figueiredo. O governo proibiu a realização de assembleias no estádio da Vila Euclides (atual 1º de Maio), em São Bernardo, e os trabalhadores passaram a se reunir na Igreja Matriz.

Sempre muito engajadas, as mulheres organizaram uma passeata em apoio aos sindicalistas presos, mesmo com a grande resistência da polícia.

“Nós, mulheres, resolvemos fazer uma caminhada pela libertação deles. A condição da polícia era de que só mulheres fizessem parte da caminhada, os homens não poderiam ir pela rua. Estava cheio de policiais, cachorros e tropa de choque, mas resolvemos  enfrentar. Eu , Marisa e outras mulheres de dirigentes saímos na frente, fizemos um cordão só de mulheres. Quando a polícia vinha jogar bomba, a gente sentava no chão”, explica.

As mulheres dos dirigentes sindicais seguiram juntas, de braços dados, na linha de frente da caminhada. Foto: TVT

Sempre juntas, elas compravam o pano, faziam as faixas, pintavam e pediam a libertação de Lula, Devanir e todos os outros presos. Foi um momento histórico.

“A concentração foi na Igreja Matriz de São Bernardo e a passeata foi pela Marechal Deodoro. Nós, mulheres, fomos pela avenida e os homens aplaudindo pela calçada, já que eles não podiam descer para a rua. Seguimos na linha da frente, de braços dados, para incentivar as outras mulheres, que estavam com medo. Chegamos até o Paço Municipal”, detalha.

Além de vivenciarem juntas o momento histórico da greve de 1980, Zeneide e Marisa acompanharam a construção do PT. “Nós acompanhamos tudo quando nasceu o PT. Coragem a gente já tinha e, depois que surgiu o partido, fomos nos engajando cada vez mais”. diz Zeneide.

Mulher guerreira

“Militante, corajosa, determinada e muito parceira do Lula. Sem ela, ele não poderia ter feito tudo o que ele fez. Ela é uma mulher guerreira. Sempre esteve ao lado dele, ajudando, aconselhando. Nunca foi uma mulher de holofotes, ela era humilde e muito inteligente”.

Para a amiga, Dona Marisa estava sempre ao lado de Lula, dando apoio e ajudando em todos os momentos. “Ela era muito companheira, teve grande participação política na vida dele, estava sempre presente.”

Lula e Dona Marisa durante encontro das mulheres e militantes, que marcou os 10 anos da lei Maria da Penha. Foto: Heinrich Aikawa/ Instituto Lula

Amizade de gerações

A amizade entre Marisa e Zeneide passou para as gerações seguintes. Zeneide conta que elas era muito unidas, e seus filhos, por terem a mesma faixa etária, cresceram juntos.

“Na época das férias das crianças, costumávamos ir para a Colônia de Férias do Sindicato dos Metalúrgicos em Ubatuba e Praia Grande.”

Legado

Zeneide lamenta a morte da amiga, mas ressalta que ela deixou um grande legado para as brasileiras.

“É uma tristeza muito grande, mas com certeza ela deixou um legado para todas as mulheres. Ela foi uma figura muito importante na vida do Lula, apoiando, dando estrutura, ajudando e sempre participando. O legado que a Marisa deixou deve servir como exemplo para todas nós, mulheres, que construímos este País e que estamos buscando melhoras para a sociedade. O Lula está sentindo muito, mas a militância, as mulheres principalmente, que têm uma participação muito importante na politica, vão dar continuidade a este legado”, torce.

Por Carla Escaleira, da Agência PT de Notícias

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