Jornalista que denunciou caso de Mariana Ferrer é condenada pela Justiça de SC

Em mais um atentado à liberdade de imprensa, Schirlei Alves foi condenada pela 5ª Vara Criminal de Florianópolis a um ano de prisão em regime aberto e a pagar multa de R$ 400 mil

Sinasefe

Punição à jornalista Shirlei Alves configura uma violência de gênero

O ofício de uma jornalista é reportar os fatos concretos, calcados em provas e evidências, para que a opinião pública tenha ciência dos acontecimentos, e possíveis responsáveis sejam punidos. Em uma democracia plena e forte, com uma justiça isenta e imparcial, a imprensa é livre, respeitada e valorizada. Entretanto, no Brasil, tem sido cada vez mais rotineiro ver o Poder Judiciário atuando em desfavor das mulheres. O caso mais recente, de 15 de novembro, é o da jornalista Schirlei Alves, condenada a um ano de prisão em regime aberto e R$ 400 mil de multa por difamação.

A decisão foi proferida por uma juíza da 5ª Vara Criminal de Florianópolis. O motivo da pena foi a reportagem, publicada em 2020, “revelando as ofensas e humilhações sofridas pela influenciadora digital Mariana Ferrer durante uma audiência de instrução em que ela participava na condição de vítima.”

De acordo com o portal A Pública, “o argumento central da juíza para condenar a jornalista de forma absurdamente desproporcional é uma expressão usada por esta: “estupro culposo”, uma figura de linguagem que pretendia resumir as alegações da defesa e do promotor de que o empresário não sabia que o estupro era… um estupro. Por estar em sentido figurado, a expressão, que inexiste juridicamente, foi colocada entre aspas, levando a juíza a concluir que era uma falsa citação dos autos.”

Diante de tamanha arbitrariedade, diversas entidades de proteção à liberdade de imprensa divulgaram manifestações de apoio à jornalista. O Observatório Nacional de Combate à Violência contra Jornalistas e Comunicadores, os órgãos e as organizações que o compõem, afirmou ser  “preocupante que o jornalismo, ainda mais considerando que esta é uma cobertura de evidente interesse público, seja utilizado para criminalizar uma profissional pelo seu trabalho”.

Ainda segundo o Observatório, “este é mais um caso que atenta contra a liberdade de imprensa e configura uma violência de gênero contra Schirlei Alves, tanto porque a jornalista silenciada é uma mulher, como porque ela reportava sobre as violências que uma mulher sofreu em uma audiência judicial.”

A Comissão de Mulheres Jornalistas da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) também se posicionou diante do caso: “A tentativa de silenciamento de Schirlei Alves, que já vinha sendo perseguida desde a publicação da reportagem e sua repercussão, é um violento atentado à liberdade de imprensa, ao exercício profissional do jornalismo e à democracia e merece nosso mais veemente repúdio. Enxergamos, ainda, um preocupante viés misógino do Judiciário ao condenar uma mulher por denunciar violência contra outra mulher.”

No X (antigo Twitter) a jornalista agradeceu as mensagens de apoio e solidariedade: 

Anne Moura, secretária nacional de mulheres do PT, criticou a decisão e lamentou o posicionamento da juíza perante o caso: “É extremamente preocupante vermos  que até no Judiciário as mulheres estão sendo perseguidas por seu gênero. Nós, da Secretaria Nacional de Mulheres do PT, nos solidarizamos com a jornalista Schirlei Alves e esperamos que esta decisão seja revista, e que a liberdade de imprensa siga protegida para que mais denúncias possam ser feitas sem que isto afete a segurança e a dignidade das profissionais de imprensa, que durante quatro anos foram agredidas e xingadas pelo inelegível.”

O portal Gênero e Número, especializado em reportagens relacionadas à temática das mulheres, reportou que o caso de Alves, que após a publicação da matéria, teve sua vida transformada com perseguições e ameaças, não é isolado, infelizmente: “42% das jornalistas mulheres já sofreram violência on-line devido à sua profissão e 25% precisaram fechar as contas em redes sociais após sofrer ataque on-line.” 

Relembre o caso 

Para quem não se recorda, o caso teve enorme repercussão nacional e, a partir da reportagem, surgiu, em 2022, a lei Mariana Ferrer, que, acrescenta à Lei de Abuso de Autoridade o crime de violência institucional contra vítimas e testemunhas de infrações e crimes violentos. A revitimização, como ocorreu com a influenciadora. 

A matéria de Alves revela que Ferrer, diante da conduta do advogado de defesa do acusado, disse ao juiz do caso: “Excelentíssimo, eu tô implorando por respeito, nem os acusados são tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus, gente. O que é isso?”

De acordo com a Agência Brasil, “a reportagem denunciou as condutas do promotor e do juiz durante o julgamento do empresário André de Camargo Aranha, acusado de estuprar Mariana Ferrer em um clube em Florianópolis. A matéria se baseou em vídeos gravados da audiência de instrução que mostram que Mariana Ferrer foi humilhada e constrangida pelo advogado de defesa do acusado, Cláudio Gastão da Rosa Filho.”

Da Redação do Elas por Elas, com informações de A Pública, Agência Brasil, Gênero e Número e Intercept

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