Jovens negras lutam para existir
As jovens negras são as mais afetadas pelo desemprego, precarização e violência, contextos ainda mais acirrados no governo de Bolsonaro
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No dia 8 de junho, a designer de interiores Kathlen Romeu foi atingida por um tiro durante uma ação da Polícia Militar na zona Norte do Rio de Janeiro, na comunidade de Lins de Vasconcelos. Kathlen era uma mulher de 24 anos, negra e estava em sua primeira gestação. O assassinato dela comoveu o país e evidenciou mais uma vez quem é o alvo das balas perdidas no Brasil: juventude negra.
No Brasil, o racismo, que gera desigualdade e exclusão, é o fator mais determinante sobre a ocupação da juventude negra nos espaços e quando o assunto são mulheres negras, as barreiras são ainda maiores.
Para além do racismo, a misoginia, o machismo também acompanham a vida das mulheres negras. A dirigente nacional da Juventude do PT, Nádia Garcia, fala sobre esses desafios. “Os desafios das jovens mulheres negras hoje são muitos, o racismo, o machismo, a misoginia fazem parte da nossa vida desde o momento do nosso nascimento. Vivemos nessa sociedade do ódio, onde o simples fato dos nossos corpos ocuparem espaço, espaços que antes eram demarcados como proibidos para nós, gera um ódio gratuito a nossa pessoa ou a representação que a nossa pessoa tem”, ressalta.
O momento acirrado da conjuntura e de crise provocada pelo governo Bolsonaro, limita até o direito de ir e vir das mulheres negras e um dos principais desafios é o da sobrevivência. “Nós somos a parte menos vacinada da população, nós somos a parte que menos tem acesso a comida dessa população, nós somos a parte que menos tem acesso à saúde. Nos querem loucas ou mortas”, destaca Nádia Garcia.
É a camada da sociedade jovem,feminina e negra que está representada nos altos índices de desemprego e pobreza, fruto da crise social e econômica desde o Golpe de 2016, mas aprofundada com o governo Bolsonaro.
O levantamento “A sensibilidade do desemprego às condições da economia para diferentes grupos de trabalhadores”, desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em 2018, apontou que entre os grupos sociais, as mulheres negras experimentaram o maior aumento absoluto na taxa de desemprego.
No 4º trimestre de 2020, segundo dados do IBGE, mais da metade dos 13,9 milhões de brasileiros desempregados eram mulheres e 60% se autodeclaravam preta ou parda. Ainda com base nesse estudo, 35,3% tinha entre 14 e 24 anos e 40,6% tinha até o ensino médio incompleto.
“O Brasil tem uma geração que não tem direitos, é uma classe trabalhadora fruto da intensa organização de uberização das organizações de trabalho. Essa geração é a ‘nem nem’: Nem têm direitos e nem conseguem direitos. Há muita dificuldade de inserção no mercado de trabalho formal”, aponta a vereadora de Uberlândia (MG), Dandara Tonantzin.
Participação política
Em uma recente participação no Fórum LBT, realizado pela Secretaria Nacional de Mulheres do PT, em parceria com a Secretaria Nacional LGBT, a vereadora Bia Caminha, uma das mais jovens eleitas do país nas eleições de 2020, falou das dificuldades em atuar como uma jovem mulher, negra na Câmara Legislativa de Belém (PA) e compartilhou a experiência de ser barrada todos os dias nos espaços destinados aos parlamentares, porque não a reconheciam enquanto vereadora.
Abandono escolar
Além de acentuar as desigualdades entre a população negra, a pandemia também serviu para aumentar o índice de abandono escolar. Um estudo do Instituto Unibanco e Porvir revelou o impacto do racismo no ensino médio. Pelo menos 40% dos jovens negros, entre 15 e 17 anos, não possuem computador ou internet em casa.
Por residirem em áreas vulneráveis com menor cobertura de serviços de saúde, com menos acesso a computadores e internet para acompanhar as aulas remotas, eles tiveram mais dificuldades para seguir aprendendo em 2020. Pelo menos 70% da população negra enfrenta a pandemia sem reservas financeiras, sendo que no país 75% da população negra é pobre.
“Os desafios das jovens mulheres negras hoje pra além de conseguir vivenciar e derrotar a ofensiva da classe burguesa da população que acha que nós não podemos ocupar espaço a não ser da portinha da empregada, ou as ruas com prostituição, é nos mantermos vivas pra conseguir fazer essa resistência. Temos que ter comida no prato, vacina no braço, temos que ter casa, temos que conseguir trabalhar, temos que criar nossos filhos e tudo isso é um desafio para nós mulheres negras”, destaca Nádia Garcia.
Redação Elas por Elas