Juliana Cardoso é a primeira indígena eleita deputada federal na história do PT

Eleita por São Paulo, Juliana é nascida e criada na Zona Leste, periferia de São Paulo, e vai compor a bancada do cocar na Câmara Federal

Em 2022, o PT ampliou em 80% a bancada feminina na Câmara Federal e realizou um feito histórico: elegeu a primeira mulher indígena para deputada federal em toda a história do partido.

Eleita pelo estado de São Paulo, Juliana nasceu, cresceu e vive até hoje na Zona Leste, periferia de São Paulo. Atualmente, é vereadora da capital paulista e é a única mulher indígena na Câmara Municipal de São Paulo e a única mulher da bancada do PT na cidade.

“Resgatar minha ancestralidade vivendo em meio urbano, é um ato de resistência e de afirmação de identidade. Agora, vou ampliar essa atuação, levando nossas lutas para Brasília como deputada federal”, afirmou Juliana.

Ao longo do mandato na vereança, Juliana Cardoso criou o Conselho Municipal dos Povos Indígenas e esteve ao lado dos indígenas nos enfrentamentos pelo direito à terra, contra a desocupação em diversos pontos de aldeados na capital paulista.

A eleição da primeira deputada federal indígena entra para a história do PT. Tani Rose Ribeiro, coordenadora nacional do setorial indígena do PT, reforça a importância dessa conquista para o partido e para o Brasil, principalmente na luta contra o bolsonarismo que assola as terras indígenas.

“Muito importante a eleição de Juliana Cardoso na Câmara Federal, principalmente em São Paulo. Nos somaremos à bancada do cocar para ecoar mais vozes dos verdadeiros donos dessa terra que é o Brasil, e buscaremos cada vez mais nossos espaços de representação na política brasileira, pois muito antes do Brasil da coroa, existe o Brasil do cocar”, afirmou Tani.

Quem é Juliana Cardoso

Periférica, filha de mãe negra e pai indígena, Juliana tem 42 anos e começou a militância política em Sapopemba, bairro da periferia da zona leste de São Paulo, onde nasceu e cresceu. Com formação arraigada nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) da Igreja Católica e na Pastoral da Juventude, ela vem de uma família petista, lutadora das pautas populares na periferia. Casada e mãe de dois filhos, Mariah Clara, 16, e Luiz Eduardo, 8, Juliana tem uma trajetória de defesa dos direitos da classe trabalhadora, principalmente junto aos movimentos sociais e de cultura da periferia.

Foi eleita vereadora aos 28 anos de idade e, ao longo de quatro legislaturas, tem realizado um mandato popular como instrumento de luta em defesa da população mais vulnerável.

“Reconhecer-se indígena vivendo na periferia de uma metrópole urbana é um processo complexo, se considerarmos que a estrutura social oprime e deslegitima nossos laços ancestrais – fazendo com que a gente se sinta irreconhecível e inadequado o tempo todo”, desabafa Juliana sobre as dificuldades que enfrentou para reafirmar suas origens que vêm, principalmente, do lado paterno.

O pai de Juliana, Jonas Cardoso, conhecido como Juruna, nasceu em Nioaque-MS, hoje Aquidauana, originário dos Terenas. Na década de 60, parte da família migrou para São Paulo, primeiro na cidade de Santos e depois em Campinas, todos urbanizados. A maioria decidiu trabalhar na área de saúde. Durante os primeiros cinco anos de vida de Juliana, ela não conseguiu visitar a família no Centro-Oeste, porque as agendas de férias do pai e da mãe não coincidiam.

No entanto, quando Jonas tirava férias do Hospital do Tatuapé, ele sempre ia para Mato Grosso do Sul de onde trazia muitos peixes enormes, pintados e baiacus. O retorno dele era sempre uma festa.

A tragédia

Em uma tarde de domingo, Juruna foi sumariamente assassinado com um tiro enquanto estava sentado com Juliana, de então seis anos de idade, no colo como sempre fazia. Eles moravam na COHAB Teotônio Vilela, em Sapopemba. Dias antes, Jonas tinha liderado uma caminhada dos movimentos sociais com o caixão do enterro do prefeito por conta do valor do IPTU.

Na época, os resquícios da ditadura ainda permeavam a sociedade e a mãe de Juliana, dona Ana Cardoso, foi aconselhada a não ir a fundo nas investigações porque poderia “trazer outras mortes”.

No mesmo dia e na mesma hora, outros parentes indígenas de Juliana foram mortos da mesma forma em Mato Grosso do Sul.

A ruptura abrupta e cruel com seus laços indígenas, permeados por muita dor e medo, fez com que o processo de reconexão desabrochasse apenas alguns anos mais tarde.

Juliana estava sentada no colo do pai, Juruna, quando ele foi morto por um tiro

Na luta é que a gente se encontra (e se reconhece)

No início dos anos 2000, durante a segunda gestão do PT na prefeitura da cidade de São Paulo, Juliana foi responsável pela Coordenadoria de Participação Popular, na Secretaria Municipal do Verde. O departamento era responsável por fazer a ponte entre o governo e os indígenas aldeados e não-aldeados da capital paulista.

Foi nesse momento que Juliana pôde se reconectar com suas origens, se reconhecer na aldeia, enfrentar o trauma e transformar a dor em luta, causa e resistência.

E esse compromisso se estendeu para a atuação ao longo dos quatro mandatos em que foi eleita vereadora, na defesa dos povos indígenas da cidade de São Paulo – tendo a memória e a justiça de seu pai e de seus parentes em cada passo.

 

Indígenas do PT

Além de Juliana Cardoso, o PT também elegeu o deputado federal indígena Paulo Guedes, por Minas Gerais. No Amazonas, a candidata a vice-governadora Anne Moura, disputa o segundo turno ao lado de Eduardo Braga. Anne Moura é indígena, manauara e secretária nacional de mulheres do PT.

Ana Clara Ferrari

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