Leia a íntegra do discurso de Lula no Fórum Empresarial do BRICS

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou na abertura da cúpula em Joanesburgo, na África do Sul, nesta terça-feira (22)

Ricardo Stuckert

O presidente, durante a abertura do Fórum Empresarial do BRICS, nesta terça-feira (22)

Gostaria de saudar o governo sul-africano pela realização deste Fórum Empresarial.

Quero expressar minha satisfação por compartilhar este evento com os demais líderes dos países do BRICS.

Agradeço também a todos os empresários presentes, em especial a direção do Conselho Empresarial, que completa dez anos.

O estabelecimento de parcerias entre os setores privados é uma dimensão muito relevante do BRICS e que dá vida e continuidade às relações entre os países.

Desde a primeira Cúpula de Chefes de Estado e de Governo, nossa participação na economia global vem se ampliando.

Já ultrapassamos o G7, e respondemos por 32% do PIB mundial em paridade do poder de compra.

Projeções indicam que os mercados emergentes e em desenvolvimento são aqueles que apresentarão maior índice de crescimento nos próximos anos.

Segundo o FMI, enquanto os países industrializados devem desacelerar seu crescimento de 2.7%, em 2022, para 1.4% em 2024, o crescimento previsto para os países em desenvolvimento é de 4% neste ano e no próximo.

Isso mostra que o dinamismo da economia está no Sul Global e o BRICS é sua força motriz.

O comércio total do Brasil com o BRICS aumentou de 48 bilhões de dólares em 2009 para 178 bilhões em 2022 – um crescimento de 370% desde a criação do grupo.

O estoque de Investimento Externo Direito do BRICS no Brasil cresceu 167% entre 2012 e 2021, atingindo 34,2 bilhões de dólares. Hoje, quase 400 empresas do bloco operam no Brasil.

Depois dos últimos seis anos de retrocesso e estagnação, o Brasil vai voltar a gerar empregos de qualidade, a combater a pobreza e a aumentar a renda das famílias brasileiras.

Apresentei há duas semanas o novo PAC – Programa de Aceleração do Crescimento. O Plano prevê a retomada de empreendimentos paralisados, aceleração dos que estão em andamento e seleção de novos projetos.

Trata-se de um programa amplo, com muitas oportunidades que podem interessar aos investidores dos países do BRICS.

Esperamos mobilizar 340 bilhões de dólares para a modernização de nossa infraestrutura logística, com investimentos em rodovias, ferrovias, hidrovias, portos e aeroportos.

Também daremos prioridade à geração de energia solar, eólica, biomassa, etanol e biodiesel. É enorme o nosso potencial de produção de hidrogênio verde.

Estabeleceremos parcerias entre o governo e os empresários em todas essas áreas, sob a forma de concessões, Parcerias Público-Privadas e contratações diretas.

Para que o investimento volte a crescer e gerar desenvolvimento, precisamos garantir mais credibilidade, previsibilidade e estabilidade jurídica para o setor privado.

Por essa razão tenho defendido a ideia de adoção de uma unidade de conta de referência para o comércio, que não substituirá nossas moedas nacionais.

As necessidades de financiamento não atendidas dos países em desenvolvimento continuam muito altas. A falta de reformas substantivas das instituições financeiras tradicionais limita o volume e as modalidades de crédito dos bancos já existentes.

A decisão de estabelecer o Novo Banco de Desenvolvimento representou um marco na colaboração efetiva entre as economias emergentes.

Nosso banco conjunto deve ser um líder global no financiamento de projetos que abordem os desafios mais urgentes de nosso tempo.

Ao diversificar fontes de pagamento em moedas locais, expandir sua rede de parceiros e ampliar seus membros, o NDB constitui uma plataforma estratégica para promover a cooperação entre países em desenvolvimento.

Nessa estratégia, o engajamento com o Banco Africano de Desenvolvimento será central.

No plano multilateral, o BRICS se notabilizou por ser uma força que trabalha em prol de um comércio global mais justo, previsível, equitativo.

Não podemos aceitar um neocolonialismo verde que impõe barreiras comerciais e medidas discriminatórias, sob o pretexto de proteger o meio ambiente.

A partir de dezembro, o Brasil ocupará a presidência do G20. A presença de três membros dos BRICS na troika do G20 será uma grande oportunidade para avançarmos temas de interesse do Sul Global.

Já contamos com a participação da África do Sul, mas a representatividade do grupo será ampliada com o ingresso da União Africana e de outros países do continente.

Senhoras e senhores,

Ao voltar a presidência de meu país, estou retomando as diretrizes da política externa brasileira.

Começamos a reconstruir a integração sul-americana.  Retomamos nossas parcerias com os Estados Unidos, a China e a União Europeia.

Sediamos a reunião de Cúpula dos Países Amazônicos.

Ainda nos faltava o retorno do Brasil à África.

É inaceitável que, em 2022, o comércio do Brasil com a África tenha diminuído em um terço com relação a 2013, quando era de quase 30 bilhões de dólares.

O fluxo comercial com a África ainda corresponde a apenas 3.5% do comércio exterior do Brasil.

Nossa rede de acordos comerciais também é incipiente. Os acordos do Mercosul com a África Austral e com o Egito datam de meu segundo mandato.

Hoje, mais de 65% das exportações do Mercosul para a África foram para países com os quais não há acordo em vigor.

Há muito espaço para crescer.

Além de um passado que nos une, também compartilhamos uma visão comum de futuro.

Em meus dois primeiros mandatos, o continente africano foi uma prioridade. Fiz doze viagens à Africa e estive em vinte e um países.

O Brasil está de volta ao continente de que nunca deveria ter se afastado.

A África reúne vastas oportunidades e um enorme potencial de crescimento.

Para discutir o relançamento do comércio com o continente, o Brasil reuniu os chefes dos setores de promoção comercial de todas as nossas representações em países africanos aqui em Joanesburgo, em junho passado.

A África está construindo um ambicioso projeto de zona de livre comércio: 54 países, 1,3 bilhão de pessoas e um PIB de mais de US$ 3 trilhões.

Neste continente, que é o mais jovem do mundo e será o mais populoso em 2100, são inúmeras as oportunidades para produtos brasileiros como alimentos e bebidas, petróleo, minério de ferro, veículos e manufaturas de ferro e aço.

A África tem 65% das terras agricultáveis disponíveis no mundo e forte vocação para ser uma potência agrícola, com capacidade para alimentar seu povo e oferecer soluções para a segurança alimentar global.

Aliando investimento e tecnologia, o Brasil desenvolveu técnicas modernas de agricultura tropical que podem ser replicadas com sucesso.

Por meio da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, fizemos do Cerrado uma área de alta produtividade agrícola e podemos replicar essa experiência na Savana africana.

Meu governo também retomou as políticas públicas de apoio à agricultura familiar, imprescindível para combater a insegurança alimentar e a fome que atinge nossos continentes.

O Programa Mais Alimentos, que relancei em junho passado, permite que pequenos produtores possam ter acesso a financiamento para compra de tratores, implementos e colheitadeiras.

Assim como no passado, uma versão do Mais Alimentos para a África deve ser retomada como mais uma vertente da cooperação Sul-Sul brasileira. 

A África também está no coração das transições digital e energética.

A cobertura de Internet já abrange a maior parte da população africana e se multiplicam centros de inovação digital e empresas de serviços tecnológicos financeiros.

O fortalecimento do complexo industrial da saúde brasileiro pode gerar amplas oportunidades de colaboração.

Como a América do Sul, o continente africano possui importantes reservas de minerais críticos, como lítio e cobalto, que desempenharão papel estratégico.

Para não permanecermos como meros exportadores de produtos primários, devemos aproveitar para forjar a integração de nossas cadeias produtivas e agregar valor aos bens e serviços que produzimos de forma sustentável.

A África é a região do mundo que menos emite gases do efeito estufa. Nem por isso deixa de enfrentar as consequências mais perversas do aquecimento global, como secas, inundações, incêndios e ciclones.

O Brasil e vários países africanos possuem planos abrangentes de renovação de suas matrizes energéticas.

Compartilhamos a responsabilidade de cuidar de florestas tropicais e preservar a biodiversidade. Temos em comum a preocupação de combater processos de desertificação.

Os serviços ambientais e ecossistêmicos que as florestas tropicais fornecem para o mundo devem ser remunerados de forma justa e equitativa.

Os produtos da sociobiodiversidade podem gerar emprego e renda e oferecer alternativas à exploração predatória de recursos naturais.

Esses são os pilares do Plano de Transformação Ecológica que lançaremos em breve.

Para que nossa integração econômica e produtiva floresça, será preciso ampliar as conexões marítimas e aéreas entre os dois lados do Atlântico.

É inexplicável que ainda não tenhamos voos diretos entre São Paulo e Joanesburgo, Cairo ou Dacar, essenciais para o aumento do fluxo de pessoas, comércio e turismo.

É muito pertinente a proposta do Conselho Empresarial dos BRICS, do estabelecimento de um acordo multilateral de serviços aéreos do grupo, contando com as principais autoridades nacionais de transporte e aviação.

Senhoras e Senhores,

O BRICS tem uma chance única de moldar a trajetória do desenvolvimento global.

Vocês, empresários, fazem parte desse esforço. Nossos países, reunidos, representam um terço da economia mundial.

Essa relevância vai crescer com a entrada de novos membros plenos e parceiros de diálogo.

A colaboração entre o setor público e privado é vital para aproveitar esse potencial e alcançar resultados duradouros.

Muito obrigado.

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