Lula, Papa Francisco, desigualdade e os parasitas da sociedade capitalista

Encontro do ex-presidente com o Sumo Pontífice ocorre na mesma semana em Guedes ofendeu servidores e que filme sul-coreano fez história no Oscar ao falar de desigualdade

Carta Capital

Sobre a desigualdade: "Pelo momento, tenho a impressão de que essa crise vai legitimar mais despesas sociais, mais investimentos nos sistemas de saúde, obrigar os governos a ter mais imaginação sobre dívida pública"

Nós últimos cinco dias a palavra ‘parasita’ ficou em evidência na internet, na TV, no cinema e nas notícias. Enquanto o ministro da Economia, Paulo Guedes, um banqueiro que fez uma fortuna com a especulação financeira, disse que os servidores públicos brasileiros vivem à custa alheia por pura exploração ou preguiça, em uma definição pejorativa do termo no dicionário, o filme sul-coreano ‘Parasita’ fez história na premiação do Oscar. Foi a primeira película em língua estrangeira a ganhar a premiação de melhor filme, além de outros prêmios.

Muito maior que o diminuto ministro banqueiro, o longa-metragem faz uma profunda crítica às desigualdades sociais que assolam as sociedades capitalistas – no caso do filme, a sul-coreana. E é justamente a desigualdade o tema central da conversa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o Papa Francisco, em encontro que ocorrerá nesta quinta-feira (13). A situação retratada pelo diretor Bong Joon-ho, da família Kim, mergulhada na pobreza e sobrevivendo de trabalhos informais, pode muito bem descrever hoje a realidade de milhões de pessoas no Brasil de Jair Bolsonaro e no mundo.

Por isso, o encontro entre Lula e o Papa é uma importante oportunidade de se discutir o aprofundamento da desigualdade social. Um relatório da Oxfam, de 2018, mostrou que as 26 pessoas mais ricas do mundo detêm uma riqueza equivalente à metade mais pobre da humanidade somada em conjunto – 3,8 bilhões de pessoas. Ao mesmo tempo, em São Paulo, a maior cidade do Brasil, cresceu em 66% o número de pessoas morando nas ruas.

Esse triste cenário, inclusive, foi alertado pelo Sumo Pontífice em 2014, em discurso no Encontro Mundial de Movimentos Populares:

“Hoje vivemos em imensas cidades que se mostram modernas, orgulhosas e até vaidosas. Cidades – orgulhosas de sua revolução tecnológica e digital – que oferecem inumeráveis prazer e bem-estar para uma minoria feliz…, porém os nega o teto a milhares de vizinhos e irmãos nossos, inclusive crianças, e se os chama, elegantemente, ‘pessoas em situação de rua’. É curioso como no mundo das injustiças, abundam os eufemismos”, apontou Francisco em discurso, divulgado pelo Instituto Humanistas Unisinos.

O ex-presidente brasileiro, por sua vez, indica que as consequências do aumento de desigualdade são visíveis e defendeu que é preciso um radical combate à fome e à miséria:

“Temos de construir um jeito, enquanto sociedade, de ser mais duros contra a desigualdade. Não possível ver uma pessoa dormindo no chão e achar que é normal. Ver alguém dormir na rua no Centro de São Paulo e ir para casa como se nada tivesse acontecendo. Precisamos começar a ter o direito de ficar indignados e falar mais alto contra a desigualdade social”, exaltou Lula durante o debate com o ex-presidente e senador uruguaio Pepe Mujica no Festival PT 40 Anos.

Desigualdade e a ‘uberização’

 

Na conversa com Mujica, Lula também criticou a flexibilização das leis trabalhistas e a exaltação de termos como ’empreendedorismo’ para justificar a exploração dos trabalhadores:

“Agora dizem para você que não vai ter mais emprego, que você vai trabalhar em casa, vai fazer o que aparecer e vai ser chamado de microempreendedor. Eu quero saber se é apenas o mercado que vai reger nossas condições de vida ou se o Estado vai agir para proteger os brasileiros que precisam de proteção do Estado. As pessoas trabalham sem parar, na hora do almoço, quando vão ao banheiro, quando voltam pra casa, uma infinidade de horas sem saber que estão trabalhando, e não ganham nada com isso A vida melhorou? A vida não melhorou”. apontou Lula.

Essa ‘uberização’ das relações sociais de trabalho, inclusive, é precisamente mostrada por Bong Joon-ho em Parasita. Sem empregos e rendas, a família sul-coreana cultua o fato de conseguiram obter um sinal de wi-fi do vizinho, que possibilita que ela consiga algum trabalho informal.

Já no Brasil, em 2019, a informalidade disparou. Segundo dados do IBGE, o trabalho informal atingiu 41,1% da mão de obra, ou 38,4 milhões de pessoas. O cenário é reflexo do desgoverno Bolsonaro e seu parasitário ministro banqueiro, que nada faz para trazer investimentos, gerar empregos e só age para cortar direitos. As políticas neoliberais, que Guedes defende, também foram alvo da crítica do Papa Francisco no seu discurso.

“Preocupa-me constatar que se levantam vozes, especialmente de alguns ‘doutrinários’, que tratam de ‘explicar que os direitos sociais já são ‘velhos’, estão fora de moda e não tem nada que contribuir a nossas sociedades. Desse modo, confirmam políticas econômicas e sociais que levam a nossos povos à aceitação e justificativa da desigualdade e da indignidade. A injustiça e a falta de oportunidades tangíveis e concretas por trás de tantas análises incapazes de se colocar aos pés do outro – e digo pés, não sapatos, porque em muitos casos essas pessoas não têm –, é também uma forma de gerar violência: silenciosa, porém violenta ao fim. Não há democracia com fome, nem desenvolvimento com pobreza, nem justiça na desigualdade”, ensinou Francisco.

Se o parasitário banqueiro que ocupa o Ministério da Economia não se preocupa em combater à desigualdade social crescente, a cultura, tão atacada pelo desgoverno Bolsonaro, se torna ainda mais imprescindível. Talvez Paulo Guedes aprendesse algo se assistisse o filme de Bong Joon-ho, que avaliou:

“Não sei qual é o grande problema do nosso tempo. Mas um deles é a fratura social entre ricos e pobres. Há mais: a mudança climática, as fronteiras… Mas acho que tudo deriva dessa distância. O exemplo é o meu país, a Coreia. Nós experimentamos um tremendo desenvolvimento econômico, exportamos o K-pop…, mas a violência pode explodir a qualquer momento, precisamente por causa da desigualdade. Sem diferença, não há capitalismo. Quanto mais extremo o capitalismo, mais extrema é a diferença”, comentou o diretor.

Por Erick Julio da Agência PT de Notícias, com informações do Instituto Humanitas Unisinos

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