Misoginia: 90% das pessoas têm algum preconceito contra as mulheres
Dado é de estudo das Nações Unidas feito em 80 países. No Brasil, esse tipo de preconceito é observado em 84,5% da população
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O mundo anda mais misógino. É o que afirma o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) no relatório ‘Índice de Normas Sociais de Gênero 2023′, divulgado na segunda-feira (12). O levantamento, realizado entre 2017 e 2022, em 80 países, revela que 90% dos entrevistados no mundo, independentemente do gênero, têm algum tipo de preconceito contra as mulheres.
No Brasil, único país de língua portuguesa no estudo, o índice é de 84,5%, o que representa uma pequena variação em relação a 2012. Naquele ano, apenas 10,2% da população não se diziam preconceituosos. Hoje, são 15,5%.
De maneira geral, os dados são muito preocupantes. Segundo o relatório, o preconceito não diminuiu desde a última década. Globalmente, 25% dos entrevistados acreditam que é justificável agredir a parceira, e metade prefere homens liderando na política.
A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, comentou, no Twitter, os resultados da pesquisa. Para ela, os dados mostram como é imprescindível a existência da pasta comandada por ela, que promove ações de combate à desigualdade e à violência, como o recém-aprovado PL da Igualdade Salarial.
“Enfrentar o discurso de ódio misógino é prioridade da pasta”, lembrou Gonçalves, acrescentando que “os dados foram recolhidos entre 2017 e 2022, um período em que, no Brasil, houve retrocesso no enfrentamento à desigualdade entre mulheres e homens e no fortalecimento dos sistemas de proteção e atendimento às mulheres”.
O cenário mostra como é imprescindível a existência do Ministério das Mulheres, que retoma e cria ações de combate à desigualdade e à violência, como o recém-aprovado PL da igualdade salarial. Enfrentar o discurso de ódio misógino é prioridade da pasta.https://t.co/9IfbiAKifu
— Cida Gonçalves (@CidaMulheres) June 12, 2023
Desigualdade que se mantém
Em entrevista à ONU News, o chefe do Escritório de Desenvolvimento Humano do Pnud, Pedro Conceição, afirmou que as normas sociais que prejudicam os direitos das mulheres danificam a sociedade em geral e atrasam o avanço social. Por isso, ele lamentou o atual cenário das questões de gênero.
“Desde 2019 que o nosso índice de desigualdade de gênero, que publicamos no nosso relatório de desenvolvimento humano, não progride. E isso pode parecer um pouco contradição, porque, ao mesmo tempo, tem havido objetivos progressos em alguns aspetos da igualdade de gênero, por exemplo, no acesso à educação”, analisou Conceição.
A razão para isso, segundo ele, tem a ver com normas sociais. “O que é uma norma social? Uma expectativa relativamente àquilo que a sociedade espera que seja o papel das mulheres em vários domínios da vida, seja no mercado de trabalho, seja no envolvimento com a política, seja em posições de liderança.”
Os dados brasileiros
O estudo analisou quatro dimensões: integridade física, educação, política e economia. No Brasil, o primeiro tema foi o que apresentou os piores resultados: mais de 75% dos entrevistados têm preconceitos em questões de violência e a respeito do direito de decisão sobre ter filhos.
Na área econômica, 31% dos brasileiros ainda acham que os homens têm mais direito a vagas de trabalho ou são melhores em cargos executivos. Em contrapartida, na educação, apenas 9% avaliam que o estudo universitário é importante apenas para os homens.
Sobre a participação feminina na política, a pesquisa aponta que mais de 39% dos entrevistados acreditam que mulheres não desempenham esse papel tão bem quanto os homens. O dado ajuda a explicar a baixa representatividade feminina em cargos públicos e explicita a estrutura conservadora de uma sociedade patriarcal e misógina.
No atual parlamento, por exemplo, são apenas 91 mulheres como deputadas federais e senadoras. Mesmo sendo o maior índice de todos os tempos, ainda está muito distante da paridade. E lembrando: as mulheres corresponderem a 52% da população do país.
A importância das ações de governo
Para a secretária nacional de Mulheres do PT, Anne Moura, esses índices só reforçam a necessidade de haver mais ações que empoderem as mulheres, como o projeto Elas por Elas, que busca ampliar a presença das mulheres nas instâncias de poder e decisão.
“Os dados dessa pesquisa são tristes. Talvez o avanço da extrema direita no mundo, que fez com que o papel da mulher fosse tolhido e minorizado, ajude a entender o porquê de tantas pessoas acharem que as mulheres são indignas de viver em paz, onde somente a violência seja o meio para dialogar”, avaliou Moura.
Segundo ela, a Secretaria Nacional de Mulheres do PT trabalha há anos para formar e capacitar mais mulheres para as disputas políticas. “Somente com a ocupação desses locais de poder é que vamos povoar o imaginário popular com a certeza de que o lugar da mulher é onde ela quiser. Destaco, também, o papel crucial que o Ministério das Mulheres tem desempenhado na proposição de diversos programas e iniciativas, como o GTI (Grupo de Trabalho Interministerial) para combater a violência política de gênero. O governo Lula está dedicado a ser referência na defesa e no respeito da vida das brasileiras”, afirmou.
Nesse sentido, o relatório do Pnud ressalta que os governos têm um papel crucial na mudança das normas sociais de gênero. O texto afirma que medidas como a adoção de políticas de licença parental, que mudaram as percepções sobre as responsabilidades do trabalho de cuidado, e reformas do mercado de trabalho impulsionam a mudança nas crenças sobre as mulheres na força de trabalho.
Isso vai ao encontro de algumas ações tomadas pelo governo Lula, a exemplo do GTI, mencionado por Anne Moura. Criado para elaborar a proposta da Política Nacional de Cuidados e a proposta do Plano Nacional de Cuidados, o grupo tem a missão de realizar um diagnóstico das necessidades e da oferta de cuidados que hoje existem no país e identificar quais programas, serviços e equipamentos poderiam ser criados, fortalecidos ou mais integrados para melhor atender a essas necessidades.
Os trabalhos começaram em maio, e o GTI terá seis meses (prorrogáveis por mais seis) para concluir essas importantes tarefas.
Recomendações para melhorar os índices:
– Fortalecimento dos sistemas de proteção e assistência social que atingem as mulheres;
– Promoção da inclusão financeira para geração de renda a longo prazo;
– Combate a desinformação de gênero e também ao discurso de ódio e violência;
– Investimento em leis e medidas políticas que promovam a igualdade das mulheres na política para construir Estados sensíveis às questões de gênero.
Da Redação do Elas por Elas