Para obedecer Bolsonaro, Capitã Cloroquina atropela medicina e ciência

Em depoimento contraditório à CPI, médica é cobrada por desastre sanitário. “Todos do governo que vêm à CPI têm uma única função: blindar o presidente Jair Bolsonaro”, denuncia Rogério Carvalho (PT-SE)

Foto: Agência Senado

Na defesa do tratamento precoce, a 'Capitã Cloroquina' desautorizou entidades de saúde como a OMS, o Conselho Nacional de Saúde e a Sociedade Brasileira de Infectologia

Na investigação para encontrar os responsáveis pela omissão na gestão da pandemia de Covid-19, surto que causou 450 mil mortes no país, a CPI da Covid colheu depoimento, nesta terça-feira (25), da secretária de Gestão do Trabalho e da Educação em Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro. Mais conhecida como ‘Capitã cloroquina’, Pinheiro caiu em contradição ao desautorizar entidades de saúde como o Conselho Nacional de Saúde (CNS), a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e a Sociedade Brasileira de Pediatria, que não recomendam o uso de cloroquina para tratar Covid-19, inclusive para crianças.

Ela seguiu a estratégia diversionista de Eduardo Pazuello, negando-se a responder diretamente as perguntas e mentiu pelo menos 11 vezes, de acordo com a equipe que checagem do senador Renan Calheiros. O depoimento da ‘capitã’ demonstrou que o Ministério da Saúde foi politicamente aparelhado por Bolsonaro. Ela afirmou que a pasta só considera sociedades médicas se forem “condizentes com a realidade e com a verdade”.

A médica foi confrontada com uma gravação, apresentada pelo senador Ranfolfe Rodrigues (Rede-AP), na qual ela ataca a Fiocruz. Na visão da capitã cloroquina, a entidade estaria aparelhada por grupos de esquerda. Em determinado momento da gravação exposta na CPI, ela fala que chegaram a colocar “um pênis na porta da Fiocruz”. Na verdade, trata-se do logotipo de aniversário de 120 anos do instituto.

A Capitã Cloroquina também confirmou que não se recorda de nenhuma declaração de Jair Bolsonaro, nas reuniões em que esteve presente com o ocupante do Planalto, em defesa de medidas como o isolamento social e o uso de máscaras para evitar contaminações por Covid-19 no país.

Se a senhora defende o isolamento social, o uso de máscara, vacinação em massa, e é contra a imunidade de rebanho, por que não pediu demissão?”, indagou o senador Rogério Carvalho (PT-SE). “Por que ainda continua trabalhando para um governo que aglomera, é contra o isolamento, que proíbe o uso de máscaras, que não investiu nas vacinas?”

Carvalho citou o mau exemplo de Bolsonaro, mencionando um estudo que indica que apoiadores do presidente têm mais chances de ser infectados por Covid-19. “Nós estamos largados à própria sorte. Todos do governo que vêm à CPI têm uma única e simples função: blindar o presidente Jair Bolsonaro da sua condição temerária e dolosa no combate à pandemia”, apontou o senador.

Cloroquina

Sobre uso da cloroquina, apesar de defender, genericamente, a existência de estudos comprovando a eficácia da droga, Mayra foi desmentida pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), que é médico. Alencar afirmou que cloroquina “não é antiviral em estudo sério nenhum do mundo”. Mayra assegurou ainda que tratamento precoce é utilizado em todo o mundo, mas não apresentou dados que comprovem o sucesso do uso do ‘kit covid’ em nenhum país.

Rogério Carvalho ressaltou que os próprios fabricantes de cloroquina não indicam o uso da droga em nenhuma das fases de infecção da covid-19.

Manaus e lockdown

A secretária também se eximiu de responsabilidade do ministério na crise de oxigênio em Manaus que causou dezenas de mortes em janeiro, apesar de ter ido até a capital amazonense. Apesar disso, confirmou que teve conhecimento da escassez de oxigênio no dia 8 de janeiro, dois dias antes da data informada pelo seu ex-superior, o general Eduardo Pazuello.

Também se colocou contra medidas como o lockdown e defendeu o isolamento vertical, que restringe o deslocamento apenas de pessoas com mais risco de adoecerem gravemente, como os idosos.  O senador Rogério Carvalho chegou  a apresentar áudios da médica atacando medidas de restrição da circulação de pessoas, por “atrapalhar a evolução natural da doença nas pessoas assintomáticas”.

“A senhora é um exemplo das pessoas que defendem essa tese da imunidade de rebanho, que nos trouxe essa realidade que vivemos no Brasil, 450 mil pessoas mortas”, acusou o senador Humberto Costa  (PT-PE). O senador criticou duramente a defesa da cloroquina feita pela gestora. “As pessoas tomam esse remédio, acham que estão protegidas e vão para a rua adquirir o vírus e trazer para casa”, disse Costa.   

O senador também reiterou que a gestora atuou fora das suas áreas de competência, deixando setores fundamentais da atenção básica, como o treinamento de profissionais de saúde, abandonados. 

“O Ministério da Saúde falhou em tudo que fez no combate à pandemia. Nossos profissionais de saúde estão abandonados e enfrentam uma batalha mortal sem um suporte necessário. Enquanto isso, bolsonaristas seguem querendo justificar a cloroquina. Falta vacina, faltam EPIs”, condenou Costa, pelo Twitter.

TrateCov

A médica ainda desmentiu Pazuello sobre um suposto ‘hackeamento’ do aplicativo TrateCov e se contradisse sobre as razões para a retirada da plataforma do site do Ministério da Saúde. Mayra defendeu que o aplicativo poderia ter salvo a vida de muitas pessoas que morreram por Covid-19 mas não explicou porque o a ferramenta não voltou a ser utilizada, uma vez que não sofreu alterações no sistema que prejudicassem seu uso.

A gestora também mentiu sobre uma suposta insegurança para uso do aplicativo após a “extração de dados” feita pelo jornalista Rodrigo Menegat, acusado de ser o responsável pela invasão. Segundo o Estado de S. Paulo, Menegat simplesmente copiou o código-fonte disponibilizado pelo próprio Ministério da Saúde no site da pasta, sem prejuízo de de suas funções. 

Da Redação

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