The Huffington Post: Golpe é ultrajante, surreal e tragicômico

Em artigo, autor critica duramente o impeachment e relembra as inúmeras denúncias de corrupção envolvendo membros do Congresso Nacional

Presidenta Dilma Rousseff durante entrevista para EBC. Foto: Roberto Stuckert Filho/PR

O site americano “The Huffington Post” publicou, no último domingo (19), artigo em que classifica o impeachment da presidenta Dilma Rousseff como “ultrajante, surreal e tragicômico”

“Tudo que você precisa saber sobre o ultrajante, surreal e tragicômico impeachment da primeira presidenta do Brasil, Dilma Rousseff” é o título do artigo escrito por Matthew Chapman.

No texto, ele lembra os avanços do Brasil durante os governos de Dilma e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Além disso, o autor fala sobre as inúmeras denúncias de corrupção envolvendo membros do Congresso Nacional.

“Desde que ela foi suspensa, o caráter e as intenções daqueles que a impediram se tornaram mais claros dia a dia. Este é realmente um golpe branco, em todos os sentidos da palavra”, afirma.

Huffington Post

Leia o artigo, em tradução livre:

“Dilma Rousseff, a primeira presidenta do Brasil, está sofrendo impeachment e enfrenta a saída permanente do cargo. Ela e seu antecessor fazem parte do Partido dos Trabalhadores (PT). Durante as suas administrações, 29 milhões de brasileiros saíram da pobreza.

Aqui estão alguns números de diferentes tipos. De acordo com o grupo de monitoramento de corrupção, Transparência Brasil, 60% dos 594 membros do Congresso Nacional enfrentam acusações criminais graves, a maioria envolvendo corrupção, suborno e fraude eleitoral, mas também desmatamento ilegal , sequestro e assassinato.

Como presidenta, Dilma não fez nada para parar as numerosas investigações contra esses políticos. Ela mesma nunca foi acusada de corrupção e não é cobrada por isso agora. 

As acusações levantadas contra ela para o impeachment são de que ela usou dinheiro dos bancos públicos para cobrir temporariamente as falhas de orçamento. A prática é amplamente utilizada em todos os níveis do governo brasileiro, inclusive por seus dois antecessores. 

Não existe nenhuma lei específica e bem definida nem na Constituição ou no Código Penal. Se o Congresso queria uma lei plausível sobre isso, deveria ter criado uma.

Tanto na Câmara, quanto no Senado, representantes votaram para aprovar o impeachment. Na Câmara, a atmosfera era estridente, sexista e tingida de homofobia. A maioria dos congressistas pró-impechment citaram “família, Deus e o país” como motivação para o impeachment da presidenta.

Um falou com aprovação sobre o homem que torturou Dilma durante a ditadura que ela lutou contra. (Aos 22 anos, Dilma foi presa por 3 anos, submetida à tortura extrema, mas nunca entregou nenhum nome).

O processo no Senado foi mais digno, embora tenha incluído um breve discurso pró-impeachment do ex-presidente Fernando Color de Mello, que renunciou em 1992 após ter sido acusado de corrupção pessoal e agora está enfrentando novas acusações de corrupção.

Quase nenhum dos pró-impeachment discursou sobre a acusação atual.

O Senado, agora, assume uma função judicial. Mas não é um processo legal em qualquer sentido, mas sim um processo político. 

Há pouco tempo para a preparação dos acusados. Não há presunção de inocência. Não há júri imparcial. Dois terços dos dos votos de um Senado repleto de corrupção pode acabar com o mandato de Dilma Rousseff.

Desde que ela foi suspensa, o caráter e as intenções daqueles que a impediram se tornaram mais claros dia a dia. Este é realmente um golpe branco, em todos os sentidos da palavra.

Assim que o vice-presidente Michel Temer, o principal articulador do impeachment, tornou-se presidente interino, ele trocou uma administração progressiva representativa de uma nação diversificada por uma que contém apenas homens brancos.

Nenhum afrodescendente, nenhuma mulher. Ele tentou fechar o Ministério da Cultura e visa desmantelar programas sociais vitais. 

Ele tentou indicar um pastor evangélico que não acredita na evolução para chefiar o Ministério da Ciência e Tecnologia, e, em seguida, fundiu a pasta e a fez subordinada ao Ministério das Comunicações.

Ele nomeou como ministro da Agricultura um homem que defende a abertura de vastas extensões da Amazônia para agricultores. 

De acordo com o jornal “Folha de S. Paulo”, um dos principais jornais do Brasil, Temer pretende fechar a TV Brasil, equivalente a PBS.

Diversas conversas gravadas anonimamente vazaram. Nelas, vários dos principais estimuladores falam abertamente sobre impedir a presidenta como uma maneira de parar ou ao menor impedir as investigações sobre corrupção.

Depois que uma gravação veio à tona com a menção de “conversas” com militares e com o Supremo Tribunal Federal para garantir a aprovação deles sobre o impeachment e como havia a necessidade de reduzir as investigações, o ministro do Planejamento foi forçado a pedir demissão.

Em uma gravação similar, o novo ministro da Transparência foi ouvido dando conselhos ao presidente do Senado sobre como esquivar-se das investigações sobre corrupção. Ele também renunciou.

Ao todo, três ministros foram demitidos ou renunciaram, alguns poucos dias após terem sido nomeados, todos com conexões com corrupção.

O homem que deu abertura ao processo de impeachment, presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, tem milhões de dólares em contas secretas na Suíça e foi afastado do cargo.

Cunha, de uma rádio evangélica que acredita-se lavou dinheiro através de uma igreja, enfrenta diversas acusações de corrupção e pode acabar enfrentando tempos difíceis

Michel Temer, o novo presidente, já foi considerado culpado por violações em finanças de campanha. Assim que ele sair do cargo, ele estará banido de concorrer a qualquer cargo político, incluindo o que ele tem agora, por 8 anos. Outras graves alegações ainda são investigadas.

Em suma, enquanto o impeachment pode ter ares de legitimidade, falta substância legal ao processo, motivado por políticos curruptos tentando se proteger de investigações. Isto vai resultar na implementação de políticas não aprovadas pelo eleitorado, que votou em Dilma. 

Esta situação provocará um enfraquecimento dos direitos humanos e da legislação ambiental. Enquanto é verdade que a economia recentemente piorou e que Dilma cometeu erros, seu impeachment é injustificável, é por si só corrupto, e abre um sério precedente nos ataques a uma liderança democraticamente eleita em uma jovem e frágil democracia. 

O fato foi tão inepto e revelou tanto sobre corrupção que a opinião pública está se voltando contra aquilo que já é descrito como golpe de Estado.  Muitos senadores indicaram que podem mudar de opinião e votar contra o afastamento da presidenta. Para evitar coincidar com as Olimpíadas, no entanto, o processo está sendo acelerado de forma alarmantemente rápida. 

Um grupo formado recentemente em Nova York, Shout For Democracy (Grito pela Democracia), está preparando um show no Teatro Apollo no dia 21 de julho. Artistas que até agora confirmaram presença são Bebel Gilberto,  Mauro Refosco e Forró in the Dark, Miho Hatori e Cibo Matto, Jesse Harris, e Wagner Moura. O objetivo do evento, segundo organizadores, é dar notoriedade a eventos e protestos no Brasil contra o cínico ataque à democracia. 

Talvez isto também lembre senadores, enquanto eles se preparam para votar contra ou a favor do impeachment, que as pessoas de todo o mundo ainda não decidiram se comparecerão aos jogos, enquanto notícias sobre racismo e machismo da direita podem dar mais trabalho para eles do que o Zika vírus.”

 

Da Redação da Agência PT de Notícias

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