13 de maio: a liberdade que ainda não veio
Em artigo, Almir Aguiar, secretário de Combate ao Racismo da Contraf-CUT e membro do Coletivo Estadual de Combate ao Racismo do PT-RJ, relembra a data histórica e proclama. “A visão escravocrata e o racismo de grande parte da burguesia são um ranço histórico que insiste em permanecer em nossos dias, em pleno século 21”, lamenta
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O Brasil, sempre com seu processo civilizatório tardio, foi o último país da America Latina a abolir a escravidão de negrxs, mesmo com toda a campanha da Inglaterra que, após a Revolução Industrial, pressionou para que em todo o continente fosse abolida a mão-de-obra escrava para a criação de novos mercados consumidores. Mas é explícito na sociedade brasileira que a visão escravocrata e o racismo de grande parte da burguesia são um ranço histórico que insiste em permanecer em nossos dias, em pleno século 21.
Basta olhar a pirâmide social: em todos os aspectos, seja de emprego, renda, acesso à ocupações de chefia em bancos e empresas privadas, condições de moradia, saúde, saneamento básico e oportunidades e no número de mortos pela violência policial. Os negros e negras estão, em sua esmagadora maioria, na base da pirâmide social brasileira, com 78% formada por negros e pardos. A desigualdade no Brasil tem cor, e isto é fato já confirmado por todos os estudos sociológicos e pelos próprios dados oficiais do IBGE.
A exposição ainda maior das desigualdades sociais e raciais provocadas pela pandemia do novo coronavírus é constatada nos números oficiais que apontam que negros e negras são as maiores vítimas da expansão do Covid-19 no Brasil, agravada pela política e postura genocida do presidente Jair Bolsonaro.
Em São Paulo, epicentro do Covid-19 em nosso país, estudos mostram que o risco de mortes entre negros é 62% maior do que em relação aos brancos, por motivos óbvios de uma realidade de falta de saneamento básico, crianças brincando em lixões, palafitas e barracos minúsculos com 7 e até 12 pessoas vivendo juntas, somada a falta de acesso a bens de consumo, como é o caso do álcool gel neste momento, vendidos a preços proibitivos por comerciantes e das medicações pela máfia das indústrias farmacêuticas.
No Brasil, o número de negros por coronavírus é cinco vezes maior do que o de brancos. Claro, lutamos para que o governo tome medidas e providências que protejam a vida de todos os brasileiros, independentemente de sua raça. Mas é preciso denunciar que, na política genocida de Bolsonaro, as maiores vítimas são os negros, maioria dentre os mais pobres.
Em duas semanas, a quantidade de pessoas negras que morrem por Covid-19 no Brasil, quintuplicou. De 11 a 26 de abril, mortes de pacientes negros (confirmadas pelo Governo Federal) foram de pouco mais de 180 para mais de 930. Além disso, a quantidade de brasileiros negros hospitalizados por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) causada por coronavírus aumentou em 5,5 vezes.
Pandemia tem impacto maior na população negra
A explosão de casos de negros que são hospitalizados ou morrem por Covid-19 só escancara a olhos vistos e confirmam as denúncias dos movimentos sociais sobre as desigualdades raciais no Brasil: entre negros, há uma morte a cada três hospitalizados por SRAG causada pelo coronavírus; já entre brancos, há uma morte a cada 4,4 hospitalizações. Estes números são oficiais do próprio governo federal e não podem ser deixados passar sem que haja uma indignação nacional contra o racismo e a dívida histórica da sociedade brasileira com as comunidades negras. Em especial, num contexto tão dramático e violento que temos visto contra comunidades quilombolas, ribeirinhas e indígenas.
Lamentavelmente, todas as ações, medidas e projetos do ministro banqueiro Paulo Guedes, do Governo Bolsonaro, sem falar na panaceia do genocida do Presidente brasileiro, vão na contramão desta reflexão social e política que a dor e as mortes da pandemia estão trazendo a governos e sociedades do mundo inteiro. Por aqui, o governo só aprofunda a miséria e a desigualdade.Nós sabemos que os mais vulneráveis, afetados pela política econômica mais perversa da história deste país, em sua maioria, são os negros e negras, inclusive nos contágios e mortes pelo Covid-19.
Por isso, depois de 132 anos de uma abolição inacabada, esse 13 de maio nos convoca a todos, a uma reflexão profunda sobre que Brasil nós queremos após esta pandemia. E, certamente, independentemente de posições partidárias e ideológicas, este Brasil pós-Covid-19, não está nas políticas elitistas, racistas e genocidas do atual governo. Certo também que não podemos mais admitir um país tão desigual e injusto, e que a necessidade de políticas afirmativas mais consistentes para garantir condições de vida dignas e igualdade de oportunidades para negros e negras, não pode ser apenas uma política do futuro governo e, sim, tem de ser um compromisso e uma política de estado. Basta de racismo.
Almir Aguiar, secretário de Combate ao Racismo da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) e membro do Coletivo Estadual de Combate ao Racismo do PT-RJ