Ana Rita: agenda política deve incluir luta pela partilha da terra

A luta pela democratização da terra precisa retornar ao centro da agenda política nacional.

“O cenário é bastante adverso, com o recrudescimento do agronegócio, que amplia seu poder pelo devido ao papel que desempenha na manutenção da balança comercial brasileira”, avalia a senadora Ana Rita (PT-ES), para quem a luta do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) permanece “atual e necessária”, apesar das transformações vividas pelo País. Em pronunciamento ao plenário, na noite da última quarta-feira (19), ela reafirmou sua convicção de que a reforma agrária permanece como bandeira estratégica para o Século 21.

Ana Rita destacou em seu pronunciamento os 30 anos do MST e os debates e resoluções do 6º Congresso do Movimento, realizado na semana passada, em Brasília. “Nessas três décadas, o MST consolidou-se como um dos maiores e mais importantes movimentos sociais do Brasil, lutando pela democratização do acesso à terra, pela garantia de um direito fundamental que ainda hoje é negado a milhares de famílias brasileiras”, afirmou a senadora.

Para Ana Rita, o MST amadureceu e continua a demonstrar “muita força, capacidade de mobilização e organização social”. Um exemplo foi a presença de 16 mil trabalhadores e trabalhadoras rurais de todas as regiões do Brasil, durante o Congresso da organização, realizado num momento crucial na história do movimento. “Os desafios de hoje são tão monumentais quanto os da fundação do MST, quando a prioridade era organizar, na luta pela reforma agrária e pelo fim do latifúndio improdutivo, milhares de trabalhadoras e trabalhadores pobres expulsos do campo pela ditadura militar e seu modelo de desenvolvimento pseudomodernizador”.

Hoje, destaca a senadora, é preciso reafirmar o caráter estratégico da reforma agrária e da democratização do acesso à terra, demonstrar o papel da agricultura familiar na geração de empregos e na produção de alimentos, frente a um agronegócio que se expande e faz sucesso. “O desafios que estão colocados com o próprio desenvolvimento das forças produtivas do campo e de uma população que, nas últimas décadas, em detrimento da vida no campo, escolheu a cidade como alternativa de vida, de sobrevivência, convivendo com todo tipo de dificuldades, consequência dos inchaços populacionais das regiões metropolitanas”, avalia Ana Rita.

O fundamental, afirma ela, ainda está por ser resolvido. A histórica concentração fundiária brasileira permanece inalterada, “mesmo após a redemocratização do País”, com graves conseqüências e impactos sobre os índices de desigualdade, “como muito bem demonstra o índice de Gini – o índice varia de 0 a 1, de modo que o valor máximo representa alta concentração de riquezas e o mínimo uma perfeita e equilibrada distribuição. ” A senadora lembrou que em 1967, em plena ditadura militar, o índice de Gini era de 0,836. Passados 40 anos, o último índice, referente ao ano de 2006, revela um quadro de aglutinação da concentração fundiária brasileira nas últimas décadas, cujo índice alcançou patamar de 0,854, “demonstrando que muito pouco foi feito para transformar de fato uma realidade dramática de desigualdade, legada desde o Brasil colonial e reproduzida de forma violenta ao longo da história do nosso País”.

Ana Rita também destacou dados do Censo Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2006, divulgado em 2009. Segundo o Censo, 0,91% das propriedades rurais no Brasil possuem mais de mil hectares de extensão e cobrem 44,42% de toda a área ocupada para produção agrícola no País. “Ou seja, os latifúndios ocupam praticamente a metade do território agrícola do País. No outro extremo, 47,86% do universo de propriedades rurais tem menos de 10 hectares e abrangem irrisórios 2,36% do total da área agrícola”.

Durante o 6º Congresso, o MST lançou um novo “Plano de Reforma Agrária Popular”, construído com ampla participação e no qual defende a superação do atual modelo de produção agrícola e da relação predatória com a natureza. “Cada vez mais empresas e bancos estrangeiros estão investindo pesado na compra de terras e de empresas agrícolas com o objetivo de monopolizar toda a cadeia produtiva, da semente à agroindústria”, alertou a senadora.

Grande parte dessa produção é voltada para o mercado externo, “cujos produtos são cada vez mais alvos de especulação do mercado financeiro de commodities, sobretudo a partir da crise econômica de 2008”, destacou Ana Rita. “É nesse contexto que o MST dá um salto qualitativo ao tratar da centralidade da produção de alimentos dentro de novas bases de produção, com incentivo ao desenvolvimento de pesquisas e técnicas que valorizem o modelo de transição agroecológica e que, ao mesmo tempo, incorporem a mão de obra camponesa e sejam capazes de produzir sem o uso de agrotóxicos”, enfatizou.

A agricultura familiar e camponesa, que ocupa apenas 24,3% da área total agricultável no Brasil, é responsável por cerca de 70% de todos os alimentos que chegam até a mesa das famílias brasileiras. De acordo com o Censo Agropecuário, realizado em 2006, a agricultura familiar produz 80% da mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 34% do arroz, 21% do trigo, 58% do leite, 50% das aves e 59% dos suínos. Além disso, é a responsável por 4,3 milhões de unidades produtivas, representando 84% dos estabelecimentos rurais do País, 33% do Produto Interno Bruto Agropecuário, além de empregar 74% da mão de obra no campo.

“Em resposta ao modelo voltado à grande produção e à sua necessidade de alta produtividade, o novo programa do MST ressalta a centralidade da preservação ambiental para a sustentabilidade da agricultura, a partir de um amplo programa de reflorestamento em áreas de assentamentos e da importância da proteção das águas e das sementes para a salvaguarda da biodiversidade e do patrimônio genético existente no Planeta”, concluiu a senadora.

(PT no Senado)

 

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