Abertura da Assembleia dos Povos celebra resistência dos venezuelanos

Evento organizado por movimentos populares e partidos políticos de 85 países ocorre até o dia 27 de fevereiro, em Caracas

Rafael Stédile

A Assembleia Internacional dos Povos (AIP) foi inaugurada neste domingo (24) na capital venezuelana, Caracas, com a participação de mais de 400 delegados de 85 países diferentes. Organizado por movimentos populares de todos os continentes, o evento ocorre em meio à tentativa frustrada de golpe contra o presidente eleito Nicolás Maduro pelo opositor Juan Guaidó, com apoio de países como Estados Unidos e Brasil.

A mesa de abertura teve a participação de João Pedro Stedile, dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da Via Campesina Internacional, e da prefeita de Caracas, Érika Farías, além do diretor do Instituto Tricontinental, Vijay Prashad, e da representante do projeto Educação Popular dos Estados Unidos, Claudia de la Cruz.

Farías foi a primeira a falar e lembrou que os ataques ao processo revolucionário venezuelano duram mais de duas décadas. “Nós somos um povo que, em 20 anos, aprendeu muito. E, por isso, somos um povo consciente do seu passado, seu presente, e do futuro que queremos construir”, afirmou.

“Desde 1999 até hoje, esse é um povo que luta e que se mantém vencendo. Isso foi o que aconteceu nesses dias, com a pantomima que armaram na nossa fronteira”, prosseguiu. “Ontem, um jornalista me perguntava: e amanhã, dia 24, o que vai acontecer? E eu disse: bom, amanhã o que vai acontecer é que vai começar a Assembleia Internacional dos Povos, Nicolás Maduro continua sendo o presidente da República Bolivariana da Venezuela, e o povo da Venezuela continua lutando, construindo, trabalhando”, finalizou a prefeita.

Na sequência, Stedile esclareceu os objetivos da articulação em torno da AIP, que envolve organizações de mais de 130 países de todo o mundo. “Aprendemos, com o intercâmbio que fizemos para construir esse processo internacional, que compartilhamos sonhos com todos os que estão aqui. Precisamos construir unidade através de uma reforma programática, e o estamos fazendo muito bem. Todas as formas nas quais o povo se organiza são importantes, seja associações, movimentos, partidos, sindicatos, igrejas”, ressaltou o dirigente brasileiro.

A representante dos Estados Unidos, Claudia de la Cruz, chamou atenção para a inversão de prioridades do governo dos Estados Unidos em 2018. Segundo ela, Trump investiu cerca de 600 bilhões de dólares em defesa, contra 190 bilhões em programas de redução da pobreza e garantia de direitos como educação, trabalho e moradia.

Vijay Prashad finalizou a mesa de abertura enaltecendo o papel dos meios de comunicação e das redes sociais e a necessidade de uma ofensiva contra-hegemônica por parte dos movimentos populares em todo o mundo. “Estamos em uma guerra de ideias, e as forças do capitalismo controlam os meios que produzem essas ideias”, alertou. “Estamos aqui em Caracas para dizer: tirem as mãos da Venezuela”, concluiu.

No último sábado (23), Juan Guaidó, deputado venezuelano opositor ao governo de Nicolás Maduro, que se autoproclamou presidente interino do país, participou de uma ação nas fronteiras com a Colômbia e o Brasil, para forçar a entrada de “ajuda humanitária” no país. O governo venezuelano rejeitou a suposta ajuda por considerá-la um “cavalo de Troia”, ou seja, um pretexto para a entrada de armas e munições para grupos opositores ao governo.

Cronologia da tentativa de golpe

Os debates da Assembleia Internacional dos Povos, que termina no próximo dia 27, se concentram sobre o avanço dos governos de direita e extrema direita pelo mundo e na ofensiva imperialista contra o povo da Venezuela.

Uma mesa de discussão será destinada a discutir especificamente a atual situação política e econômica no país latino-americano e a resistência à ofensiva que começou em 2015 – quando foram realizadas eleições para os 167 deputados e deputadas da Assembleia Nacional venezuelana. Na ocasião, a oposição ao governo Maduro conquistou ampla maioria, e por somente quatro deputados não conseguiu a maioria qualificada de dois terços dos postos, necessária para a aprovação de emendas constitucionais. Ainda assim, com a Assembleia sob controle dos partidos de oposição, quatro deputados não eleitos foram empossados, o que gerou a imediata reação do Judiciário, que suspendeu algumas das atribuições do Legislativo.

Por conta dessa decisão judicial, em 2017, grupos opositores tomaram as ruas do país e promoveram ataques violentos contra pessoas e edifícios públicos – as ações ficaram conhecidas como “guarimbas”. Diante desse cenário, o governo venezuelano convocou uma mesa de diálogo, realizada na capital da República Dominicana, Santo Domingo.

Embora o governo venezuelano tenha atendido a quase todas as reivindicações dos grupos opositores, estes decidiram abandonar a mesa de diálogo, sob protestos dos mediadores – entre eles, o ex-primeiro-ministro espanhol, José Luiz Rodríguez Zapatero. Maduro, então, convocou a eleição para uma Assembleia Nacional Constituinte, com o objetivo de renovar os poderes do país e frear a onda de violência.

A eleição para a Assembleia Constituinte foi realizada no dia 30 de julho de 2017. No dia 20 de maio do ano seguinte, foi realizada a eleição para presidente da República. Embora muitos setores da oposição tenham decidido voluntariamente não participar do pleito e convocado à abstenção, a eleição teve a participação de 46% do eleitorado, resultando vitorioso o presidente Maduro com 67,84% dos votos, que renovou o mandato por mais seis anos.

Insatisfeitos com o resultado, países governados pela direita, principalmente a gestão de Donald Trump, nos Estados Unidos, decidiram intensificar as pressões sobre a Venezuela por meio de bloqueios de bens e divisas no exterior, provocando uma crise econômica sem precedentes no país. No dia 10 de janeiro de 2019, o deputado da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, se autoproclamou presidente interino do país, desconhecendo o processo eleitoral que elegeu Nicolás Maduro.

A legitimidade de Guaidó foi reconhecida por governos de direita em uma ação articulada por Trump em janeiro. As Forças Armadas, bem como os máximos representantes do Judiciário da Venezuela, reconhecem a autoridade de Nicolás Maduro como presidente legítimo, eleito pelo voto popular.

Por Brasil de Fato

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