Arrocho de Bolsonaro e inflação de alimentos derrubam poder de compra do salário mínimo

Projeções apontam para o mais baixo poder de renda do salário mínimo desde 2005, pelo segundo ano consecutivo de Bolsonaro. A diferença é que há 16 anos havia uma política de valorização do salário mínimo em vigor. Bancada do PT na Câmara luta pela retomada do auxílio emergencial e do BPC

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Inflação de alimentos compromete renda dos trabalhadores

Principais vítimas da inflação dos produtos da cesta básica em 2020, as famílias com renda mais baixa (rendimento familiar mensal menor que R$ 1.650,50) terão a situação agravada este ano. A começar pelo salário mínimo, que pela segunda vez consecutiva foi reajustado pelo desgoverno Bolsonaro apenas com base na inflação, sem o aumento real dos tempos dos governos do Partido dos Trabalhadores.

Segundo o instituto, o salário mínimo de R$ 1.100,00 em 2021 terá novamente menor poder de compra em relação aos produtos da cesta básica desde 2005. O Dieese calcula em R$ 696,71 o valor da cesta básica em São Paulo neste mês. Assim, o salário mínimo reajustado equivale a 1,58 cesta básica, mesma proporção de 2020 e a menor desde 2005 (1,60). De 2006 a 2019, a proporção permaneceu próxima ou acima de duas cestas, chegando a 2,16 em 2017.

O resultado poderá ser ainda pior, uma vez que, no apagar das luzes de 2020, o governador João Doria editou decretos para inserir o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no preço de alguns produtos no estado, incluindo leite e produtos hortifrutigranjeiros.

Em dezembro, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada informou que o Indicador Ipea de Inflação por Faixa de Renda referente a novembro para os mais pobres foi de 1% em novembro, totalizando 4,6% nos primeiros onze meses do ano – três vezes maior do que a inflação das classes mais ricas. Na comparação com novembro de 2019, a taxa de inflação da renda muito baixa aumentou 85%.

A discrepância ocorre porque o impacto da inflação dos produtos da cesta básica é maior justamente sobre a população mais pobre. O grupo “alimentos e bebidas” foi responsável, sozinho, por 75% da inflação da classe de renda muito baixa no período pesquisado pelo Ipea. Para completar, também o aluguel ficará mais alto, pois o IGP-M, que serve como referência para o reajuste desse valor, subiu cerca de 25%.

O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) estima que 50 milhões de trabalhadores têm rendimento referenciado no salário mínimo. Além de corrigir salários, o índice é usado para reajustar o abono salarial do PIS/PASEP e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), pago a idosos carentes e deficientes físicos carentes, e também benefícios previdenciários pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e o seguro-desemprego.

Ainda segundo o Dieese, o salário mínimo ideal para que uma família de quatro pessoas pudesse se sustentar deveria ter sido de R$ 5.289,53 em novembro de 2020. O valor supriria as despesas de um trabalhador e de sua família com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência.

Mas o ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, que nunca teve um programa para fomentar a geração de postos de trabalho de qualidade e insiste na retirada de proteções trabalhistas como forma de aumentar o número de contratados, é contra qualquer aumento para o mínimo. Em setembro passado, durante audiência no Congresso, chegou a afirmar que, em tempos de crise, isso seria “condenar as pessoas ao desemprego”.

Além disso, Guedes também pressionou pelo fim do auxílio emergencial, o que causará ainda mais impactos sobre o grupo dos mais pobres, que não será beneficiado pela geração de postos de trabalho em número suficiente, o que obrigará trabalhadores informais a irem para a rua em busca de sustento. Soma-se a isso a demora no processo de vacinação e a ausência de perspectiva para imunizar toda a população, que vai expor essas pessoas ao contágio.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Covid do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgada em 23 de dezembro, mostrou que 14,1 milhões de brasileiros procuraram trabalho naquele mês, mas não conseguiram – taxa recorde de 14,2%. São quatro milhões de desempregados a mais do que em maio de 2020.

Não à toa, a expectativa da maioria da população brasileira com a economia do país em 2021 é de que não haverá melhora. É o que mostra pesquisa Datafolha divulgada na segunda (4) pelo jornal ‘Folha de São Paulo’. Para 69% não haverá recuperação neste ano. Entre os entrevistados, 41% acreditam que a economia vai piorar e 28% acham que a situação fica como está. Isso significa que sete entre dez brasileiros mantêm previsões pessimistas para o ano.

“Para 2021, as expectativas do mercado financeiro são de retomada do crescimento, após a contração da economia registrada em 2020 por causa da pandemia. Esse crescimento, no entanto, não será suficiente para repor as perdas verificadas no ano passado, o que só deve ocorrer em 2022”, informa Eduardo Cucolo no texto de apresentação da pesquisa.

Deputado Federal José Guimarães (PT-CE). Foto: Gustavo Bezerra

PT defende prorrogar o auxílio emergencial

O líder da Minoria da Câmara dos Deputados, José Guimarães (PT-CE), apresentou projeto de lei – autenticado no sistema interno da Câmara – para prorrogar o auxílio emergencial de R$ 600 por mais quatro meses. A proposta prevê que a alteração no calendário de pagamentos já ocorra neste mês. O PL será numerado no início da sessão legislativa de 2021, em fevereiro.

Guimarães defende a adoção permanente de um modelo de renda mínima para os informais. Segundo o petista, é falsa a tese bolsonarista de que o auxílio já cumpriu sua finalidade. “Ainda estamos em pandemia. Não há previsão de vacinação, tampouco de retomada da economia. O auxílio ganha ainda mais importância com o aumento desenfreado do desemprego, que já atinge 14,1 milhões de brasileiros”, afirma.

Logo após o término do recesso do poder legislativo, a Bancada do PT na Câmara também vai apresentar emendas ao texto da Medida Provisória (MP) 1023/2020, que restringe o acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC). A medida assinada por Bolsonaro em 31 de dezembro reduziu de meio para um quarto de salário mínimo per capita mensal, por família, o critério de acesso ao benefício pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda. Com a medida, até 500 mil brasileiros podem ser excluídos do BPC.

O critério anterior de acesso ao benefício, que vinha sendo utilizado até o final do ano passado, foi instituído pela lei que implantou o auxílio emergencial, que expirou no último dia de 2020. Segundo o líder da Bancada do PT na Câmara, deputado Enio Verri (PR), reduzir o alcance do BPC em plena pandemia vai aumentar ainda mais a pobreza.

“Essa é uma questão de justiça. A MP restringe o acesso dos mais pobres e das pessoas com deficiência ao benefício. Portanto, essa medida do Bolsonaro vai tornar essas pessoas ainda mais pobres. Por isso o PT quer derrubar essa alteração para voltarmos ao parâmetro anterior de acesso ao BPC”, explicou o líder.

O critério de ampliação de acesso ao BPC utilizado até a edição da MP de Bolsonaro foi aprovada em março pelo Congresso, na esteira das medidas emergenciais de combate à pandemia. Apesar de a proposta ter sido vetada por Bolsonaro, o Congresso Nacional derrubou o veto, dando origem à Lei 13.981/2020.

Em uma nova reviravolta, a questão foi submetida a análise do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu a eficácia da norma. A ação deu origem a uma nova Lei (13.982/2020) restabelecendo o critério da renda igual ou inferior a um quarto do salário mínimo para acesso ao BPC, mas com vigência só até 31 de dezembro de 2020.

Da Redação, com CUT e PT na Câmara

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