Artigo: Por uma Cultura de Paz, vamos combater a intolerância religiosa no nosso país

Por Gutierres Barbosa, coordenador nacional do Setorial Inter-religioso do PT

No dia 27 de dezembro de 2007, no primeiro ano do segundo governo do presidente Lula, foi sancionado a Lei nº 11.365 que institui o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, de autoria do deputado baiano do PC do B, Daniel Almeida.

“A data foi escolhida em homenagem à Ialorixá Mãe Gilda, que foi vítima de intolerância religiosa no final de 1999 e em referência ao Dia Mundial da Religião. O terreiro Abassá de Ogum, em Salvador, Bahia, foi alvo de intolerância com duas invasões, por parte de membros de uma igreja, no ano de 2000, resultando na morte da ialorixá Mãe Gilda por infarto fulminante”¹.

Vivemos nos últimos 4 anos de desgoverno genocida, com um aumento desenfreado de casos de intolerância religiosa. Segundo dados do Ministério dos Direitos Humanos, divulgados no Jornal Nacional, entre 2020 e 2022 ocorreu um aumento de 45% do número de casos de intolerância religiosa, saltando de 827 em 2020 para 1.201 em 2022. Estes dados demonstram que o ódio e intolerância passaram a fazer parte do cotidiano, principalmente das religiões de povos de matrizes africanas e de terreiro.

O Brasil está entre os 11 países da América Latina em que a Constituição Federal separa o Estado da religião. É no artigo 5º da Constituição que proclama a liberdade de consciência e de crença, nos seguintes termos:– é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias.

Mesmo tendo nítido na Constituição sobre a liberdade de culto e crença, infelizmente vivemos nos últimos 4 anos uma impregnação de um pensamento cristão evangélico conservador, preconceituoso e fundamentalista dentro das instituições de estado, como os casos emblemáticos da nomeação de um pastor fundamentalista para ministro da educação, a indicação de ministro ao STF “terrivelmente evangélico”, o afrouxamento da posse de armas e a nomeação de uma pastora ultraconservadora para ministra da mulher, família e direitos humanos. Essas ações desencadearam um retrocesso social diante de um Estado constitucionalmente laico e diverso para um estado influenciador da cultura do ódio, do medo, extremamente fundamentalista e ultraconservador.

Em menos de 20 dias de governo do terceiro mandato do presidente Lula, já garantiu passos importantes para um retorno ao um estado que seja laico e que promova a cultura de paz e se privilegie o princípio constitucional do direito à liberdade de culto e crença. Para isto, duas importantes leis foram sancionadas nestes primeiros dias de governo.

No dia 05 de janeiro foi sancionada a Lei nº 14.519/23, cujo projeto que a ensejou é de autoria do deputado federal do PT/SP, Vicentinho, institui o Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé, a ser comemorado anualmente do dia 21 de março.

No ultimo dia 11 de janeiro foi sancionada a Lei nº 14.532/23, que equipara o crime de intolerância religiosa ao de injúria racial a saber: Sem prejuízo da pena correspondente à violência, incorre nas mesmas penas previstas no caput do artigo 2º da lei, a quem obstar, impedir ou empregar violência contra quaisquer manifestações ou práticas religiosas.  com pena de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa.

Outrossim destacamos aqui a revogação dos decretos do inominável que facilitavam o acesso as armas. Assim comemoramos os avanços e freamos retrocessos, entretanto ainda temos muitas lutaspela frente para garantir a diversidade religiosa, a cultura de paz e o combate sistemático a toda intolerância religiosa, na garantia de uma convivência harmoniosa entre as religiões.

Neste sentido, destacamos aqui 3 (três) ações para lutarmos durante o novo período de esperança de um governo democrático e livres do ódio:

– A aprovação do projeto de Lei nº 1279/2022, de autoria das deputadas Erika Kokay – PT/DF ,  Fernanda Melchionna – PSOL/RS ,  Talíria Petrone – PSOL/RJ e outros que Dispõe sobre o Marco Legal dos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana, altera a Lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010 (Estatuto da Igualdade Racial) e a Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001 (Estatuto da Cidade);

– A Criação de um órgão governamental da diversidade religiosa que trate transversalmente com a política de Direito Humanos, Educação e Desenvolvimento Social, buscando avançar sobre a Portaria 92 de 24 de janeiro de 2013 que instituiu o Comitê Nacional de Diversidade Religiosa. 9 (nove) países da América do Sul (Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela) e no México já possuem órgãos governamentais que tratam da diversidade religiosa;

– A realização de Conferências Estaduais e Nacional da Diversidade Religiosa, com ampla participação do poder público e da sociedade civil organizada, pois sem dúvida resultaria numa Política Nacional da Diversidade Religiosa.

Acreditamos por fim que o reestabelecimento da cultura de paz e a convivência pacífica entre as diversas religiões no Brasil, passa pela defesa constante do Estadodemocrático de direito, laico, com a responsabilidade de todos, governos estaduais, governo federal, poderes legislativos, poder judiciário e a sociedade civil organizada.

Gutierres Barbosa, é pedagogo, evangélico, vice-presidente do PT/BA e coordenador nacional do Setorial Inter-religioso do PT

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