Bolsonaro sempre foi contra o acesso dos brasileiros à vacina
Sob pressão, ocupante do Planalto muda tom e aposta usar vacinação para fins eleitoreiros, como fez com o auxílio de R$ 600 que ele foi contra
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Jair Bolsonaro jamais teve o menor interesse em vacinar a população brasileira, como atestam 282 mil mortos. Sua recente guinada no discurso, afirmando que nunca foi contra o uso de imunizantes, repete a estratégia de tentar surfar nos efeitos do pagamento do auxílio emergencial em 2020. Contrário ao benefício, Bolsonaro lutou para pagar apenas R$ 200 mas foi derrotado no Congresso, graças à luta do PT e da oposição, que garantiram um pagamento de R$ 600.
Agora, com a popularidade derretendo sob o peso dos mortos que se acumulam, Bolsonaro tenta ludibriar a população do mesmo modo que fez com o pagamento do auxílio. Ao mesmo tempo, ele demonstra sentir a pressão exercida pelos efeitos do discurso do ex-presidente Lula junto à população e à imprensa, na semana passada. Em duras críticas, Lula condenou a atuação genocida do governo na pandemia e cobrou de Bolsonaro a aquisição de mais vacinas.
Como veremos, uma análise das frases de Bolsonaro sobre vacinas, desde de 2020, mostra que o ocupante do Planalto nunca se importou em salvar vidas. Seu plano consiste em usar as imunizações para chegar ao ano eleitoral em condições de tentar disputar a reeleição.
Sob ordem direta de Bolsonaro, o ministro da Saúde Eduardo Pazuello atrasou a compra de vacinas, assim que os laboratórios anunciaram a produção em larga escala, em meados do ano passado, preferindo manter a plano de desovar caixas de cloroquina aos estados e municípios. Assim, o cronograma de vacinação foi sistematicamente atrasado e reduzido desde janeiro.
Além disso, somente a vacina CoronaVac, desenvolvida pelo Instituto Butantan em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac, sofreu pelo menos dez ataques públicos de Bolsonaro.
Desde julho, Bolsonaro passou a levantar desconfianças sobre o imunizante chinês, em uma descabida disputa política com o governo de São Paulo. Em outubro, Bolsonaro desautorizou Pazuello, que havia anunciado a compra de 46 milhões de doses da CoronaVac. “Já mandei cancelar, o presidente sou eu, não abro mão da minha autoridade”, disse ele, referindo-se jocosamente ao imunizante como ‘vachina’.
Em seguida, Bolsonaro voltou à carga contra os chineses. “A da China nós não compraremos, é decisão minha. Eu não acredito que ela transmita segurança suficiente para a população”, disse. “A China, lamentavelmente, já existe um descrédito muito grande por parte da população, até porque, como muitos dizem, esse vírus teria nascido por lá”.
Bolsonaro celebra morte
No mês seguinte, em novembro, Bolsonaro chegou a celebrar a suspensão temporária dos testes com a CoronaVac por uma suspeita, jamais comprovada, de que a morte de um voluntário pudesse ter sido causada pelo imunizante.
“Morte, invalidez, anomalia. Esta é a vacina que o Doria queria obrigar todos os paulistanos a tomá-la. O presidente [Bolsonaro] disse que a vacina jamais poderia ser obrigatória. Mais uma que Jair Bolsonaro ganha”, comemorou Bolsonaro.
Discurso antivacina
Em dezembro, durante evento em Porto Seguro (BA), Bolsonaro montou um palanque para mais um discurso antivacina e de desestímulo da população na adesão à campanha nacional de vacinação. “Ninguém pode obrigar ninguém a tomar vacina. Eu não vou tomar. Eu já tive o vírus. Já tenho anticorpos. Para que tomar vacina de novo?”, questionou.
No mesmo evento, Bolsonaro deixou claro que sua metralhadora agora atirava contra a americana Pfizer, a mesma que ofereceu 70 milhões de doses ao governo, sem sucesso, em agosto. “Se tomar e virar um jacaré é problema seu. Se virar um super-homem, se nascer barba em mulher ou homem falar fino, ela [Pfizer] não tem nada com isso”.
Para sustentar sua estratégia genocida, Bolsonaro, utilizou uma cláusula, que é padrão e foi aceita por todos os países que negociaram a compra do medicamento, de não responsabilização do laboratório por efeitos colaterais.
Pazuello chegou a repetir o argumento de Bolsonaro, em pronunciamento. Menos de três meses depois, o presidente viu-se obrigado a negociar pessoalmente com a empresa a compra de 14 milhões de doses até junho.
Ou seja, se tivesse aceitado a oferta da empresa em agosto, o Brasil já teria imunizado um percentual muito maior do que os menos de 5% população vacinada hoje.
Reação ao efeito Lula
Não por coincidência, o último ataque de Bolsonaro às vacinas contra a Covid-19 ocorreu antes do histórico discurso de Lula em São Bernardo do Campo, no dia 10. Uma semana antes, o presidente de extrema direita bateu duro na política de compras de vacinas.
“Tem idiota que a gente vê nas redes sociais, na imprensa, [dizendo] ‘vai comprar vacina’. Só se for na casa da tua mãe. Não tem [vacina] para vender no mundo”, disse Bolsonaro, tentando esconder que o Brasil entrou para o fim da fila na luta por imunizantes por sabotagem dele próprio. Como resultado, desde fevereiro, diversas capitais suspenderam as imunizações por falta de doses.
Sete dias depois, Lula faria o contraponto humanista e a favor da vida que passou a representar um sopro de esperança ao povo brasileiro. O ex-presidente levou solidariedade às famílias das vítimas da doença no país e saudou os profissionais na linha de frente do Sistema Único de Saúde (SUS), “os heróis do SUS”.
“Decisão imbecil”
Lula também defendeu o uso de máscaras e álcool gel e o distanciamento social. Conclamou ainda o povo a não seguir as perigosas recomendações de Bolsonaro e do ministro da Saúde.
“Não siga nenhuma decisão imbecil do presidente da República e do ministro da Saúde, tome vacina. Tome vacina, porque a vacina é uma das coisas que pode livrar você do covid”, pediu Lula. Por fim, Lula defendeu a formação de um gabinete permanente de crise em âmbito nacional, “uma frente ampla para combater a pandemia, para as vacinas”.
Da Redação, com informações de G1 e Folha de S. Paulo