Cada vez mais cara, comida desaparece dos pratos

Enquanto o preço do prato feito em restaurantes subiu 23% em um ano, a cesta básica já consome 71,71% do salário mínimo. “Esse país pode voltar a ser construído”, lembra Lula

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Aumento do PFem um ano é o dobro da inflação geral ao consumidor, de 11,3%

Feijoada sem torresmo e charque, salada sem tomate e nada de docinho no final. Assim são as refeições dos trabalhadores e suas famílias no Brasil de Jair Bolsonaro e seu ministro-banqueiro Paulo Guedes. Enquanto os dois transformaram a inflação de dois dígitos em motor da arrecadação fiscal para comprar votos no Congresso Nacional, a população passa fome e necessidade nas ruas e em casa.

A pesquisa do Prato Feito do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV) revela que a tradicional refeição de trabalhadores e trabalhadoras subiu 23% nos restaurantes entre maio de 2021 e abril de 2022. É o dobro da inflação geral ao consumidor, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que registrou 11,3% no período.

A sondagem considera as variações de preços de arroz, feijão-carioca, feijão-preto, alface, batata-inglesa, cebola, tomate, frango em pedaços, ovos e carnes bovinas. “Fica bem nítido o novo foco de inflação dos alimentos nos hortifrútis, por conta do excesso de chuvas em vários locais produtores, o avanço da inflação no alface, na batata e especialmente no tomate, que acumula inflação de 127% em 12 meses”, detalha na Folha de São Paulo Matheus Peçanha, economista responsável pelo levantamento.

Ouvidos pela reportagem, assalariados contaram as táticas que usam para se alimentar. “Para continuar comendo sem usar a mais do vale-refeição, eu e mais alguns colegas diminuímos a quantidade de comida no prato. De 500 gramas passei a comer 400 gramas, em média”, conta o bancário Marcelo Freitas.

Os restaurantes da capital paulista também se viram. Além do repasse dos custos com alimentos e outros insumos para o preço final aos consumidores, os estabelecimentos também deram um sumiço em cortes de carnes mais nobres, sobremesas e até acompanhamentos como batata frita e batata palha.

“Nos dias de feijoada, não tenho mais visto torresmo, principalmente nos restaurantes que você pode comer à vontade. E é só com linguiça, carne seca diminuiu bastante”, reclama o supervisor de projeto social Pedro Figueiredo de Moraes. “Esse preço para comer à vontade só sobe. Muitos restaurantes aqui da região de Vila Mariana (Zona Sul) fecharam também, não sei se isso pode ter influenciado nos preços”, finalizou.

O pesquisador da Fipe afirma que os resultados alertam para a difusão e a persistência da inflação sobre o poder de compra de salários e benefícios dos trabalhadores em razão do peso de itens ligados à alimentação. O impacto é sempre maior entre os mais pobres, cujo consumo é majoritariamente de alimentos e outros itens de sobrevivência.

Além da perda do poder de compra dos salários com a inflação, os trabalhadores também veem o vale-alimentação durar cada vez menos. Panorama elaborado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) em parceria com a Alelo revela que, entre fevereiro de 2020 e fevereiro de 2022, caiu de 27 para 24 o número de dias corridos necessários para esgotar o saldo. Se cada vez “sobra mais mês no fim do vale-refeição”, é porque o valor médio também caiu no período, de R$ 465,20 para R$ 415,30

Dieese: cesta básica aumenta em todas as capitais pelo segundo mês

Em casa, a situação também é preocupante. Após a alta de março, o valor do conjunto dos alimentos básicos voltar a aumentar em abril em todas as capitais onde o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) realiza mensalmente a Pesquisa Nacional da Cesta Básica de Alimentos. Em 12 meses, todas as capitais tiveram alta de preço.

São Paulo foi a capital onde o conjunto dos alimentos básicos apresentou o maior custo (R$ 803,99). Com base nesse valor, o Dieese estima que o salário mínimo necessário para a manutenção de uma família de quatro pessoas deveria equivaler a R$ 6.754,33, ou 5,57 vezes o mínimo de R$ 1.212,00. Em abril de 2021, o valor deveria ter sido de R$ 5.330,69, ou 4,85 vezes o mínimo vigente na época, de R$ 1.100,00.

Considerando o salário mínimo líquido, após o desconto de 7,5% da Previdência Social, o trabalhador precisou comprometer 71,71% da remuneração para adquirir os produtos de uma cesta básica, suficiente para alimentar um adulto durante um mês. Em março de 2022, o percentual foi de 67,90%, e em abril de 2021 ficou em 62,17%.

O Dieese leva em consideração nesse cálculo a determinação constitucional que estabelece que o salário mínimo deve ser suficiente para suprir as despesas de um trabalhador e a família com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência.

Para Bolsonaro, que tem “embrulho no estômago” ao cumprir a Constituição, nada disso importa. Não à toa, encerrará o mandato com a triste marca de primeiro presidente desde 1994 a se despedir – e já vai tarde – com o salário mínimo valendo menos do que quando assumiu.

Após a posse, Bolsonaro extinguiu a política de valorização do piso nacional adotada durante os governos do PT. Pactuada com patrões e empregados, a regra, que levava em conta a inflação mais a variação do Produto Interno Bruto (PIB) dos dois anos anteriores, aumentou o salário em 77,2% em termos reais ao fim de 13 anos de Governos Lula e Dilma.

“Nós provamos que é possível aumentar o salário mínimo, cuidar da pequena e média agricultura, colocar as pessoas mais humildes da periferia na universidade, nas escolas técnicas, mandar os filhos dos trabalhadores estudarem no exterior. Esse país pode voltar a ser construído, o país que todos nós sonhamos”, garantiu Luiz Inácio Lula da Silva nesta segunda-feira (9), durante o evento de criação do movimento Todos Juntos pelo Brasil em Belo Horizonte.

O presidente mais popular da história, que se despediu do cargo com 87% de aprovação, afirmou que continuará lutando pelas “pessoas que ficaram desempregadas, os 19 milhões que estão passando fome, os 116 milhões que têm algum problema de insegurança alimentar, os milhões e milhões de brasileiros que saem para procurar emprego todo dia e voltam para casa sem, os milhões de brasileiros que trabalham por aplicativo sem ter férias, sem ter seguridade social, sem ter descanso remunerado”.

Veja o discurso: (https://www.youtube.com/watch?v=qGzxsNxM3DE&t=1275s)

Da Redação

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