Em trinta anos, a desigualdade de gênero regrediu apenas 5%
Um progresso muito lento, segundo o Informe sobre a Desigualdade Global. Hoje, a participação do trabalho das mulheres na renda global dos países não ultrapassa 35%
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A década de 90, que já parece longínqua, começou com o triste índice de 30% de participação das mulheres na renda global. Se em trinta anos avançamos em questões importantes na pauta feminista, o acesso à renda e trabalho remunerado não avançou na mesma medida em escala mundial.
Três décadas depois, o trabalho feminino amarga a participação de apenas 35% na renda global, sendo pouco mais de 50% da população em todo globo. Existem várias razões para esse índice, um deles é o acúmulo e a sobrecarga do trabalho não-remunerado, que envolve todas as funções de cuidado e garantia da reprodução da vida — que, estrategicamente, não são contabilizados e nem considerados como parte da riqueza mundial, apesar de ser fundamental para a existência da humanidade.
Esses são dados do Informe sobre a Desigualdade Global, desenvolvido ao longo de quatro anos, por mais de 100 pesquisadores e pesquisadoras, no Laboratório de Desigualdade Mundial (World Inequality Lab -WIL-).
Segundo o levantamento, a dinâmica do processo de desigualdade de gênero não é a mesma em todos os países. Alguns registraram avanços, como EUA e Canadá, no entanto outros representaram reduções significativas na participação do trabalho das mulheres na renda global, como na China.
Já na América Latina, as mulheres conquistaram espaço importante nos últimos anos. Saindo de 27% em 1990 e chegando a 33% em 2020.
As desigualdades social e de gênero são escolhas políticas, não “casualidades”
O Informe reforça a brutal desigualdade social que caracteriza o mundo contemporâneo — que se aproxima dos índices do início do século 20, no auge do imperialismo ocidental. Atualmente, os 10% mais ricos da população recebem mais da metade da renda mundial, enquanto a metade mais pobre da população recebe apenas 8,5%. No Brasil, metade dos mais pobres ganham 29 vezes menos que os 10% mais ricos. Na França, um dos países menos desiguais, essa diferença entre mais ricos e mais pobres é de sete vezes.
O documento destaca o aumento das desigualdades não apenas entre os países, mas dentro dos próprios países – um fenômeno que, no caso do Brasil, se aprofundou ainda mais durante a pandemia. Ou seja, em escala histórica, apesar da recuperação econômica e do crescimento dos países emergentes, o mundo segue sendo brutalmente desigual.
“Os dados reforçam que a luta de classes permanece cruel e viva como nunca. Atuar por justiça social e pelo fim da desigualdade é uma questão de sobrevivência em escala mundial, sobretudo quando se trata das mulheres trabalhadoras”, avalia Anne Moura, Secretária Nacional de Mulheres do PT.
De fato, metade da população mais pobre hoje recebe menos do que os mais pobres recebiam em 1820, quando muitos países ocidentais ainda eram colônias. O levantamento revela que ainda tem uma longa estrada para desfazer as desigualdades econômicas globais herdadas da organização da produção mundial entre os séculos 19 e 20.
Dentre as alternativas apresentadas pelo documento para um mundo com mais sustentabilidade e justiça social estão a redistribuição da riqueza, a taxação de bilionários e multimilionários, e (re)investimento em educação, saúde e transição ecológica.