Enquanto combustíveis sobem, Bolsonaro vende outra refinaria
Estudo do INEEP mostra que refinaria Lubnor será vendida 55% abaixo do seu valor. Petroleiros farão protesto em frente à refinaria na sexta (27) e FUP vai recorrer à Justiça
Publicado em
O preço negociado pela Petrobras, que tem como maior acionista o governo comandado por Jair Bolsonaro (PL), para a venda da Refinaria Lubrificantes e Derivados do Nordeste (Lubnor), localizada na cidade de Mucuripe (CE) à Grepar Participações Ltda é, pelo menos, de 55% o que vale a unidade da estatal.
O cálculo foi estimado em um estudo realizado pelo Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) e revoltou os petroleiros tanto por causa da perda do patrimônio dos brasileiros quanto pela entrega da refinaria cearense a preço de banana. A categoria vai fazer protestos para alertar a sociedade e acionar a Justiça.
O Sindicato dos Petroleiros do Ceará (Sindipetro-CE) já convocou os trabalhadores e trabalhadoras para um protesto contra e venda da refinaria, nesta sexta-feira (27), a partir das sete da manhã, em frente ao Portão A da Lubnor (Rua Leite Barbosa, S/N, Mucuripe).
E a Federação Única dos Petroleiros (FUP) já avisou que vai acionar a Justiça para impedir que a Petrobras venda a Lubnor, como fez com a Refinaria Landulfo Alves (Rlam), da Bahia, também a preço de banana e com enormes prejuízos a população do estado que está pagando os mais altos preços pelos combustíveis do país. Os preços são tão exorbitantes que serão investigados pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Veja mais detalhes no final.
Pela metade do preço
De acordo com os parâmetros utilizados pelo Ineep para fazer os cálculos sobre o valor da Lubnor, a refinaria localizada no Ceará está avaliada com um valor mínimo, pelas projeções cambiais mais elevadas deste ano, de US$ 62 milhões, quando o valor negociado pela estatal com o potencial comprador foi de US$ 34 milhões. Ou seja, quem comprar vai levar a refinaria por quase metade do preço do que ela vale.
Dos US$ 34 milhões, US$ 3,4 milhões seriam já pagos no mesmo dia do anúncio da venda (quarta-feira, 25); outros US$ 9,6 milhões serão pagos no fechamento da transação; e US$ 21 milhões em pagamentos diferidos. O montante, segundo a Petrobras, não contempla o pagamento de ajustes previstos no contrato, devidos até o fechamento da transação. A operação está sujeita ao cumprimento de condições precedentes, tais como a aprovação pelo Cade.
Um dos pesquisadores que faz parte do grupo de estudo do Ineep que analisou a venda da Lubnor, o economista Eduardo Costa Pinto, observa que as refinarias que estão sendo vendidas pelo governo, como a da Bahia e do Amazonas, são praticamente pela metade do preço.
“Existe um contexto econômico que não faz sentido vender as refinarias, mas a Petrobras prefere vender a preços ainda mais baixos seus ativos. O nosso questionamento é por quê, quem ganha com isso?, pergunta o economista.
Para ele, a explicação é o saque que vem sendo feito ao patrimônio público desde o golpe de 2016 contra a ex-presidenta Dilma Rousseff (PT).
“Até o argumento de economistas neoliberais de que a privatização iria fazer os preços baixarem, cai por terra ao vermos como os baianos têm pago a mais pelos combustíveis, após a venda da refinaria [Rlam] do estado”, contesta o pesquisador do Ineep. Entenda o processo de venda da Rlam abaixo
A guerra não terminou
Os petroleiros cearenses também estão convidando para o ato em defesa da Lubnor, nesta sexta, políticos e movimentos sociais, diz Francisco Antonio Fernandes Neto, diretor do Sindipetro (CE) e da FUP.
“A guerra ainda não terminou. Vamos analisar todo o processo de venda que traz prejuízos imensos à região nordestina por que a Lubnor é responsável por toda a produção de asfalto do Nordeste e até do estado do Pará, na região Norte. A venda fará com que uma empresa privada tenha monopólio do setor”, diz Neto.
Ainda de acordo com o dirigente, o sindicato vai analisar junto à sua assessoria jurídica o contrato de venda para verificar possíveis brechas relacionada ao terreno em que está instalada a refinaria.
“Já temos outras ações que questionam o valor abaixo do mercado e impactos econômicos. Agora há uma discussão sobre a quem pertence o terreno onde a Lubnor está instalada. Parte do terreno foi cedida pela União e outra parte pelo município de Fortaleza, por isso a Petrobras não poderia vender uma área que não é sua”, acredita Neto.
Em nota divulgada quinta-feira (26), a FUP diz que a assessoria jurídica da entidade está monitorando junto com o Ineep, os critérios adotados pela direção da Petrobras para a definição do preço de venda da Lubnor e os impactos econômicos e sociais do negócio para o estado cearense e a região nordestina.
Para e entidade, a transação representa “a entrega de mais um ativo da área de refino da estatal à iniciativa privada em meio à conjuntura de escalada dos preços dos combustíveis, da inflação e de ameaça de desabastecimento interno de derivados de petróleo”.
“É mais uma iniciativa da gestão da Petrobras de venda de ativos, a preço aviltado, sem debate com a sociedade brasileira. Um desmonte de patrimônio público anunciado em meio a mais uma troca no comando da companhia em apenas 40 dias. Uma decisão equivocada, com possíveis efeitos perversos para a economia e o emprego nordestinos”, disse o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar.
A Lubnor
Localizada no Ceará, a Lubnor tem hoje 201 trabalhadores próprios, sendo 170 diretos; 70 da operação e 31 de órgãos apoiadores que prestam ou não serviços à refinaria. Outros 200 são terceirizados diretos e ainda tem os indiretos.
A refinaria, uma das líderes nacionais na produção de asfalto e a única no país a produzir lubrificantes naftênicos de usos nobres , produz também óleo combustível, diesel marítimo, nafta, CM30, OAF. O GLP a refinaria recebe, armazena e distribui para a Nacional Gás Butano, Liquigás e Ultragaz.
Em comunicado, a Petrobras destacou que a refinaria é o quarto ativo a ter um contrato de compra e venda assinado no âmbito do compromisso firmado pela estatal com o Cade em 2019 para a abertura do mercado de refino no Brasil.
Brasil paga caro pelo óleo refinado, mas vende refinarias locais
Desde 2019, a Lubnor e mais oito refinarias estão na mira da privatização da Petrobras, que mudou a sua política e decidiu exportar óleo cru e importar o refinado, deixando de lado a produção local e pagando em dólar pelo produto que ela mesmo extrai no país.
A possibilidade de fechar as refinarias só para importar combustíveis reduziria a quase zero os impostos arrecadados nos estados em que elas estão instaladas. Os municípios que são afetados pelas operações de embarque e desembarque de petróleo ou gás natural, também perderão milhões de reais mensais em royalties.
A Lubnor é a terceira refinaria da Petrobras colocada à venda pelo governo Bolsonaro. A primeira foi a Refinaria Landulpho Alves (Rlam), na Bahia, privatizada no final do ano passado com valor 30% abaixo do mercado e do estimado pelo Ineep e por bancos de investimento.
Já a venda da Refinaria Isaac Sabbá (Reman), no Amazonas, por 70% de seu valor, não está concluída e é alvo de ações na Justiça contra o negócio.
A FUP tem denunciado a forma açodada das privatizações, sem transparência no processo de formação de preço de venda, e que representará a construção de monopólios privados no setor do refino do país, como o que ocorreu com a Rlam vendida para o fundo árabe Mubadala. Hoje a unidade, rebatizada Refinaria de Mataripe, na Bahia, tem os preços de venda de derivados mais caros do país. Além disso, a refinaria baiana tem deixado de fornecer combustível a navios (óleo bunker).
Cade vai investigar preços cobrados pela Petrobras e Rlam
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) determinou a abertura um inquérito nesta quarta-feira (25) para apurar se a Petrobras cobra mais do petróleo que vende para a refinaria de Landulpho Alves (Rlam), privatizada no fim de 2021.
Segundo o conselheiro do Cade, Gustavo Augusto de Lima que pediu a abertura do inquérito, o que foi aceito pelos demais conselheiros, a Petrobras estaria vendendo petróleo para a refinaria comprada pelo fundo Mubadala, dos Emirados Árabes, a um preço maior do que o cobrado às demais refinarias sob o controle da estatal.
Por outro lado, a refinaria privatizada também será investigada por cobrar mais caro pelo preço do combustível, muito acima do que as demais refinarias do país.
Do site da CUT