Estudantes e trabalhadores da educação criticam escolha de Bolsonaro

Ricardo Velez Rodríguez é favorável ao projeto Escola Sem Partido e enaltece o golpe militar no Brasil. Trabalhadores e estudantes prometem reagir

Nesta quinta-feira (22), o presidente eleito Jair Bolsonaro anunciou via Twitter a indicação do filósofo Ricardo Velez Rodríguez para o ministério da Educação. A escolha foi recebida com protestos por estudantes e trabalhadores em educação.

Velez Rodriguez é de origem colombiana, naturalizado brasileiro. Formado em filosofia pela Universidade Pontifícia Javeriana e em teologia pelo Seminário Conciliar de Bogotá, é professor-associado da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG). Em 2015, escreveu um livro chamado “A Grande Mentira: Lula e o Patrimonialismo Petista”, e tem utilizados as redes sociais para fazer críticas ao pensamento progressista.

Em um texto publicado em seu blog pessoal, Velez Rodríguez afirma que o dia 31 de março de 1964, dia do golpe militar no Brasil, é “uma data para lembrar e comemorar”. “Nos treze anos de desgoverno lulopetista os militantes e líderes do PT e coligados tentaram, por todos os meios, desmoralizar a memória dos nossos militares e do governo por eles instaurado em 64”, escreveu o futuro ministro. Na mesma publicação, Velez chama a Comissão Nacional da Verdade, que investigou os crimes cometidos por agentes do Estado durante a ditadura, de “omissão da verdade”.

Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, explica que a nomeação reflete uma grave conjuntura política. “Ricardo Velez Rodriguez tem o apoio dos militares porque ele, inclusive, atua no âmbito de escolas militares, como também tem o apoio do Olavo de Carvalho, que é o ideólogo do governo de Jair Bolsonaro. O Ricardo Velez Rodriguez, em 2017, defendeu o projeto Escola Sem Partido”, lembra.

Pela primeira vez, o Brasil terá um ministro da Educação favorável ao projeto. Nomeados por Michel Temer (MDB), os ministros anteriores, Mendonça Filho e Rossieli Soares, o consideravam um retrocesso.

Trabalhadores e estudantes prometem reagir

Segundo Jessy Dayane, vice-presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE), a entidade já orientou seus filiados a realizar campanhas contra o que chamam de Escola Com Mordaça. “A UNE já deu a orientação de campanha contra o projeto Escola Com Mordaça, que é a forma como a gente chama o projeto, e os processos de resistência, luta e mobilização permanecerão”, afirma.

Dayane lembra que escolas e universidades têm demonstrado, na história recente, que são espaços de resistência ao conservadorismo. “Esse ataque que eles estão fazendo nas escolas, nas universidades, é justamente porque esse é um território onde eles não têm espaço e não têm força. Então, assim como foi no período do golpe, como agora nas eleições, as universidades e as escolas foram um terreno de resistência, de luta, de manifestações. Acredito que não será diferente”, completa.

Essa reação encontra respaldo entre os representantes da categoria dos trabalhadores em educação. Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), promete que haverá luta. “A resistência vai acontecer de forma permanente nas três esferas de poder. Estamos atuando no legislativo. Caso seja aprovado o projeto, vamos para o Judiciário. E vamos continuar negociando com os poderes executivos para se criar resistência nos estados, como está acontecendo já no Maranhão, na Paraíba. E vamos fazer com que os estados reajam. E vamos manter o nosso processo de mobilização de rua, articulados com os movimentos sociais”, anuncia Araújo.

Nos últimos dias, oposição e situação travaram várias batalhas na comissão especial da Câmara dos Deputados que analisa o projeto Escola Sem Partido. Após esgotadas as possibilidades de obstrução da votação pela bancada contrária ao projeto, a matéria deve ser votada no dia 29 de novembro.

Daniel Cara entende que ainda há chance de adiar o envio do projeto ao Senado, para que o plenário da Câmara debata com profundidade o tema e ouça os argumentos das comunidades escolares: “É preciso ter claro que o Escola Sem Partido vai estabelecer um clima terrível nas escolas públicas, nas escolas privadas, nas universidades. E é preciso enfrentar esse projeto de lei, como a gente tem feito o enfrentamento”.

Uma ação que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) era encarada como um possível obstáculo à aprovação do Escola Sem Partido, e estava prevista para ser julgada no próximo dia 28 de novembro. Trata-se de um recurso sobre uma decisão que suspendeu uma lei estadual de Alagoas, semelhante ao projeto do Escola Sem Partido, que está em tramitação na Câmara dos Deputados. Nesta quinta-feira (22), informou-se que o julgamento não ocorrerá na próxima semana.

“A realidade é que o Escola Sem Partido não será julgado, muito provavelmente, no dia 28 de novembro, o que dá um sinal muito ruim da postura do Supremo Tribunal Federal diante do governo eleito”, critica Cara.

Heleno Araújo alerta que, embora não seja lei, o projeto tem estimulado coação e assédio contra professores pelo país afora. “Os casos que nós denunciamos e que estamos acompanhando, muitas vezes, são de profissionais assustados, com medo do processo, e boa parte deles ainda não filiados aos sindicatos”, explica. “Nneste momento, para enfrentarmos essa conjuntura, é necessário ter uma ação coletiva e uma proteção coletiva. E isso significa fortalecer os sindicatos, fazer filiação, e fazer o enfrentamento juntos nesse processo”.

Além de Velez Rodríguez, Bolsonaro anunciou esta semana o nome de Luiz Henrique Mandetta para a pasta da Saúde.

Do Brasil de Fato

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