MEC: nova denúncia levanta mais um caso de corrupção no governo Bolsonaro
Candidato a deputado estadual no Pará, empresário conta que o então ministro da Educação Milton Ribeiro pediu R$ 5 milhões para “facilitar licitações”. Pastor envolvido sabia de operação da PF, afirma ele
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Quinta-feira (22) difícil para Jair Bolsonaro. Enquanto pesquisa Datafolha apontava que 69% dos brasileiros acreditam que haja corrupção em seu desgoverno, o Estado de São Paulo publicava matéria sobre mais uma denúncia contra o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro. Aquele por quem o chefe do Executivo disse que “colocaria a cara no fogo”, depois recuou e afirmou que botaria só a mão. Ambos estão mais chamuscados.
O empresário do setor da construção civil Ailson Souto da Trindade, candidato a deputado estadual pelo PP no Pará, procurou o Estadão para denunciar que Ribeiro deu aval à negociação de contratos de obras federais de escolas em troca de propina para os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura. Segundo ele, o pagamento – R$ 5 milhões em dinheiro vivo, claro – viajaria escondido no pneu de uma caminhonete de Belém (PA) até Goiânia (GO), onde está a sede da igreja dos pastores.
O jornal incluiu na reportagem link para o áudio da denúncia de Trindade, que deverá ser anexada ao inquérito sigiloso do Supremo Tribunal Federal (STF) por interferência de Bolsonaro na investigação contra Ribeiro. Ele e os dois pastores chegaram a ser presos pela Polícia Federal (PF) em junho, acusados de manterem um “gabinete paralelo” no MEC para liberar verbas em troca de compra de bíblias ou pagamento de propina em dinheiro ou ouro.
O inquérito da PF foi aberto após o “gabinete paralelo”, que funcionava na própria sala do ministro, ser revelado pelo Estadão, em março. Ao jornal, prefeitos contaram que só conseguiam acesso ao ministro ou verbas para obras pagando propina aos pastores.
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Trindade já é o 12º na fila de delatores do esquema no MEC. Ele afirma que, em 13 de janeiro de 2021, recebeu do então ministro a garantia de que facilitaria licitações de obras públicas para sua empresa, contanto que “ajudasse” a igreja dos pastores.
“O ministro fez uma reunião com todos os prefeitos (no prédio do MEC). Depois houve o coquetel, num andar mais acima. Lá, a gente conversou, teve essa conversa com o ministro. Eu não sabia nem quem era o ministro”, conta o empresário no áudio.
“Eles falaram: ‘existe uma proposta para tu fazer isso (as obras)’. Aí eu disse: ‘que proposta?’. ‘Bom, a gente está precisando reformar umas igrejas e estamos precisando também construir alguns templos, no Maranhão, no Pará, e também outros lugares. Então estamos precisando de R$ 100 milhões para fazer isso’”, prossegue o empresário.
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Conforme a reportagem, as datas dos encontros relatados pelo empresário batem com o registro de entrada dele no ministério, em Brasília, com fotos nas redes sociais e com a agenda de Milton Ribeiro e dos pastores. Também estava presente Marcelo Ponte, diretor do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), órgão com orçamento bilionário controlado pelo Centrão e alvo de denúncias de corrupção.
Ministro teria dito que estava “tudo esquematizado” para operação da PF
Trindade conta ainda que, após o escândalo eclodir, ele telefonou para o pastor Arilton Moura pedindo para não ser mencionado nos interrogatórios da PF. “Eu liguei para ele. Perguntei o que estava acontecendo”, afirma o empresário.
“Já combinamos com o presidente e o ministro”, teria dito o pastor. “O ministro já está providenciando tudo e a gente vai ficar calado, aí eu tô aguardando que a PF a qualquer momento vem na minha casa, mas tá tudo já… resolvido, tudo esquematizado.”
Em uma ligação grampeada pelos policiais, Milton Ribeiro contou à filha que havia sido alertado por Bolsonaro sobre a possibilidade de ser alvo de um mandado de busca. “Ele acha que vão fazer uma busca e apreensão em casa”, relatou o ex-ministro na ligação. A PF enviou parte do caso ao STF por suspeita de interferência do chefe do Executivo nas apurações.
Responsável pela investigação, o delegado Bruno Calandrini convocou o diretor-geral da PF, Márcio Nunes de Oliveira, e outros integrantes da cúpula para prestar depoimento sobre a interferência de Bolsonaro. Além deles, já foram intimados o diretor de Combate ao Crime Organizado, Caio Pellim, e o superintendente da PF em São Paulo, Rodrigo Bartolamei. Os interrogatórios estão marcados para a próxima quarta-feira (28).
A informação foi publicada pelas jornalistas Andréia Sadi e Julia Duailibi, da Globo. A investigação ganhou novo capítulo após a divulgação de mensagem em um grupo de policiais, logo após a prisão de Ribeiro, em que Calandrini reclamou da falta de autonomia e de independência funcional para conduzir a investigação.
Em 7 de julho, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), fez a leitura em plenário do requerimento de abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o caso. Embora as investigações só comecem após o período eleitoral, na ocasião os senadores da bancada do PT cobraram o início imediato do funcionamento da CPI do MEC.
“Precisamos unir forças e cobrar o início da investigação sobre a corrupção desenfreada no Ministério da Educação. O povo brasileiro exige respostas”, disse na ocasião o senador Humberto Costa (PT-PE). “Assim como aconteceu na CPI da Covid, vamos desvendar o submundo das propinas e garantir as verbas da Educação”, garantiu o senador Rogério Carvalho (PT-SE).
Quarto ministro(?) da Educação do desgoverno Bolsonaro, Ribeiro chegou ao cargo indicado pela primeira-dama Michelle Bolsonaro. No dia em que ele foi exonerado, em março, ela afirmou que “Deus vai provar que ele é uma pessoa honesta”. Em outra ocasião, a primeira-dama se limitou a dizer “amo a vida dele” e “eu confio muito nele”. Depois dessa denúncia, a tarefa de Deus ficou mais complicada.
Da Redação, com informações do PT Senado