Nota da defesa na data em que a prisão ilegal de Lula completa um ano

Também há necessidade de que as grosseiras violações às garantias fundamentais de Lula sejam reparadas pelos agentes brasileiros que aceitaram, com a comprovada ajuda de agentes norte-americanos

Juca Varella

Advogados de Lula, Cristiano Zanin e Valeska

Na condição de advogados do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva reiteramos nesta data (07/04/2019), um ano após sua prisão injusta e incompatível com a Constituição Federal, que a absolvição e o restabelecimento da liberdade plena de Lula são resultados que se impõem em relação aos recursos e procedimentos em tramitação perante Cortes Nacionais e Internacionais. Também há necessidade de que as grosseiras violações às garantias fundamentais de Lula sejam reparadas pelos agentes brasileiros que aceitaram, com a comprovada ajuda de agentes norte-americanos, a promover o “lawfare” contra Lula e contra o Estado de Direito no país.

É oportuno, nessa direção, relembrar que:

(a) A decisão condenatória que serviu de base para prender Lula em 07/04/2018 foi antecedida por medidas judiciais arbitrárias e que atentam contra o Estado de Direito, requeridas pelos Procuradores da Lava Jato de Curitiba e autorizadas pelo ex-juiz Sérgio Moro — escolhido pelos acusadores com base na irreal afirmação de que recursos da Petrobras estariam envolvidos no caso. É possível citar, como exemplos dessas medidas arbitrárias:

(a.1) as medidas invasivas adotadas contra Lula, seus familiares e colaboradores em 04/03/2016; naquela data Lula foi preso por cerca de 6 horas para prestar um depoimento que jamais havia se recusado a dar, apenas para criar perante a opinião pública e a sociedade um clima artificial de culpabilidade, próprio do “lawfare”; a “condução coercitiva” de investigados foi julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal por meio de liminar deferida em 17/12/2017 e confirmada pelo plenário da Corte em 04/06/2018, mas essa decisão não teve qualquer repercussão para o caso do ex-Presidente Lula;

(a.2) a interceptação do principal ramal do nosso escritório e monitoramento em tempo real de toda a estratégia de defesa estabelecida em favor de Lula pelos seus advogados; as conversas gravadas eram depositadas pela Polícia Federal na Secretaria do órgão judiciário presidido pelo ex-juiz Sérgio Moro (13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba) com anotações e organogramas sobre as medidas que estavam sendo cogitadas e debatidas pelos advogados constituídos, possivelmente para que antídotos fossem criados simultaneamente
(https://www.conjur.com.br/2016-mar-17/25-advogados-escritorio-defende-lula-foram-grampeados?fbclid=IwAR04WCa_ElNz8aJzAcrq85elB9vouLo5QBzceih4hb4jmldLBjjGXdWFmig); nenhum dos envolvidos foi punido e a queixa-crime proposta por Lula contra o ex-juiz Sérgio Moro por abuso de autoridade e violação à Lei das Interceptações Telefônicas (Lei nº 9.206/96) foi arquivada sumariamente pelo TRF4 (https://www.conjur.com.br/2017-mar-10/trf-rejeita-queixa-crime-ex-presidente-lula-sergio-moro);

(a.3) a decisão proferida pelo TRF4 ao analisar as interceptações realizadas contra Lula, seus familiares, colaboradores e advogados, que afastou a ocorrência de qualquer irregularidade na adoção de tais medidas sob a inaceitável justificativa de que a Lava Jato “constitui, sem dúvida, uma situação inédita, a merecer um tratamento excepcional” (https://www.conjur.com.br/2016-set-23/lava-jato-nao-seguir-regras-casos-comuns-trf).

(b) A despeito de todas as arbitrariedades praticadas contra Lula, seus familiares, colaboradores e advogados, nenhuma prova material contra o ex-Presidente foi coletada pelas autoridades; tal situação, porém, não impediu que Lula e sua esposa fossem vítimas de uma insana disputa entre alguns membros do Ministério Público de São Paulo e da Lava Jato de Curitiba para acusa-los de crimes que não cometeram; o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) deu razão à defesa de Lula, reconhecendo que promotores não podem escolher o caso em que irão atuar, mas tal decisão não teve qualquer efeito para o caso do ex-Presidente (https://www.conjur.com.br/2016-fev-23/apesar-ver-irregularidade-cnmp-mantem-conserino-triplex);

(c) Em 14/09/2016 a Lava Jato de Curitiba apresentou o injurídico “PowerPoint” contra Lula, acusando-o de ser o chefe de uma organização criminosa; o subterfúgio para essa iniciativa era irreal, pois a denúncia protocolada naquela data sobre o “triplex” não continha essa acusação contra o ex-Presidente;

(d) Referido “PowerPoint” selou uma aliança definitiva entre a Lava Jato e setores da imprensa para condenar Lula com base em manchetes e reportagens baseadas apenas na retórica dos procuradores da República envolvidos, sem qualquer prova material, outra característica do “lawfare”;

(e) O processo que levou Lula à prisão sempre teve o resultado pré-definido pelos membros do Sistema de Justiça envolvidos; todas as perícias requeridas pela defesa de Lula para comprovar que nenhum valor da Petrobras foi destinado direta ou indiretamente ao ex-presidente (“follow the money”) foram indeferidas pelo ex-juiz Moro (https://jornalggn.com.br/justica/se-delator-escrever-em-papel-de-pao-que-deu-4-milhoes-a-lula-devemos-acreditar/);

(f) Após a oitiva de 73 testemunhas que jamais confirmaram a versão acusatória, o interrogatório de um dos corréus, José Adelmário Pinheiro (Leo Pinheiro), foi adiado por uma semana sem uma explicação racional; o depoimento desse corréu, prestado sem o compromisso da verdade e reconhecidamente interessado em obter benefícios junto aos procuradores da Lava Jato, é a base da condenação do ex-Presidente;

(g) Antes do depoimento de Leo Pinheiro a imprensa já havia noticiado que esse corréu estava sendo pressionado por algumas autoridades para fazer referência ao nome de Lula em troca de benefícios; na condição de advogados de Lula pedimos uma investigação, mas o caso foi sumariamente encerrado (https://www.conjur.com.br/2017-nov-26/lula-protesta-mp-relatos-pressao-delata-lo);

(h) A sentença do ex-juiz Sérgio Moro condenou Lula pela prática de “atos indeterminados” usando como referência julgados de uma corte intermediária dos Estados Unidos que defendiam a configuração de crime de corrupção sem a necessidade da comprovação de um ato de ofício de agente público (já superados por decisão da Suprema Corte daquele país em sentido oposto); ao analisar recurso (embargos de declaração) apresentado contra a sentença condenatória, o ex-juiz Sergio Moro reconheceu que jamais havia identificado qualquer valor de contratos da Petrobras destinado a Lula, como sempre foi afirmado pela sua Defesa, mas, a despeito disso, manteve a jurisdição escolhida pelos Procuradores da Lava Jato e a condenação do ex-Presidente (https://reinaldoazevedo.blogosfera.uol.com.br/2017/07/19/xiii-moro-escorrega-e-admite-que-a-sentenca-que-condenou-lula-nao-tem-como-base-a-denuncia-do-mpf/);

(i) A sentença condenatória proferida pelo ex-juiz Moro também ignorou a prova de inocência realizada pela Defesa de Lula: em 2010 a OAS vendeu (cessão fiduciária em garantia) 100% do valor econômico e financeiro do “tripex” a um fundo gerido pela Caixa Econômica Federal (https://jornalggn.com.br/justica/nem-de-lula-nem-da-oas-triplex-e-da-caixa-ha-pelo-menos-7-anos/); vale dizer, o apartamento jamais poderia ter sido dado ou “atribuído” a Lula em 2014 sem que tivesse sido comprovado pagamento do valor correspondente em uma conta da Caixa especificada em contrato;

(j) Durante a tramitação do recurso dirigido ao TRF4, apresentamos relevantes fatos novos que foram expressamente desprezados por aquela Corte de Apelação, tais como: (i) declaração de próprio punho de João Vaccari Neto desmentindo as acusações de Leo Pinheiro (Pinheiro afirmou que Vaccari teria atuado como intermediário de Lula em conversas relativas ao “triplex”) e (ii) vídeos de ex-promotores dos Estados Unidos admitindo que ajudaram informalmente – e, portanto, de forma ilegal, sem amparo no Tratado Internacional que disciplina a relação entre os países – os membros da Lava Jato a construir o caso contra Lula e a condenar o ex-Presidente (https://jornalggn.com.br/justica/em-video-procurador-dos-eua-admite-parceria-secreta-com-lava-jato/);

(k) Embora o processo do “triplex” reúna mais de 250 mil páginas, o recurso de Lula no TRF4 tramitou em tempo recorde (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/08/1912821-recurso-de-lula-foi-o-que-mais-rapido-chegou-a-2-instancia.shtml); o resultado negativo foi anunciado pelo Presidente do TRF4 antes da realização do protocolo do recurso pela Defesa de Lula (https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,sentenca-que-condenou-lula-vai-entrar-para-a-historia-diz-presidente-do-trf-4,70001925383);

(l) Lula foi preso antes mesmo do esgotamento de todos os recursos na segunda instância (https://br.reuters.com/article/topNews/idBRKCN1HC31Y-OBRTP); a Constituição Federal (art. 5º, LVII) assegura que a presunção de inocência somente pode ser afastada diante da existência de decisão condenatória definitiva (transitada em julgado), o que não existe no caso do ex-Presidente;

(m) A Petrobras participou de todo o processo do “triplex” na condição de assistente de acusação do MPF contra Lula, afirmando ser vítima; nos Estados Unidos, porém, firmou um acordo com promotores daquele país confessando, de forma contraditória, ser culpada pelos mesmos fatos;

(n) No anexo em que narrou os fatos ilícitos que embasaram a confissão de culpa, a Petrobras fez referência a ex-funcionários, empresários e políticos; contraditoriamente à posição adotada pela petrolífera no Brasil, não há qualquer referência a Lula ou a qualquer participação do ex-Presidente no esquema criminoso (https://jornalggn.com.br/noticia/defesa-de-lula-ve-motivo-para-anular-caso-triplex-em-acordo-entre-eua-e-petrobras/);

(o) A cooperação da Lava Jato com autoridades norte-americanas foi escondida da Defesa de Lula durante todo o processo; até mesmo as perguntas sobre o tema foram indeferidas pelo ex-juiz Sérgio Moro (https://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/11/1834625-defesa-de-lula-ve-elo-suspeito-da-lava-jato-com-eua.shtml) enquanto estava sendo gestada a fundação privada de R$ 2,5 bilhões que atualmente está em análise do Supremo Tribunal Federal (https://www.conjur.com.br/2019-mar-29/lava-jato-defende-supremo-acordo-firmado-petrobras);

(p) Em 2018 o Brasil se recusou a dar cumprimento a medidas cautelares (“interim measures”) concedidas pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU que determinavam ao país, com a força vinculante, dentre outras coisas, que fossem assegurados os direitos políticos de Lula, salvo se houvesse decisão condenatória definitiva baseada em “processo justo” (https://nacoesunidas.org/comite-de-direitos-humanos-da-onu-pede-que-lula-exerca-direitos-politicos-e-tenha-acesso-a-imprensa/); tais decisões foram proferidas no âmbito de um comunicado individual que levamos ao Comitê em julho de 2016 (https://www.youtube.com/watch?v=bDIqNNw10RI) e que poderia ter sido julgado no último mês de março, não fosse uma manifestação protelatória apresentada pelo Brasil em 19/03/2019;

(q) Os recursos que dirigimos às Cortes Superiores (STJ e STF) contêm sólidos fundamentos jurídicos, alinhados à jurisprudência atual desses Tribunais, para que seja afastada a condenação imposta por Moro e pelo TRF4 a Lula e para que ele seja colocado em liberdade.

É preciso enfatizar nesta data, diante do histórico apresentado, que defender a absolvição e o restabelecimento da liberdade plena para o ex-Presidente Lula significa defender o resgate do Estado de Direito no país.

Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Martins

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