Pomar: Derrotas e vitórias eleitorais, a compra de votos e tudo o mais

Em todo o país milhares de petistas disputaram as eleições, centenas de milhares fizeram campanha, muitos se elegeram, e muitos mais contribuíram para os milhões de votos obtidos no primeiro turno

As campanhas eleitorais de 2016 foram realizadas em condições totalmente diferentes das anteriores: o financiamento ficou restrito a pessoas físicas, a duração das campanhas caiu pela metade, a propaganda foi limitada, a “Ficha Limpa” foi flexibilizada, e mudou o cálculo dos proporcionais. Só continuaram iguais – ou maiores – a compra massiva e impune de votos, o “caixa dois”, a prestação de contas “pra inglês ver”, o abuso de poder econômico, o uso das “máquinas administrativas” e a passividade da justiça eleitoral.

Todas essas mudanças e continuidades resultaram no óbvio, a nível nacional: os donos do Brasil foram os grandes vencedores das eleições municipais – os partidos que possuem os maiores esquemas de compras de votos e os candidatos com mais recursos foram os que mais ganharam eleições. A realidade eleitoral no Brasil é semelhante à da concentração de renda e desigualdade social, com os integrantes do 1% “representando” a maior parte dos 99%, assim como a compra massiva e impune de votos é semelhante às criminosas taxas de juros praticadas pelo sistema financeiro: ganham com elas os donos de tudo, inclusive da mídia e da justiça divina.

Ficou evidente que o cenário em 2016 seria desastroso para os partidos de esquerda já no ano passado, quando foram aprovadas as mudanças da legislação eleitoral, e o primeiro resultado prático dessas regras limitantes foi a redução do número de candidatas e candidatos – nos cursos de preparação em várias cidades, em 2015/16, pouquíssimos se dispunham a candidatar-se.

Muitos que agora escrevem sobre os resultados das eleições não trabalharam nelas, nem foram ao interior do Brasil no período. Apesar disso, acham que sabem o suficiente das campanhas pelo que viram na mídia, na Internet, de algumas pesquisas, e a partir dos números divulgados pelo TSE. Muitos deles não acreditam que ainda exista compra de votos em grande escala, a nível nacional, mas parece acreditarem que agora a maioria do eleitorado optou por candidatos representantes dos donos do Brasil, como se essa não fosse a realidade no país desde sempre.

Infelizmente, tais análises passam ao largo das questões centrais do sistema político capitalista: o abuso do poder econômico, expresso na compra massiva de votos, “caixa dois”, transporte de eleitores e tudo o mais, impunes na esmagadora maioria dos casos. O que mudou da parte deles, desde a época dos “coronéis” e “currais eleitorais”, até as eleições de 2016, foi, essencialmente, o cuidado com a legislação, em especial a relativa à prestação de contas – o que não serviu para alterar, até hoje, o caráter ficcional dos gastos de campanhas, posto que a compra de votos não pode ser contabilizada na íntegra, e muitos que contribuem não querem ou não podem aparecer, porque suas doações são incompatíveis com os ganhos declarados no Imposto de Renda…

A proibição do financiamento empresarial não prejudicou candidatos empresários, nem os candidatos de empresários, porque eles são profissionais em dinheiro e contabilidade. A nova legislação tem a brecha certa para os endinheirados, que podem contribuir para as suas próprias campanhas quanto quiserem. E muito dinheiro costuma tornar vitoriosas campanhas de medíocres – basta ver os eleitos para confirmar isso. Esse ano, as campanhas comprovaram que giram em torno do dinheiro, e dos esquemas relacionados a ele, dos candidatos a vereador e prefeito aos seus deputados e respectivos patrocinadores de fato.

A manutenção das práticas eleitorais corruptas, as alterações da legislação, o desgaste e criminalização da atividade política, e a intensa propaganda contrária ao PT e à sua principal liderança, desanimaram a militância e levaram a maioria da parcela flutuante do eleitorado a votar em candidatos(as) representantes de interesses contrários aos de trabalhadores e trabalhadoras.

Apesar de todos os pesares, em todo o país milhares de petistas disputaram as eleições, centenas de milhares fizeram campanha, muitos se elegeram, e muitos mais contribuíram para os milhões de votos obtidos no primeiro turno.

Milton Pomar é geógrafo, mestrando em Estado, Governo e Políticas Públicas pela Fundação Perseu Abramo, trabalha em campanhas eleitorais desde 1986.

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