Revista do PT no Senado traz estudo sobre trabalho doméstico não remunerado

Medição do uso do tempo no trabalho doméstico não remunerado e seu reconhecimento no PIB são alguns dos pontos abordados na publicação sob o olhar da doutora Marcia Anita Sprandel

Válter Cirillo/Pixabay

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), 16,4 bilhões de horas diárias são dedicadas ao trabalho de cuidado não remunerado

A agenda do trabalho doméstico não remunerado vem sendo debatida há décadas pelos movimentos feministas e por organismos internacionais, como Organização Internacional do Trabalho (OIT), ONU Mulheres e Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal).

O trabalho doméstico não remunerado é o conjunto de serviços prestados em casa, sem pagamento, que inclui atividades cotidianas e inescapáveis, como limpeza, preparação e cozimento de alimentos, cuidado informal com os moradores.

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Na América do Sul, dez países já possuem legislação e políticas públicas para tratar do tema, seja o reconhecimento do trabalho doméstico não remunerado na Constituição (República Dominicana, Venezuela, Equador e Bolívia); leis de cuidados em vigor (Venezuela, Colômbia, Equador e Uruguai); leis que criam Contas-Satélites de Trabalho Doméstico Não Remunerado (Colômbia, Peru e Argentina) e leis que preveem a realização de pesquisas de uso do tempo (Mexico, Peru Colômbia e Argentina).

Além disso, propostas de leis gerais de cuidados tramitam nos parlamentos de Peru, Paraguai e Argentina.

No Brasil, o Senado Federal analisa o projeto que cria a Política Nacional de Cuidados (PL 5.791/2019). Na Casa, a proposta contou com a relatoria do senador Paulo Paim (PT-RS) durante a análise pela Comissão de Direitos Humanos (CDH) e no plenário. Aprovada pelo conjunto dos senadores no último dia 5 de dezembro, a proposta seguiu para a sanção presidencial. A ideia é garantir direitos e promover melhorias nas relações profissionais ou voluntárias de cuidado no país.

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), 16,4 bilhões de horas diárias são dedicadas ao trabalho de cuidado não remunerado. Essa realidade afeta tanto países emergentes quanto desenvolvidos, que enfrentam falta de políticas públicas adequadas.

No Brasil, dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua de 2022 (PNAD-C 2022) mostram que, em média, são dedicadas 17 horas semanais a afazeres domésticos e/ou ao cuidado de pessoas, sendo que as mulheres destinam quase o dobro do tempo dos homens a essas atividades.

Para conferir a íntegra da edição n.º 3 da revista Farol clique aqui.

Entevista:

Em entrevista ao PT no Senado, a doutora em antropologia e assessora técnica da bancada na Casa Marcia Anita Sprandel fala da realidade do trabalho doméstico não remunerado.

PT no Senado: O trabalho doméstico não remunerado é uma questão debatida há décadas e não se restringe ao nosso país. É possível afirmar que esse debate tem amadurecido nos últimos tempos? Os países estão avançando nesse debate em torno da garantia de direitos?

Marcia Sprandel: Desde os anos 1970, quando os movimentos feministas europeus lançaram a bandeira da remuneração ao trabalho doméstico como uma provocação aos estados sobre o seu valor para a economia e para a sociedade, o debate se desdobrou em várias outras agendas das mulheres nas décadas de 1980 e 1990, até ser incorporado pelas Nações Unidas, e, dessa forma, chegar a vários países do mundo. No hemisfério sul, a agenda do trabalho doméstico não remunerado se uniu às demandas não só dos movimentos de mulheres, mas também de todas as lutas por trabalho decente, igualdade salarial, moradia digna, direito a creches etc. Penso que, com isso, ganhou nova força.

PT no Senado: Existe um debate acerca da economia do cuidado, inclusive sobre metodologias e possibilidade de remuneração dessas trabalhadoras. A criação de contas-satélites com o objetivo de medir (e ajudar a reduzir) as desigualdades de gênero e ajudar a eliminar as diferenças de rendimento é uma solução plausível para a questão?

Marcia Sprandel: As contas-satélites são instrumentos importantes para valorar a contribuição de determinada área da economia para o PIB do país. No caso da saúde, por exemplo – como já temos no Brasil- trata-se de trazer o que está espalhado no Orçamento para um lugar só, e depois quantificar. No caso da conta-satélite de trabalho doméstico não remunerado, o exercício é outro. É preciso quantificar as horas desprendidas pelas famílias – especialmente pelas mulheres, é fato- nas tarefas domésticas. Para isso o IBGE, na Pnad-Contínua, já tem os instrumentos (quantificação de horas e listagem de tarefas). A partir daí se calcula o valor dessas tarefas se fosse pago para outra pessoa realizá-la. Com isso, chega-se a um valor que representa a contribuição do trabalho doméstico não remunerado para o PIB. Os resultados são impressionantes.

PT no Senado: Projetos de lei sobre a economia do cuidado estão em tramitação no Congresso Nacional. Já está tramitando no Senado a Política Nacional de Cuidados – PL 5791/2019. Como a maior parte da carga de trabalho do cuidador não remunerado recai sobre as mulheres, o texto prevê a adoção de medidas para reduzir essa sobrecarga nas famílias, promovendo a corresponsabilização de outros familiares, principalmente os homens.

Caso essa proposta seja aprovada pelo Senado, já seria possível determinar o impacto dessas medidas na vida das pessoas que hoje realizam esse trabalho doméstico não remunerado?

Marcia Sprandel: A aprovação do PL 5791/2019 significa um avanço social e uma mudança cultural. Historicamente uma questão a ser resolvida apenas pelas famílias, e, dentro delas, delegado às mulheres, o cuidado passará a ser tratado como uma responsabilidade de toda a sociedade (famílias, estado, sociedade civil e empresas). Inovará, igualmente, ao estimular a divisão do trabalho doméstico entre homens e mulheres.

Nas redes sociais, o ministro Wellington Dias já anunciou algumas das ações a serem implementadas, como o direito previdenciário para cuidadores não remunerados, creches, centros de atenção diurna, cuidados domiciliares, teleassistência, direitos dos cuidadores remunerados etc  Estou bastante otimista com a implementação da Política Nacional de Cuidados, um dos projetos prioritários do nosso governo.

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Do PT no Senado

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