Rodrigo Cesar: Sobre o balanço – parte 2
Historiador e membro do conselho da Escola Nacional de Formação do PT avalia os motivos pelos quais a direita golpista vem obtendo êxito
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No primeiro texto publicado nesta Tribuna de Debates do 6º Congresso do PT apontamos algumas posturas que devemos evitar ao fazer um balanço do último período, apresentando um percurso alternativo. Sugerimos refletir sobre os motivos pelos quais a direita golpista vem obtendo êxito e conquistando seus objetivos e iniciar esta análise observando os movimentos que realizaram.
Do lado de lá, foram realizados simultaneamente três movimentos principais.
Primeiro, a construção da unidade. Diante da seguida ampliação da massa salarial e da redução da taxa de juros pelos bancos públicos no primeiro semestre de 2011, as diferentes frações da grande burguesia que haviam se dividido no final do governo FHC voltaram a se unificar, desta vez em torno do objetivo de tirar o PT do governo federal nas eleições de 2014.
Como o plano principal não deu certo, o golpismo ganhou força e passou a operar com duas táticas que se retroalimentavam: de um lado, pressionando o segundo governo Dilma a adotar uma política econômica recessiva que, além de atender os interesses do grande capital, desgastava o governo e o PT; de outro, instrumentalizando as investigações da operação Lava Jato para agravar a crise política e utilizar a corrupção como pretexto para a interrupção do mandato presidencial.
O capitalismo realmente existente no Brasil, incapaz de conviver com a ampliação do bem-estar e baseado na superexploração da força de trabalho para manter seu padrão de acumulação, unificou seu núcleo dirigente e reaproximou setores da pequena burguesia e dos trabalhadores assalariados de alta renda para radicalizar o modelo neoliberal.
Assim, tanto para aqueles que operavam com a oposição de direita quanto para os que operavam com a direita dentro do governo federal, derrotar o PT passou a ser um meio necessário para alcançar os objetivos estratégicos centrais: intensificar a exploração do trabalho, restringir as liberdades democráticas e subordinar o Brasil aos interesses imperialistas.
O segundo movimento foi o ataque pela base. Cientes de que a principal fortaleza do PT, ainda que em relativo declínio, são seus profundos vínculos com a classe trabalhadora e os setores populares, e que as realizações dos governos Lula e Dilma constituíam peças importantes destes laços, a grande burguesia preferiu dobrar a aposta na instrumentalização de três pautas: a corrupção, os valores e a crise econômica.
Com a política do inimigo único, responsabilizou-se exclusivamente o PT pelos problemas nestes três terrenos especialmente sensíveis e nos quais nos encontrávamos particularmente vulneráveis. Disseminou-se a tese falaciosa de que o PT:
1) montou um grande esquema de corrupção para perpetuar-se no governo federal;
2) tem uma ideologia que desvirtua os valores morais da sociedade;
3) foi irresponsável na gestão do orçamento público, provocando uma grande crise fiscal.
As consequências econômicas da adoção de um ajuste fiscal recessivo logo após as eleições de 2014 amplificaram na classe trabalhadora a repercussão dos ataques ao PT, canalizando contra nós as insatisfações – até então difusas – da maioria da população, que segue enfrentando uma dura realidade mesmo depois de ascender socialmente.
Terceiro movimento: a artilharia blindada. Para realizar sua ofensiva, a grande burguesia mobilizou para a linha de frente aquelas instituições que não apenas estão sob seu efetivo controle como também tem os menores níveis de controle popular democrático: o legislativo, o judiciário e a mídia monopolista.
Além disso, ainda que o Congresso Nacional esteja imerso na crise generalizada do sistema político brasileiro, o poder judiciário e a grande mídia seguem com altos índices de confiança perante a população. Mesmo que a manipulação midiática e a parcialidade jurídica estejam se tornando cada vez mais evidentes, a artilharia segue pesada e pouco contestada pela maioria do povo.
Na tentativa de conferir uma suposta legitimidade ao golpe, somou-se aos ritos processuais jurídicos e parlamentares as mobilizações de massas pelo impeachment, impulsionadas por grandes financiadores, convocadas por movimentos liberais e de extrema direita e compostas pelas classes médias tradicionais dos grandes centros urbanos.
A tentativa de construir hegemonia combinando convencimento e coerção tem se orientado para isolar política e ideologicamente os setores democráticos e progressistas, tornando menos visível a denúncia contra a violência jurídico-policial e o estado de exceção que recai sobre os movimentos sociais e organizações de esquerda que resistem ao golpe.
Portanto, a direita conseguiu unificar-se em torno do objetivo comum de derrotar o PT e radicalizar o neoliberalismo; erodir os nossos vínculos com a classe trabalhadora; e destacar instituições blindadas para conduzir o golpe.
Em suma, os inimigos comportaram-se como inimigos e foram implacáveis. Não deveríamos esperar nada menos que isso.
Para conseguir reverter o quadro é preciso se perguntar como ele se formou, ou mais precisamente: por que não conseguimos derrotar o golpe?
Isso é assunto para o próximo texto.
por Rodrigo Cesar, historiador, membro do conselho da Escola Nacional de Formação do PT e filiado no diretório municipal de São Paulo para a Tribuna de Debates do VI Congresso. Saiba como participar.
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