Selma Rocha e Artur Henrique: Sobre a situação nacional

Leia artigo do caderno de contribuições para o 6º Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores

Tribuna de Debates do PT

1. O Golpe de Estado, consagrado em 17 de abril de 2016 pela Câmara Federal e consumado pelo Senado em 31 de agosto de 2016, tem como objetivo efetivar o programa antipopular e antinacional derrotado nas urnas visando ampliar os padrões de lucratividade do capital. Foi a saída encontrada pelas oligarquias financeiras, industriais, agrárias, midiáticas e pelos partidos que as representam para subordinar a política econômica aos pressupostos da ortodoxia neoliberal em sintonia com a tendência mundial do capitalismo de concentrar e exportar capitais, ampliando a financeirização da economia no contexto da globalização.

2. Trata-se de outro projeto de país, envolvendo uma visão sobre o Estado e suas instituições, sobre a economia, as relações de trabalho, a sociedade, a política, a democracia, a cultura, os valores e os modos de vida.

3. O Golpe foi dado para atacar os direitos de nosso povo, especialmente dos mais pobres, reduzindo a renda dos trabalhadores e promovendo o desemprego, pois a miséria, a exclusão social e a pobreza são funcionalmente necessárias aos padrões de acumulação pretendidos pelo novo grupo que usurpou o poder. Essa é a dimensão mais profunda do Golpe.

4. A oposição e os setores neoliberais explicam a crise e justificam o golpe em função da corrupção e dos problemas fiscais no País, mas a verdade é que o empresariado, que supostamente se beneficiaria das desonerações fiscais e da ampliação de investimentos privados por parte do Estado, levados a efeito pelo governo Dilma, se recusou, deliberadamente, a investir e se associou às forças golpistas. Vale observar que, não obstante o empenho do governo Dilma de se aproximar do setor produtivo, desde 2012, com a chamada Nova Matriz Econômica, os ganhos no mercado financeiro prevaleceram, pois, no Brasil, esses são extraordinariamente maiores que os lucros produtivos.

5. Por outro lado, a ampliação dos padrões de distribuição da renda por meio da valorização do salário mínimo, que cresceu 76% entre 2003 e 2014, estimulou a produção interna e a formalização, provocando expressiva redução do desemprego, que passou de 12,4% em 2003 para 4,8% em 2014, invertendo uma tendência que marcou a era FHC. A política de valorização do salário mínimo dos governos Lula e Dilma permitiu, também, que a Previdência Social melhorasse o poder aquisitivo dos aposentados e pensionistas, enfrentando o problema de financiamento com a criação de empregos formais, entre outras medidas. O processo de distribuição de renda e a ampliação de direitos fizeram também com que a maior parte do empresariado tenha se engajado no boicote aos investimentos.

6. É essa ação deliberada que explica que tenhamos passado, em um ano, de um quadro de relativa estabilidade econômica para um quadro de crise profunda cuja natureza é, sobretudo, política.

7. As práticas extremamente conservadoras e fisiológicas da maioria dos parlamentares do Congresso Nacional, distribuídas em um número artificial de partidos políticos, sem base programática, ampliaram o raio de ação dos setores golpistas, em função da progressiva perda da base política do governo, resultante da brutal ofensiva midiática contra a presidenta Dilma e o PT, das escolhas em relação à política econômica e da dificuldade do governo e do partido de dialogar e mobilizar os trabalhadores e os setores progressistas da sociedade para sustentar seu programa e as reformas necessárias.

8. As condições para a sustentação social do golpe estabeleceram-se a partir de 2013. As manifestações iniciadas em São Paulo contra o aumento da passagem de ônibus, contra a violenta repressão desencadeada pelo governo Alckmin, a decorrente ampliação da pauta por mais direitos e a solidariedade aos manifestantes contra a repressão foram galvanizadas pela mídia e, progressivamente, pela extrema direita. Vale também ressaltar a campanha deflagrada e regiamente financiada por setores conservadores do ministério público contra a PEC 37 que manipulou e potencializou as manifestações deflagradas pelo Movimento Passe Livre. O conteúdo e o espaço das manifestações foram disputados permitindo que despontassem mobilizações incentivadas por antigas organizações de extrema direita e por novos grupos surgidos e organizados no espaço virtual da internet. As manifestações agregaram diferentes conteúdos anticorrupção, antipartidos, contra direitos sociais e humanos, mas, principalmente, contra ações e políticas identificadas com a esquerda.

O resultado das eleições de 2014 expressou as contradições presentes nas ruas

9. O povo reelegeu a presidenta Dilma a partir de compromissos públicos assumidos na campanha, mais avançados e radicalizados em relação às políticas públicas e a distribuição de renda, riqueza, poder e cultura que na eleição anterior. Paradoxalmente, o povo elegeu o mais reacionário parlamento desde a Constituinte de 1988, dando maioria na Câmara às forças mais conservadoras do país. No caso do Senado, o retorno de oposicionistas neoliberais como José Serra, Tasso Jereissati e outros permitiu maior racionalidade programática para unificar os setores conservadores do Congresso.

10. Essa circunstância levou Eduardo Cunha à Presidência da Câmara, fortalecendo as mais tradicionais práticas fisiológicas, abrindo espaço para a pauta e os ataques dos parlamentares conservadores, em sintonia com as crescentes ações das organizações de direita nas ruas.

11. Os subsídios fiscais e a elevação da taxa básica de juros para atrair capitais ampliaram o custo da dívida pública, a crise fiscal, a inflação e o desemprego, tornando atual, como afirmou o 5º Congresso, as propostas voltadas à superação da financeirização da economia.

12. A superação do rentismo como fundamento da dinâmica econômica tem sido apontada pelo PT como condição para fazer prevalecer no país a produção sobre a especulação. Malgrado nossos governos tenham desenvolvido políticas industriais que planejaram e executaram investimentos expressivos em áreas estratégicas como saúde, indústria naval, química e agroindústria. Embora tenhamos ampliado os investimentos na indústria de transformação, na produção de veículos, em Ciência e Tecnologia (1,3% do PIB) e em Educação (6,6% do PIB), não logramos dar sustentabilidade a essas políticas em face das determinações do tripé macroeconômico (metas de inflação, superávit primário e câmbio flutuante) e do poder de atração dos juros altos.

13. A direita nas ruas, com apoio político e financeiro da oposição, da mídia empresarial, de setores do empresariado e de ONGs internacionais, e ao lado dos panelaços, sob o manto da luta anticorrupção, sustentaram o impedimento da presidenta Dilma. As sucessivas ações espetaculares da Operação Lava Jato e a tentativa de sequestro do presidente Lula no aeroporto de Congonhas consolidaram o cenário do golpe.

14. Para os golpistas trata-se de realizar a substituição de um modelo de expansão e fortalecimento do mercado interno, via distribuição de renda (aumento do salário mínimo, transferência de renda e políticas públicas e sociais), ampliação do crédito e incentivo à produção com participação da sociedade na definição de políticas, por um modelo de atração de fluxos privados de investimentos, especialmente por meio das privatizações, de expansão do capital rentista e especulativo. Somam-se a tais políticas o enfraquecimento dos processos de integração latino americana (política, econômica e cultural) e dos BRICS. Para isso, era preciso impedir e inibir a manifestação e a participação da sociedade.

15. O golpe perpetrado contra os direitos sociais e a soberania nacional, conquistados ao longo de décadas pelo povo brasileiro – Previdência Pública, garantias trabalhistas inscritas na CLT, direitos sociais, civis e políticos inscritos na Constituição de 1988 e outros assegurados nos últimos 13 anos –, é o resultado de uma ofensiva planejada que revela o caráter antidemocrático das elites brasileiras e sua histórica e profunda indisposição de negociar direitos, hoje consentânea ao programa neoliberal ainda mais regressivo em relação ao conjunto dos direitos.

16. Duas semanas depois da ilegítima posse (12.05.16), isto é, em 24.05.16, o presidente interino lançou outro projeto de Estado e uma política econômica e social voltada para a contenção de gastos públicos (adoção de um teto para os gastos por 20 anos) envolvendo União, Estados e Municípios; entrega do Pré-sal aos interesses das grandes corporações americanas do petróleo, em especial a Chevron; amplo processo de privatização de empresas estatais, de bancos e de fundos públicos; reforma na Previdência; e mudanças na legislação trabalhista. Tudo isso em consonância com o documento “Uma Ponte para o Futuro”, apresentado pelo PMDB e em perfeita sintonia com as formulações do PSDB desde, pelo menos, 1994.

17. Além disso, para cortar e reprimir expectativas de direitos, o governo golpista realizou também, às pressas, uma reforma ministerial que extinguiu as Secretarias Nacionais das Mulheres, da Igualdade Racial e de Direitos Humanos, que tinham status de Ministérios. Fundiu o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações com o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário; a Previdência social foi desmontada. A Secretaria de Previdência Social, a Secretaria de Previdência Complementar e o DATAPREV estão sob a responsabilidade do Ministério da Fazenda e o INSS sob a responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário. A Secretaria Especial de Economia Solidária foi rebaixada.

18. A PEC 55, que ordena o ajuste fiscal, comprometerá a vinculação de recursos para a Educação e a Saúde previstas na Constituição em nível federal, estadual e municipal. Por essa razão, está em curso um ofensivo desmonte das políticas legadas pelos governos Lula e Dilma.

19. Vale destacar que, no caso da Educação, os cortes previstos tornarão inexequível o Plano Nacional da Educação e, associados a outras medidas como a MP do Ensino Médio, impedirão a mobilidade social e cultural dos jovens. Tais medidas facilitarão a ampliação do setor privado.

20. Na saúde, a PEC 55 aponta para o desmonte do SUS e para a privatização.

21. Além da privatização do Pré-Sal, o governo anunciou sua intenção de privatizar o Aquífero Guarani, maior manancial de água doce subterrânea do planeta.

22. Ao mesmo tempo, os bancos públicos suspendem crédito a aposentados por invalidez e o Banco do Brasil planeja demitir 18 mil funcionários. Somam-se a isso os cortes no Programa Minha Casa Minha Vida, no Bolsa Família (atingindo 5 milhões de pessoas), nos recursos para crianças com deficiência do BPC e nas verbas destinadas à reforma agrária. Os golpistas promovem o desmonte do Incra, do Programa de Aquisição de Alimentos, do Programa Nacional de Alimentação Escolar, enfraquecendo a agricultura familiar. Além disso, o Itamaraty extinguiu seu departamento de combate à fome.

23. Para manter uma inserção subordinada nas chamadas cadeias globais de produção, no âmbito da nova divisão internacional do trabalho, e ampliar a produtividade e os lucros, é fundamental atacar a CLT e os direitos trabalhistas consolidados desde a era Vargas, contando com o apoio sistemático dos grandes veículos de comunicação.

24. Pretende-se aprovar a proposta de terceirização de todas as atividades produtivas; aprovar mudança constitucional garantindo que o negociado (com ou sem sindicato) possa estar acima do legislado; aprovar que as jornadas de trabalho, especialmente na área de comércio e serviços, passem a ser mensais, semanais, diárias e também por hora efetivamente trabalhada, além de novas e flexíveis formas de contratação dos trabalhadores.

25. Esse é um ponto central. A política dos golpistas levará a um aumento expressivo do desemprego e da precarização do trabalho, em contraposição a uma fase de ampliação da formalização do trabalho, verificada especialmente entre 2003 e 2013, e uma queda brutal na renda dos salários no Brasil.

26. A consequência menos visível num primeiro momento, mas de profundo caráter regressivo, será a fragmentação da classe trabalhadora brasileira, dificultando ainda mais a sua organização e resistência em defesa de direitos.

27. A médio e longo prazo, o que pretendem os golpistas é o desmonte do Sistema Público de Emprego, Trabalho e Renda, com a aprovação de propostas de focalização das políticas de emprego (seguro desemprego, abono salarial, etc.) e o fim dos programas de apoio e fortalecimento da Economia Solidária.

28. A reforma da Previdência que pretendem para o País visa ampliar o tempo de contribuição dos trabalhadores e diminuir o acesso aos benefícios, na medida em que os proventos não estarão mais atrelados ao salário mínimo

29. As medidas implementadas ou anunciadas não poderiam ser colocadas em prática se o respeito à ordem democrática fosse garantido. A mídia oligopolizada, setores do Judiciário e do parlamento deram o golpe porque sabem que esse programa não venceria nas urnas. Para reduzir ao máximo a oposição a essas medidas, manipulam de forma arbitrária a lei em nome do combate à corrupção.

30. As instituições de Estado herdadas são fortemente marcadas por seu caráter antidemocrático, elitista e pelos vícios e a corrupção, que sempre denunciamos e combatemos, especialmente nos governos Lula e Dilma. No plano externo, expressam a conformação a uma ordem mundial opressiva, dominada pelo capital financeiro hegemonizada pelos Estados Unidos.

31. Para o PT, para os demais partidos de esquerda e para os movimentos populares trata-se de mobilizar os trabalhadores e os setores progressistas da sociedade na construção de um programa que ofereça alternativas ao que está sendo feito.

32. A violência do Estado, levada a efeito por setores do Ministério Público, do Judiciário e das polícias, particularmente no que se refere à Operação Lava Jato, materializa-se nas prisões por mera suspeita, nas conduções coercitivas sem base legal, nos vazamentos criminosos de dados, na exposição da intimidade dos investigados, na invasão desregrada das comunicações pessoais (inclusive em relação aos advogados), no cerceamento da defesa em procedimentos ocultos, em denúncias e sentenças calcadas em acusações negociadas com réus, e na produção lícita de provas, tornando tais práticas perigosamente banais.

33. Trata-se de perseguir e de desmoralizar as lideranças do PT e, se possível, destruir o partido, enfraquecendo o conjunto dos partidos de esquerda e os movimentos sociais

34. Esse é o sentido da truculenta ofensiva contra o ex-presidente Lula e sua família. Pretendem abalar sua liderança no Brasil e na América Latina e interditar o debate político-programático sobre as transformações que o país tanto necessita.

35. Completam esse quadro o extraordinário prejuízo econômico que a Operação Lava Jato trouxe ao País, da ordem de R$ 140 bilhões. Isso em razão da não consolidação dos acordos de leniência com as empresas, em face da insegurança jurídica, e da punição das empresas em vez da punição de acionistas e executivos, o que abala fortemente os setores da construção civil e da indústria naval. Além disso, a retração de gastos da Petrobras e da cadeia de fornecedores gerou mais de um milhão de desempregados. A condução da Lava Jato prepara a privatização da Petrobras e ameaça a soberania do País.

36. Por outro lado, a coerção, a repressão armada e a perseguição aos movimentos sociais e, sobretudo, de forma ainda mais covarde e violenta, contra os estudantes das ocupações; a autorização da aplicação de técnicas de tortura para obrigar estudantes a desocuparem escolas em Brasília; as chacinas no Rio de Janeiro e em São Paulo; os estudantes algemados no Tocantins; os artistas reprimidos durante a encenação de uma peça em Santos e a truculenta invasão da Escola Nacional Florestan Fernandes contra o MST vão tornando evidente o risco de caminharmos para a configuração de um Estado de Exceção, com maior autonomia dos órgãos de coerção e repressão do Estado.

37. Erige-se no Brasil uma nova forma de bonapartismo, conduzida agora pelo Judiciário de forma autoritária, por cima dos demais poderes de origem democrática, pretendendo ditar-lhes o curso. Extrapola suas prerrogativas, manipulando a população, em acordo com a mídia oligopolista, criando crises institucionais para atingir seus fins, funcionais aos planos sociais e econômicos que interessam às classes dominantes. Tal poder não hesita em atingir setores políticos dessas classes ao intimidar e disciplinar setores democráticos, movimentos populares e organizações de trabalhadores.

38. O aprofundamento da crise tem relação, também, com o fato paradoxal de o PT e o governo não terem logrado construir hegemonia de seu projeto político na sociedade como apontaram, a seu tempo, as resoluções do 3º e do 5º Congresso.

39. Contribuíram decisivamente para isso a não realização da reforma política; a insuficiência de políticas que barrassem a financeirização da economia, dificultando sobremaneira a sustentabilidade das medidas e investimentos voltados a ampliar a industrialização; a não democratização dos meios de comunicação; a não realização da reforma tributária e da reforma do estado. Nossos governos e nosso partido não tornaram públicas para amplos setores dos trabalhadores brasileiros, e para o conjunto da sociedade, as propostas de reformas que defendiam de modo a buscar conquistar ampla adesão e sustentação às transformações necessárias.

40. Além disso, disso é preciso destacar a incapacidade de nosso partido de dialogar com a sociedade, em razão de ter sido nosso funcionamento fortemente aprisionado às dinâmicas eleitorais externas e internas e consequente afastamento da organização das lutas sociais; o rebaixamento, ou mesmo abandono, em algumas circunstâncias, de nosso programa em função dos ditames do marketing político ou das questões relativas à governabilidade, tanto nos Executivos quanto nos parlamentos; os dilemas das relações entre partido e governo, dentre os quais talvez o mais importante tenha sido a dificuldade do PT de exercer sua autonomia relativa e crítica visando preservar seu programa e projeto estratégico.

41. A esquerda e os movimentos sociais têm reagido. Grandes manifestações conjuntas, milhares de atos específicos em todo o Brasil e em outros países estabeleceram um amplo campo de denúncia e luta contra o golpe institucional, escancarando a sua natureza. A criação da Frente Brasil Popular e da Frente Povo Sem Medo, a ofensiva da CUT, do MST, MTST, da CMP tem sido decisiva para a luta pela democracia, contra o golpe e contra os ataques aos direitos.

42. Tem sido de fundamental importância também a reação internacional contra o golpe no Brasil: organismos internacionais, entidades públicas, movimentos sociais, personalidades, jornais e TVs têm se manifestado sobre o que tem ocorrido no Brasil nos últimos seis meses.

43. Mas, apesar da reação o processo de criminalização do PT, a política econômica do segundo governo Dilma, a perda de apoio junto a nossa base social, os efeitos nos grandes centros urbanos das ofensivas da Operação Lava, especialmente contra o presidente Lula e ex-ministros de seu governo; a reforma eleitoral, comandada pelo ex-deputado Eduardo Cunha, reduzindo o tempo de campanha e os programas tanto no rádio quanto na televisão; a permissão de auto doações sem teto para os candidatos e a não fixação de um limite nominal para as contribuições individuais, abriram brechas para a influência do poder econômico e limitaram nossas possibilidades de enfrentamento dos partidos de direita durante as eleições, conduzindo o campo democrático-popular a uma profunda derrota eleitoral.

44. Passamos de 635 prefeituras para 256, de 5.166 vereadores para 2.808, perdendo cerca de 10 milhões de votos. A votação de brancos e nulos foi significativa, cerca de 28% de não votantes, expressando decepção e desconfiança em relação à política como espaço democrático de transformação social, terreno fértil para o avanço dos setores conservadores e da extrema direita que tem difundido ódio em todo o país.

45. As dificuldades do PT de dialogar com a sociedade nessas eleições não permitiram reconquistar o apoio e a confiança dos trabalhadores, dos pobres e da classe média.

46. No período pós-eleições municipais, marcado por forte despolitização e violência, o governo golpista se vê envolvido numa sucessão de escândalos: a prática de lobby em benefício próprio imputado ao ministro-chefe da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima; a crise aberta com o Judiciário na votação das medidas anticorrupção no Congresso Nacional; as denúncias da Odebrecht envolvendo o presidente golpista; e a ampliação das ofensivas de direita aprofundam a instabilidade institucional do país.

47. A crise econômica agradava pela ampliação de 12 milhões de desempregados, o crescimento da dívida pública, a estagnação do crescimento da economia, a política externa voltada para uma aliança privilegiada com os EUA e a natureza do programa de reformas em curso torna evidente que o país precisa de uma Reforma Política como medida inaugural de uma profunda reforma do Estado, da garantia de eleições livres e diretas e da construção, como sugeriu a presidenta Dilma, de uma oposição firme, incansável e enérgica contra o violento e antipopular ajuste fiscal previsto na PEC 55, contra a redução de direitos, contra o desemprego, a concentração de renda e riqueza e as privatizações.

48. O PT expressa seu inabalável compromisso com os homens e as mulheres, trabalhadores e trabalhadoras de todas as gerações e de todas as regiões do país que lutaram com coragem e disposição contra o golpe, em defesa da democracia e do cumprimento do mandato da presidenta Dilma, que estão lutando pela garantia de direitos sociais e políticos contra todas as formas de violência e repressão. O PT expressa seu profundo compromisso com os jovens que têm realizado as ocupações nas escolas e nas universidades instituindo práticas culturais e democráticas que devem servir de referência para as políticas educacionais e para o conjunto das políticas voltadas à juventude.

49. O PT pretende fortalecer, a partir da mais ampla unidade partidária, a unidade da esquerda e das forças populares visando ampliar a oposição ao programa neoliberal e as lutas em defesa dos direitos dos trabalhadores.

50. O PT deverá retomar, também, um trabalho molecular de diálogo e organização junto aos trabalhadores, o que envolve a criação dos comitês da campanha “Por um Brasil Justo para Todos e para Lula”, em sintonia com a ação dos movimentos sociais e a Frente Brasil Popular.

51. Nesse processo, devemos buscar a construção de um programa que apresente medidas
imediatas de defesa do emprego e de políticas públicas voltadas à distribuição de renda, ao crescimento e ao fortalecimento do mercado interno; de defesa da Previdência Social e de políticas sociais, especialmente para a saúde e a educação, fortemente atingidas pela PEC 55, levando-se em conta a configuração da classe trabalhadora e seu perfil de organização (ver anexo). A estrutura atual do mundo do trabalho, com destaque para os trabalhadores por conta própria, sem carteira assinada, exigirá políticas específicas e formas de diálogo e de luta capazes de chegar a esses setores visando contribuir para sua organização e formação política.

52. A partir de amplo e fecundo diálogo com a sociedade, com os trabalhadores e com as trabalhadoras, especialmente com a juventude, continuaremos apontando a urgência e a necessidade da reforma agrária, da reforma urbana, da reforma política e da reforma do Estado; da necessidade de controle social do Judiciário, da reforma tributária, da democratização das comunicações, da defesa e proteção de nosso patrimônio ambiental e do fim de qualquer forma de discriminação e violência contras as mulheres, os negros, os indígenas e a população LGBTT, em defesa dos direitos humanos.

53. O PT se coloca de forma firme e vigorosa o imprescindível desafio de rever sua estrutura, de dinamizar suas instâncias, sua política de formação e de comunicação para que, como partido de massas, ao lado dos movimentos sociais, esteja à altura de defender as conquistas e os direitos da maioria de nosso povo afirmando um programa voltado para a defesa dos interesses dos trabalhadores e, portanto, da justiça social, da liberdade, do fortalecimento da democracia e da soberania nacional.

Fora Temer!
Não à PEC 55!
Não à Reforma da Previdência!
Nenhum direito a menos!
Não às privatizações!
Pela antecipação de Eleições Diretas!

Anexos
1 – AS CLASSES SOCIAIS E O MUNDO DO TRABALHO

Mercado de Trabalho e Informalidade – População Economicamente Ativa, Trabalhadores formais Empregados, Desempregados, Empregadores, Conta própria, etc. *

POPULAÇÃO ATIVA TOTAL – Hoje no Brasil (2016) temos uma população economicamente ativa (PEA) da ordem de 102 milhões de brasileiros, sendo 90 milhões ocupados e 12 milhões desempregados. Soma-se a esses números, quase 64 milhões de pessoas de 14 anos ou mais de idade consideradas não economicamente ativas (inativas) e temos um total de 166 milhões de brasileiros que compõem a chamada PIA – População em Idade Ativa.

QUADRO DOS DESEMPREGADOS – Dos 12 milhões de desempregados, 51% são mulheres; 9,5% são jovens de 14 a 17 anos, 32,5% de 18 a 24 anos, 35% de 25 a 39 anos, 20,8% de 40 a 59 anos e 2,2% acima dos 60 anos de idade.

Metade dos desempregados no Brasil (algo em torno de 6 milhões de pessoas) são jovens e mulheres.

QUADRO DOS OCUPADOS – Dos 90 milhões de ocupados, 57,2% são homens e 42,8% são mulheres. Desse total de ocupados, 55 milhões (61%) são empregados (44 milhões no setor privado e 11 milhões no setor público); 23 milhões (25%) são trabalhadores por conta própria; 6,2 milhões (7%) de trabalhadoras (es) domésticas (os), sendo 2 milhões com carteira assinada e 4,2 milhões sem carteira assinada; 3,7 milhões (4%) são empregadores e 2,1 milhões (2,4%) são trabalhadores auxiliares familiares.

Aproximadamente 1/3 de todos os ocupados são trabalhadores por conta própria ou trabalhadoras domésticas ou auxiliares familiares, o que na grande maioria dos casos indica que essas pessoas (31 milhões) não são “base social organizada” por nenhum dos movimentos sociais tradicionais da esquerda brasileira. (talvez a exceção seja em parte a Fenatrad – Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, filiada a CUT).

Dos 44 milhões de trabalhadores do setor privado, pouco mais de 10 milhões (22,7%) não têm carteira assinada e, portanto, também não são representados por nossos “tradicionais” sindicatos de trabalhadores “formais”, o que representa um enorme desafio organizativo.
Dos 90 milhões de ocupados da PEA, 11 milhões estão na indústria em geral (12,2%); 7,4 milhões na construção civil (8,2%); 9,4 milhões na agricultura (10,4%); 15,7 milhões na administração pública, educação e seguridade social (17,4%); 4,5 milhões no transporte (5%); 17,4 milhões no comércio (19,3%); 24,6 milhões no setor de serviços, informática, comunicação, financeiro, alojamento e alimentação (27,3% do total).

Dos 46,5 milhões de ocupados, quase 52% estão no setor de comércio, serviços e transporte. Esses setores são, em sua grande maioria, marcados por uma enorme fragmentação, descentralização, precarização e, portanto, com enormes dificuldades de organização. (exceto a organização sindical no setor financeiro)

POPULAÇÃO NÃO ECONOMICAMENTE ATIVA – A parcela da população em Idade Ativa (PIA) que não exerce nenhuma atividade de trabalho remunerada é considerada como “inativa”. No entanto, são pessoas que a qualquer momento podem buscar um trabalho remunerado ou mesmo realizar um trabalho não remunerado ou ainda usar seu tempo livre para atividades de lazer ou mesmo de educação profissional.

É preciso analisar com cautela esse enorme contingente de quase 64 milhões de pessoas. A começar pelo gênero, 66% desse total são mulheres, quase o dobro, portanto, dos 34% de homens; pouco mais de 23 milhões (36%) são de pessoas com 60 anos ou mais (não se sabe se aposentados) que somados aos 14 milhões de 40 a 59 anos de idade (22%) representam mais da metade dessa população;

Os jovens de 14 a 17 anos são 11 milhões (17%); de 18 a 24 anos são 7 milhões (11%) e de 25 a 39 anos 8,6 milhões (13,5%)

São 11,4 milhões (18%) sem instrução ou com menos de 01 ano de estudo; 22,8 milhões (35%) com ensino fundamental incompleto; 7,3 milhões (11,5%) com ensino fundamental completo; 5,6 milhões (8,8%) com ensino médio incompleto; 10,9 milhões (17,2%) com ensino médio completo; 2,0 milhões (3,2%) com ensino superior incompleto; 3,6 milhões (5,6%) com ensino superior completo.

*Fonte: IBGE, elaboração Observatório do Mercado de Trabalho de São Paulo, SDTE/DIEESE.

2 – A REPRESENTAÇÃO SINDICAL*

Em relação à representação sindical, a situação geral é a seguinte: somando-se o número de trabalhadores com carteira assinada, (trabalhadores formais, do setor privado, do setor público e das trabalhadoras domésticas) temos um total de 45.546 mil trabalhadores e trabalhadoras. Em tese, são a base de todos os trabalhadores representados por algum sindicato no Brasil.

O último levantamento realizado pela PNAD – IBGE sobre índices de sindicalização são de 2009 e apresentavam um resultado de 17,7% de sindicalizados (16.450.356).

Porém, os próprios sindicatos de trabalhadores (que no Brasil somam 10.926 atualmente) afirmam e informam ao Ministério do Trabalho que as centrais sindicais no Brasil representam 12.757.121 trabalhadores sindicalizados (dados de 2015), o que significaria uma taxa de sindicalização da ordem de 28% sobre a base de trabalhadores formais com carteira (45.546) ou uma taxa de 20,13% de todos os ocupados, excluindo os empregadores e trabalhadores por conta própria (a base portanto seria de 63.370 mil);

Independente do número exato, o fato concreto é que, mesmo considerando uma taxa de sindicalização de 28% (uma das maiores do mundo, excluindo a China), devemos considerar a existência de quase 64 milhões de brasileiros e brasileiras que compõem a população não economicamente ativa que não estão sindicalizados e organizados. Pode-se considerar que parte dos 23 milhões de aposentados possuem algum nível de organização seja dentro das Centrais Sindicais ou fora delas.

Representação sindical no Brasil

Estas são as seis (6) centrais sindicais reconhecidas pelo Ministério do Trabalho como centrais sindicais representativas com um mínimo de 5% de sindicalizados em todas as regiões do pais e são as Centrais que recebem parte (10%) dos recursos do imposto sindical, sendo 60% para os sindicatos de base, 15% para as Federações, 5% para as Confederações e 10% para o Ministério do Trabalho.

As seis centrais sindicais receberam, em 2016 (até Setembro), aproximadamente R$ 192.983.000,00 (relativos aos 10%);

Além centrais reconhecidas, temos o CONLUTAS com 105 sindicatos reconhecidos e 286.732 trabalhadores sindicalizados (2,25%), a CGTB com 217 sindicatos e 239.844 sindicalizados (1,88%) e ainda outras 5 centrais sindicais existentes sem grande quantidade de sindicatos ou número de sindicalizados.

Há, ainda, 2.791 sindicatos que dizem representar 2.245.076 (17,60%) trabalhadores que não declararam filiação a nenhuma Central Sindical até o momento.

** Fonte: Ministério do Trabalho e Páginas das Centrais Sindicais de Trabalhadores.

(*) Parte integrante do caderno de contribuições para o 6º Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores. Leia outros artigos do caderno aqui. Baixe aqui o PDF com todos os textos.

ATENÇÃO: ideias e opiniões emitidas nos artigos da Tribuna de Debates do PT são de exclusiva responsabilidade dos autores, não representando oficialmente a visão do Partido dos Trabalhadores

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