Renato Simões: Estrutura e funcionamento partidário

Leia artigo do caderno de contribuições para o 6º Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores

Tribuna de Debates do PT

1 . O contexto atual e as tarefas do Partido

“Ao longo de seus 27 anos, o PT viveu várias crises e soube enfrentá-las e superá-las. A mais grave, pela sua natureza e dimensão, foi a de 2005. Essa crise, que é do sistema político brasileiro, que enfraquece programas e partidos, personaliza o debate e privatiza os interesses, também é uma crise do PT, decorrente de opções feitas pelo partido, do crescente acesso a mandatos, do distanciamento das lutas sociais e da nebulização de nosso projeto estratégico.

A experiência do primeiro mandato governando o Brasil e a enorme crise política pela qual passamos em 2005 e 2006 nos levam a um processo de reavaliação da nossa trajetória, de reflexão sobre a experiência destes 27 anos e, particularmente, deste último período.

O esforço da nossa militância e a capacidade de compreensão do povo brasileiro quanto ao que estava em jogo na tentativa das elites de interditar o projeto popular representado pelo governo Lula foram decisivos para a superação da crise. No entanto, o conjunto das forças petistas deve realizar uma autocrítica profunda sobre o ocorrido e analisar suas causas para não mais reproduzi-las”

(3º. Congresso Nacional do PT, 2007, Resolução sobre A Crise Política).

Diferentemente de 2013, quando o balanço crítico e auto-crítico da estrutura e funcionamento do PT em seu 3º Congresso deu-se num contexto de vitória política – Lula reeleito, depois da crise do mensalão, e o governo em processo de avaliação positiva crescente – o 6º Congresso realiza-se no contexto de uma profunda derrota política histórica de nosso Partido, com consequências nacionais e internacionais de relevância ímpar, em decorrência do golpe em curso contra a classe trabalhadora, a democracia e o governo da presidenta Dilma.

Muitas das questões levantadas pelo 3º Congresso merecem ser retomadas. Algumas delas por serem corretas e ainda atuais e urgentes. Outras, por terem sido equivocadas e ainda passíveis de debate e correção. Em ambos os casos, por suscitarem a necessidade de implementação de políticas inadiáveis para fortalecer acertos e corrigir erros, consolidando o PT como o principal partido da esquerda brasileira e força política capaz de unir em torno de si um amplo leque social de resistência ao golpe e defesa da democracia e dos direitos da classe trabalhadora.

O golpe iniciado com o processo de impeachment fraudulento da Presidenta Dilma avança na direção de anular as conquistas sociais, econômicas e políticas dos nossos governos com a ampla maioria parlamentar e amplo suporte judicial de que dispõe nesses primeiros meses de sua implementação. Com forte apoio midiático, o PT é apresentado com o partido da corrupção e da irresponsabilidade fiscal, aquele que conduziu o País a uma crise profunda que só o golpe e as medidas impopulares por ele propugnadas serão capazes de enfrentar.

Nossa resistência, nas ruas e no Congresso Nacional, não foi capaz de evitar a implementação de uma 48 onda regressiva de direitos ali votada: a PEC 55, PEC do Fim do Mundo, e a reforma do ensino médio avançaram nas votações e não encontraram oposição no Poder Judiciário, quando invocado, e abrem caminho para outras matérias impopulares como a da reforma da Previdência. O PT e os movimentos sociais são descredenciados em sua posição pela narrativa da herança maldita de Temer, que ainda assim não logra angariar simpatia e popularidade.

Tanto quanto nas eleições municipais, a imagem do PT e da esquerda política e social ainda inspira ódio em uma parcela significativa e mobilizada da opinião pública, apatia em vários setores sociais que historicamente foram beneficiados por nossos governos e que pouco participaram da resistência democrática até o momento, e desconfiança em vários novos sujeitos sociais em luta na sociedade contra o golpe e seu governo.

No entanto, há crescentes setores em luta que reconhecem a necessidade e a relevância da defesa do legado petista de governo, de suas realizações e conquistas hoje descredenciadas na estratégia de comunicação do golpe, e da defesa do PT, dos movimentos sociais, de nossa principal liderança, o presidente Lula, da presidenta Dilma e tantos companheiros e companheiras criminalizados e achincalhados pela mídia golpista.

A resistência democrática e a derrota do golpe dependem da unidade da esquerda, da sua capacidade de diálogo com os setores democráticos que combatem o arbítrio e as medidas de exceção dos Poderes da República identificados com o retrocesso, de disputa de um projeto de esquerda contra a agenda neoliberal dominante e de mobilização social nacional e internacional. Para essas tarefas, o PT não é instrumento suficiente. Mas sua execução não será atingida sem o PT assumindo a responsabilidade de reorganizar sua ação, fazer os ajustes necessários em sua linha política, assumir um novo programa para o avanço social e dar espinha dorsal a uma frente política potente para a retomada da democracia e a disputa de hegemonia na sociedade.

A credibilidade desse processo nasce do profundo enraizamento político do PT nas camadas populares, na classe trabalhadora, nos movimentos sociais organizados, no mundo da cultura e da intelectualidade, no seio das mulheres e da juventude – segmentos que estão na linha de frente da resistência democrática – e no seu legado de conquistas e realizações ao longo de sua história de lutas. Ela será profundamente potencializada se vier respaldada também num amplo processo crítico e auto-crítico que identifique retificações a fazer na linha política e na atitude social de nosso partido, numa capacidade de reformar suas instituições internas para implementar uma nova política nesta nova conjuntura e numa postura de debate democrático com todas as forças políticas e sociais que participam da resistência democrática e da busca de um ascenso de lutas democráticas e populares capazes de alterar a atual correlação de força para uma nova fase de luta pela transformação social.

2. Elementos da crise do PT neste momento

Partindo do balanço do 3º Congresso, podemos identificar quatro elementos da crise do PT ali identificados que não foram adequadamente equacionados e precisam ser ressaltadas por este 6º Congresso:

a. captura do PT pelo sistema político que viemos para transformar nos fragilizou no governo, na resistência ao golpe e na relação com a sociedade;

b. subordinação à lógica governamental enfraqueceu a capacidade crítica do partido e a nitidez de seu programa, bem como sua condição de expressar de forma autônoma para a sociedade suas propostas e intenções;

c. relação partido-governo-movimentos sociais se burocratizou e priorizou de forma quase que exclusiva o protagonismo do governo em detrimento das tarefas específicas do partido e dos movimentos sociais no processo de disputa política na sociedade;

d. o exclusivizar as tarefas da governabilidade institucional e ignorar a mobilização social e a disputa
política e ideológica para a governabilidade social, o PT deslocou-se para o centro político, deixou vago o
espaço político da esquerda e assistiu sem reação à altura ao crescimento dos espaços políticos da direita.

2.1. A necessária ruptura com o sistema político

O PT nasceu para transformar o sistema político, para carregar a democracia representativa do peso dos setores historicamente sub-representados e para ampliar a democracia participativa. Para desprivatizar a política e torná-la uma atividade pública, para combater a corrupção e defender a ética na política. Para ampliar, na esfera pública, as opiniões políticas dos politicamente excluídos, dos socialmente discriminados, dos economicamente explorados, dos culturalmente dominados. Para romper, pois, com as práticas tradicionais do mandonismo político das elites e do poder do capital sobre os processos eleitorais, partidários e governamentais.

Na estratégia partidária, nas nossas resoluções congressuais e das direções, nas diretrizes gerais dos pro- gramas de governo para a Presidência da República e nas plataformas legislativas para o Congresso Nacional, o tema da reforma política com participação social nunca foi relativizado na composição das reformas democráticas e populares e na centralidade de nossa ação política. No entanto, é forçoso reconhecer que o crescimento institucional do PT nos marcos do atual sistema político gerou um processo de acomodação do nosso partido a alguns dos fundamentos desse sistema que viemos para transformar.

O PT negligenciou o tema da reforma política nos momentos de maior popularidade de nossos governos, adaptou-se às formas tradicionais de composição parlamentar e governamental com os setores fisiológicos e corporativos que se alimentam de forma parasitária do chamado “presidencialismo de coalizão” e dividiu-se em algumas oportunidades que tivemos a nossa disposição para a aprovação de avanços centrais no avanço dessa pauta, como a votação do financiamento público e exclusivo de partidos e campanhas e a lista partidária.

O financiamento empresarial de partidos e campanhas afirmou-se como dominante e crescente nos processos eleitorais vitoriosos pelo PT, e não rompemos com a lógica do capital no financiamento do sistema partidário e eleitoral do país. Um partido socialista que se financia para suas campanhas e para seu funcionamento ordinário com recursos do grande capital é uma contradição em termos, e vivemos com essa contradição que nos apresenta sua conta política e ética a cada momento da atual crise.

Rejeitamos de forma veemente que o PT e nossos governos sejam responsáveis pela corrupção e por relações promíscuas entre governos e capital. Os avanços na denúncia e combate a este traço estrutural da política brasileira devem-se, em enorme medida, à iniciativa política do PT nos parlamentos e governos que integrou. A hipocrisia de partidos e segmentos da burocracia de Estado nas operações que visam detratar e criminalizar o PT pela corrupção vem sendo desmascarada a cada dia, por mais que órgãos da imprensa, do Ministério Público, do Judiciário e de outras instituições do aparelho de Estado tenham sido negligentes, omissas ou cúmplices de esquemas de corrupção ao longo da história republicana do Brasil.

Ao mesmo tempo, reconhecemos que poderíamos ter feito mais – e não fizemos – na luta pela reforma política, do Estado e das instituições partidárias. Nos permitimos padrões de campanha caros, pouco transparentes no processo de arrecadação e gastos, que nos afastaram de nossa classe e de seus mecanismos auto-sustentáveis de financiamento para nos aproximar de nossos inimigos de classe que sempre financiaram partidos em busca de sedução e legitimidade institucional. Não demos a devida atenção a processos de natureza ética que poderiam tratar, no âmbito interno do nosso partido, de ações hoje criminalizadas e assacadas contra nós por nossos adversários.

Invocamos perante a sociedade, no entanto, decisões corajosas que só o PT e a esquerda foram capazes de implementar, como a mobilização social contra o financiamento empresarial, a decisão soberana do PT de não mais receber recursos empresariais antes mesmo da decisão do Supremo Tribunal Federal de declarar inconstitucionais esses procedimentos, a decisão soberana de nossos governos no sentido de aprovar legislações e práticas governamentais de transparência e combate à corrupção e a decisão de nossas bancadas na Câmara e no Senado de romper com partidos aliados que buscaram estratégias de garantia de impunidade, como no caso do processo ético-disciplinar contra Eduardo Cunha e na recente votação da anistia ao caixa 2 na Câmara dos Deputados.

2.2. Atitude e protagonismo do PT dentro e fora das instituições

Se foi possível ao PT, durante os anos em que fomos governo, viver fundamentalmente à sombra de sua popularidade e posições, isso não é possível mais nesta atual conjuntura. Mas é necessário mais do que uma imposição conjuntural para que o partido retome sua capacidade de elaboração programática, de disputa política por suas ideias e propostas e de atitude autônoma da instituição partidária em relação a outras instituições do Estado que conquiste ou integre.

Houve momentos em que essa autonomia crítica foi devidamente exercida pelo partido, que colaborou em vários momentos com seus gestores e parlamentares com propostas, críticas e sugestões para decisivos temas da conjuntura, como a própria reforma política, a democratização dos meios de comunicação, a condução da política econômica e outros. Tanto no governo Lula como no governo Dilma, houve momentos de diálogo entre partido e governo por meio de seus dirigentes, setoriais e bancadas. Em benefício do governo, da sociedade e do partido, esse diálogo quanto efetivo trouxe avanços e conquistas para o país.

Houve também, no entanto, em muitos momentos, situações de diálogo travado, de baixa efetividade, formalidades que pouco alteraram as entidades que se dispunham a dialogar. Há que se registrar que foram poucos os momentos em que avançamos em canais formais de diálogo. Nossos governantes passaram a não participar dos debates de nossas direções, a vir a eventos formais da vida do partido sem que esses fossem de fato espaço de diálogo e construção coletiva de posições. A participação do partido em conselhos políticos foi centralizada em geral na figura da Presidência, sem que as instâncias colegiadas do partido dialogassem com governantes e bancadas de forma sistemática e coletiva. Mesmo no auge das crises políticas, nos ressentimos da falta de um comando unificado de iniciativas dos petistas no governo, no Parlamento, nos movimentos sociais e na disputa pública na sociedade.

O fato é que o partido teve sua pauta estatizada e limitada por suas responsabilidades de governo, deixando de falar para nossa base social e eleitoral como instituição autônoma e portadora de uma agenda própria, muitas vezes impossível de ser expressa por um governo de coalizão tão amplo e heterogêneo. Seja para apoiar, seja para criticar, seja para mobilizar a sociedade em defesa do governo, seja para mobilizar a sociedade em defesa de pautas para além do governo, o PT se ressentiu da falta de construção de mecanismos próprios de elaboração política, comunicação e mobilização social, confiando em que o protagonismo governamental seria suficiente para as tarefas de disputa de hegemonia junto à população.

2.3. Uma relação autônoma e construtiva entre Partido, Governo e Movimentos Sociais

Partido, governos e movimentos sociais são instrumentos de igual dignidade e importância para a transformação social, numa perspectiva de esquerda e socialista, mas são de naturezas distintas e constituem instâncias diferenciadas e autônomas em suas relações.

Para um partido como o PT, que nasceu socialista e crítico ao padrão vigente de construção partidária na tradição de esquerda predominante até os anos 80, exercer o caráter dirigente de sua estratégia nunca foi visto como empecilho ao reconhecimento dessa autonomia das instituições com as quais lidamos.

Para exercer a direção desta luta, valeu-se sempre de uma concepção democrática de construção de posições partidárias com a mais ampla participação de seus membros, da construção da unidade na diversidade de opiniões e concepções com base no processo democrático e da centralização de posição na forma dos estatutos partidários.

A força das instituições do Estado de que participamos a partir de vitórias eleitorais para o Executivo e o Legislativo passou a ditar uma inversão dessa lógica na relação entre partido e governo. Autonomia passou a significar, de forma equivocada, a negação de uma estratégia conduzida no âmbito do partido válida para seus integrantes e a prevalência de uma lógica de Estado para a condução das ações de petistas nos governos e parlamentos, em superposição à lógica da democracia partidária.

Da mesma forma, a prevalência dessa lógica institucional estatal nas relações partidárias reduziu a importância e a força da relação do partido com os movimentos sociais. Ainda que essa relação nunca tenha sido rompida, pois o PT é com certeza o partido com mais vínculos com a luta social e suas organizações na esquerda brasileira, o fato é que esses vínculos foram se diluindo politicamente ao longo dos anos, focando na administração de conflitos e na luta eleitoral, sem canais mais efetivos de diálogo e integração de ações comuns.

A criação da Frente Brasil Popular, que o PT integra com outros partidos e movimentos sociais do campo democrático e popular, é com certeza um salto de qualidade nessa relação, de resultados extremamente positivos para o enfrentamento do golpe e da agenda neoliberal e os limites naturais da novidade política que ela representa. Ao mesmo tempo, o diálogo do PT com a Frente Povo sem Medo e outras formas de articulação social e da resistência democrática foi também um fator de politização das relações do PT com a luta social e de construção de unidade na diversidade da esquerda brasileira, para além dos setores que integraram diretamente nossos governos e bases parlamentares.

2.4. A construção da disputa ideológica e da hegemonia social de esquerda na sociedade

Na estratégia democrática e popular de nossa tradição, em particular da elaboração clássica do 5o e do 7o Encontros Nacionais, conquistas de governos e maiorias parlamentares são fundamentais para o acúmulo de forças, a disputa de hegemonia e construção de poder popular. Não são, no entanto, suficientes em si desarticuladas de outros instrumentos, instituições e práticas sociais.

A lógica do Estado não reformado impõe aos partidos de esquerda um esforço permanente de atualização programática e de práticas sociais para além dos aparatos que conquistamos na institucionalidade. Numa coalizão de centro-esquerda, supõe-se que a tarefa central dos partidos de esquerda – em particular, como no nosso caso, do PT no governo federal encabeçado por um presidente e uma presidenta petistas – seja a de zelar pelo programa mais avançado, pela mobilização social na defesa do governo e desse programa, pela disputa dentro e fora do governo por uma correlação de forças adequada à sua realização.

Para tanto, um partido que organiza e coordena suas bancadas parlamentares, alinha seus governantes em várias esferas da Federação de forma coordenada e alimenta sua militância nos movimentos sociais, é essencial para que o espaço político à esquerda da sociedade seja devidamente ocupado. Seus mecanismos de participação social de filiados, filiadas e militantes, de comunicação social, de mobilização própria, são essenciais para a disputa por hegemonia e acumulação de forças.

O PT precisa, pois, recuperar sua capacidade de iniciativa política, tanto na atitude quanto no conteúdo de suas ações. O 6º Congresso deve construir um novo programa, mas também uma nova atitude partidária. Uma nova cultura. Uma nota ética. Um novo compromisso social. Um novo espírito que contamine milhões de filiados, filiadas, militantes e simpatizantes deste partido que é depositário de um passado e um presente que devem ser colocados em ordem à construção de um futuro democrático e socialista para a Nação brasileira. Esse é o sentido das diretrizes para a reorganização partidária que apresentamos a seguir.

3. Diretrizes para a reorganização partidária
Um partido de massas com a mais ampla organização militante

O PT constituiu-se historicamente como partido na tentativa de superar as clássicas concepções de parti- dos de massas e partidos de quadros na experiência dos partidos de esquerda no mundo, diferenciando-se tanto da social-democracia como do chamado “socialismo real” na prática das construções partidárias.

A equação encontrada produziu um partido que não considera essa dupla dimensão, de massas e de quadros, como polos excludentes ou subordinados, mas complementares e enriquecedores da democracia partidária. Multiplicar pois espaços de organização militante é, para o PT, condição de organizar no seu interior massas identificadas com seu programa e democracia.

Somos hoje cerca de 1,7 milhão de filiados e filiadas com diferentes tipos de relação orgânica com o partido, e uma tênue política de organização, comunicação e mobilização que os integrem plenamente à vida partidária, a oportunidades de participação e formação.

Nossos estatutos preveem como principais espaços de organização partidária desses filiados e filiadas os núcleos, os setoriais e os diretórios. A fragilidade desses mecanismos se expressa hoje na existência pífia de núcleos nos municípios, na falta de enraizamento e vida permanente dos setoriais na base e na falta de atividade permanente e quórum de milhares de diretórios zonais e municipais pelo país.

Assim, a massa de filiados e filiadas pouco participa das instâncias criadas para sua organização no interior do partido e de suas atividades para além dos períodos de campanhas eleitorais, sejam elas de formação, de cultura, de finanças ou de mobilização.

Sem organização permanente e enraizada disponível para que filiados e filiadas possam participar, os processos eleitorais internos e externos são atualmente o auge do processo de participação nas decisões do partido para a imensa maioria de filiados. O Processo de Eleições Diretas – PED, adotado como a forma de eleição de direções e porta de entrada para o posterior processo de debate de diretrizes políticas para os diretórios, está longe de uma avaliação positiva de seus resultados, e mesmo seus defensores e defensoras propõem, a cada crise de seu modelo, alterações pontuais que vêm se mostrando incapazes de sanear vícios e desvios importados do sistema político dominante que se reproduzem de forma destrutiva das relações internas do PT.

O 6º Congresso reafirma algumas das mais importantes conquistas estatutárias da história do PT, decorrentes de uma concepção radicalmente democrática que preside sua tradição: o caráter plural e democrático da filiação partidária, o direito de tendências, a proporcionalidade para a constituição de direções partidárias, a organização militante em núcleos, setoriais e diretórios.

Para valorizar e favorecer uma maior efetividade dessa organização militante do PT, o Congresso produz as seguintes alterações:

a. O PT realizará anualmente Encontros zonais, municipais, estaduais e nacionais, de forma presencial, com pauta política definida pelo Diretório Nacional do PT, abertos à participação de todos os filiados e filiadas nos encontros de base e com base em delegados e delegadas eleitos (as) nestes para os de nível superior;

b. Os mandatos das instâncias dirigentes do Partido serão de dois anos, e serão eleitos nos encontros na forma acima definida;

c. Núcleos e setoriais devidamente constituídos e acompanhados pelas direções zonais e municipais terão direito a voz e voto sobre os temas de debate nas instâncias dirigentes, sempre que estes forem previamente debatidos;

d. Cada setorial partidário nacional ou estadual organizará núcleos setoriais de base nos diretórios zonais e municipais;

e. Cada diretório zonal ou municipal organizará reuniões periódicas inter-núcleos com caráter de formação política e construção de agendas comuns com os movimentos sociais;

f. A construção de núcleos e setoriais será a prioridade de um esforço nacional em 2018, coordenado pelas Secretarias Nacionais de Organização, Mobilização e Movimentos Populares e Políticas Setoriais; g. Uma campanha nacional de filiação com prioridade para jovens, mulheres, negros (as) e indígenas será desenvolvida a cada ano, acompanhada de uma jornada nacional de formação política voltada especificamente para esses segmentos. A paridade de gênero e as cotas geracional e étnico-racial serão mantidas e aprofundadas com as políticas previstas para a sub-representação desses setores na política a começar pelo exemplo do próprio PT.

3.1. Um partido militante com a mais ampla participação interna

O PT não pode resumir a participação de seus filiados e filiadas a um processo de eleições para a direção que acontece a cada quatro anos. A concepção liberal que preside a democracia formal não foi capaz de equacionar a crise da democracia representativa, o descrédito de instituições dos Poderes do Estado e o desencanto pela política, e o mesmo não pode acontecer num partido socialista e democrático.

Além da substituição do PED pelo modelo congressual para a eleição de direções, o 6º Congresso decide ampliar os processos de participação interna para os filiados e filiadas do PT da seguinte forma:

a.Criação de uma plataforma digital de participação social permanente, de modo a ampliar a par- ticipação digital em comunidades virtuais, cursos à distância de formação de base, de militantes e dirigentes, enquetes sobre temas variados propostos pela direção ou outras instâncias partidárias e votação por meio digital em referendos e plebiscitos convocados pela direção partidária;

b. Realização de plebiscitos anuais, concomitantes ao processo de encontros, sobre temas definidos pela direção partidária ou por iniciativa de 5 por cento de filiados e filiadas;

c.Realização de referendos a decisões de encontros e Congressos, sempre que as propostas derro- tadas alcançarem uma votação correspondente a 30% de delegados e delegadas;

d.Realização dos encontros setoriais previstos nos estatutos do Partido, de forma a garantir uma vida permanente dos setoriais em todos os níveis e o efetivo cumprimento das suas atribuições de organizar a militância partidária nos vários setores de militância social.

3.2. Um partido participativo com a mais ampla educação política

O 6º Congresso reafirma as decisões dos Congressos anteriores sobre o funcionamento da Fundação Perseu Abramo e da Escola Nacional de Formação Política do PT, e acrescenta prioridade às seguintes iniciativas:

a. Realização de jornadas anuais de formação por ocasião do aniversário do PT; construção de programas e plataformas de educação à distância para massificação das oportunidades de formação política;

b. Transmissão online de seminários, cursos e debates centralizados pela FPA, Escola Nacional e Secretarias Nacional e Estaduais de Formação Política;

c. O segundo semestre de 2017 será momento para uma jornada nacional de formação de forma- dores e formadoras, visando dotar os diretórios municipais e estaduais de equipes de formação política articuladas com os cursos e iniciativas da FPA, ENFP e secretarias.

3.3. Um partido gerido com a mais ampla transparência e controle social

O PT deve recuperar o caráter militante de sua política de finanças, de modo a ampliar sua fonte própria de recursos financeiros para além dos obtidos através do Estado (Fundo Partidário e contribuições de detentores de mandatos, gestores (as) e assessorias), bem como manter a determinação de estrito cumprimento de vedação ao recebimento de recursos de empresas. O 6º Congresso decide:

a. Ampliar a transparência financeira e administrativa nos Diretórios Nacionais, Estaduais e Municipais, de modo a que os diretórios debatam abertamente suas previsões orçamentárias, gastos e estratégias de arrecadação;

b. Tornar obrigatória a divulgação de balancetes trimestrais das finanças partidárias em todos os níveis.

c. Ampliar a adesão ao SACE, com campanhas junto aos filiados e filiadas, para contribuição partidária regular para além das atuais contribuições estatutárias;

d. Envio de jornal impresso mensal do PT nacional para todos os filiados e filiadas contribuintes do SACE, de modo que a campanha de cotização seja também campanha de assinaturas do jornal nacional do PT;

e. Organização de um Jornal Nacional do PT, que será distribuído massivamente, em bancas de revistas e todos os outros meios de distribuição, comerciais ou não, que o financiamento partidário e as finanças militantes permitirem;

f. Os Diretórios zonais, municipais, estaduais e o nacional, bem como, os setoriais reconhecidos pela Direção Nacional, realizarão, no mínimo, 02 (duas) campanhas, ao ano, de arrecadação. f. Uma delas será unificada no conjunto do partido e outra, em que pese obrigatória, poderá ser organizada no tempo, local, modo e condições decididos pela instância específica;

g. As atividades de finanças partidárias devem, sempre que puderem, serem públicas, disputando espaço em locais públicos e servindo de um mecanismo de debate com a população sobre o padrão de financiamento da atividade partidária no país.

3.4. Um partido ético e comprometido com a ética na política

O PT reafirma seu Código de Ética e determina que a Escola Nacional de Formação Política e as Secreta- rias Nacionais de Organização e Formação Política realizem um esforço nacional de formação política dos novos Conselhos de Ética eleitos conjuntamente com as novas direções partidárias em todos os níveis, de modo a divulgar o conteúdo do Código de Ética e os procedimentos para a realização das sindicâncias preliminares e processos disciplinares para todos os seus membros.

3.5. Um partido que se comunica e transforma a cultura

O 6º Congresso do PT define como prioridade a constituição de uma rede própria de jornais e emissoras
de rádio e TV pela Internet como prioridades para os investimentos financeiros do partido no próximo
período. Para tanto, estimulará a constituição de coletivos ou núcleos de militantes petistas em ambientes
virtuais que trabalhem em conjunto com as Secretarias de Comunicação dos diretórios nacional e estaduais
para a viabilização de uma plataforma nacional de participação e comunicação do PT, programas de rádio
e tv web, produção de conteúdos para a militância em redes sociais e desenvolvimento de tecnologias
livres para a comunicação petista.

Comunicação e cultura estarão integrando cada vez mais suas iniciativas, em particular para estímulo à realização de festas, atividades culturais e de arrecadação militante nas sedes partidárias, transformando-as em espaços vivos para a convivência de filiados e filiadas. A comunicação petista será obra do engajamento de toda a militância partidária numa nova cultura de participação e disputa de valores e ideias na sociedade.

Dotar de significação o ato de filiar-se ao PT e utilizar a filiação como um elemento de nossa estratégia de construção e atualização permanente de nossa relação com as massas serão os objetivos da consolidação de dois novos instrumentos permanentes:

a. A refiliação obrigatória a cada dois anos;

b. A realização da festa nacional, também bianual, no melhor estilo das tradições de festas e festivais de partidos de esquerda de vários países e de seus jornais.

A refiliação bianual nos obriga a buscar periodicamente um enorme contingente de pessoas que aderiu ao nosso partido, que confiou sua adesão a uma instituição que o convoca de tempos e tempos a renovar sua confiança e participação. Esses dois elementos conjugados, refiliação e festivais nacionais, permitem unir comunicação e cultura numa política de organização e finanças que valorize o filiado, renove o Partido e evite a burocratização de uma relação cartorial com o petismo.

3.6. Um partido em constante mobilização permanente

O Partido realizará um permanente esforço de mobilização de seus quadros dirigentes, militantes e filiados no sentido de disputar e organizar o petismo presente como fenômeno político na sociedade. Em pouco mais de 30 anos de vida, o petismo se consolida como referência e influência para muito além da capacidade orgânica do nosso partido organizá-las.

Petismo e lulismo são fenômenos políticos independentes e articulados, que se relacionam dialetica- mente na consciência popular de milhões de pessoas. Eles se expressam não só num eleitorado fiel, que sistematicamente vota em Lula e nas candidaturas do PT, como numa massa de pessoas que define o PT como a sua preferência partidária e nele se referência para buscar formar sua opinião sobre a política.

Uma nova política de organização, relação com movimentos sociais organizados e mobilização deve fundar-se no diálogo com esses dois fenômenos. Deve procurar disputar o “lulismo” e organizar o petismo. Deve considerar um permanente espaço de educação popular de milhões de beneficiários das conquistas sociais de nossos governos e que permanecem distantes do trabalho partidário.

Como tarefas permanentes das Secretarias de Mobilização, Movimentos Populares e Políticas Setoriais e de Formação Política, o PT incluirá a organização de brigadas de mobilização e educação popular para o desenvolvimento de atividades políticas junto aos setores atingidos e beneficiados pelas principais políticas de nossos governos – Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, cotas para a participação no serviço público e na educação, ProUni, novas Universidades e Institutos Federais de Educação. Em particular, as Secretarias Setoriais deverão encarar esse objetivo de dialogar e organizar mulheres, negros e negras, jovens e trabalha- dores e trabalhadoras que são agora convocados não só a usufruir as políticas públicas de nossos governos, mas a entender seus fundamentos e princípios e a engajar-se num projeto político que os organiza, como sujeitos da história e de um Partido que molda com suas lutas e projetos.

(*) Parte integrante do caderno de contribuições para o 6º Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores. Leia outros artigos do caderno aqui. Baixe aqui o PDF com todos os textos.

ATENÇÃO: ideias e opiniões emitidas nos artigos da Tribuna de Debates do PT são de exclusiva responsabilidade dos autores, não representando oficialmente a visão do Partido dos Trabalhadores

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