Trabalhadores se mobilizam para defender patrimônio nacional

Trabalhadores da Petrobras, da Caixa Econômica e da Eletrobrás realizam diversas ações invocando a Justiça a conter as manobras do governo para “fatiar” as empresas públicas e entregá-las aos amigos rentistas de Paulo Guedes. Sindicalistas denunciam que a legislação está sendo burlada

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Entidades mobilizam trabalhadores em todo o país

Os sindicatos da Federação Única dos Petroleiros (FUP) com bases de trabalhadores da Petrobras Biocombustível (PBIO) irão contestar na Justiça a privatização da subsidiária. As ações populares estão sendo ingressadas em dez estados. Os petroleiros denunciam que a Petrobras está burlando a legislação, ao colocar à venda ativos sem autorização legislativa e o devido processo licitatório, em claro desvio de finalidade.

“A privatização da PBIO faz parte do plano da Petrobras de focar na exploração e produção de petróleo no pré-sal. O que representa um abrupto processo de desverticalização, lesivo à Companhia e ao Brasil”, destaca o escritório de advocacia Garcez, responsável pela Ação Popular.

“Além de amoral, a privatização das usinas da PBIO é ilegal”, afirma o coordenador do Sindipetro-MG, Alexandre Finamori. Ele lembra que a FUP e seus sindicatos vêm se mobilizando há pelo menos quatro anos para impedir o desmonte do setor de biodiesel. Diversas audiências públicas foram realizadas, além de paralisações e reuniões com os gestores.

“Quando em 2004, o governo Lula lançou o PNPB (Plano Nacional de Produção de Biodiesel), com foco no desenvolvimento da agricultura familiar e na sustentabilidade energética, nenhuma empresa privada se interessou, mesmo com os incentivos econômicos e tributários.

Em 2008 e em 2009, a Petrobras inaugurou suas três primeiras usinas de biodiesel, todas em locais de vegetação semiárida e baixo nível de industrialização, possibilitando, assim, ferramentas de desenvolvimento da agricultura familiar e desenvolvimento regional”, explica Alexandre Finamori.

A Petrobras já abriu mão de quase todas as participações societárias da subsidiária. Hoje, tem apenas 50,0% de participações na BSBios e 8,4% na Bambuí Bioenergia, além do controle integral das três usinas de biocombustível, que foram colocadas à venda.

A participação que a Petrobras detinha na Belem Bioenergia Brasil (BBB) foi vendida, por exemplo, por R$ 24,7 milhões, 1/8 da avaliação que a própria empresa havia feito. Mas foi lançada no balanço da portuguesa Galp – a compradora – como R$ 205 milhões, em um processo ainda não esclarecido.

“Como aconteceu no refino, o setor privado não quis construir as usinas de biodiesel. A Petrobrás foi lá e fez, mostrando que era possível. Depois que as usinas se tornaram realidades e economicamente viáveis, querem privatizar. Essa é a lógica dos que querem o desmonte do Brasil, estatizar os investimentos e privatizar os lucros”, afirma Finamori.

“A gestão Castello Branco se aproveita do isolamento social, que limita as mobilizações da categoria, para acelerar o seu plano de desmonte. Mas, a pandemia vai passar e esse governo, também. Retomaremos as lutas nas ruas e nas unidades. A Petrobras não será reduzida a uma empresa apequenada, suja e sem projetos estratégicos de energia”, afirma o coordenador geral da FUP, Deyvid Bacelar.

O Fórum de Defesa da Petrobras lançou a Campanha “Petrobras Fica no Paraná” na quinta (20), para denunciar o “acordão” entre a atual gestão da estatal e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em 2019. Na negociata, a gestão Castello Branco sinalizou com a venda de oito refinarias para encerrar uma investigação no órgão. Uma ação no mínimo suspeita e que motivou todos os envolvidos na defesa da estatal a denunciá-la. Principalmente porque o Cade não terminou suas apurações e a companhia, deliberadamente, já avançou na privatização do seu parque de refino.

Segundo o senador Jean Paul Prates, “o plano de privatizar a estatal em fatias não visa garantir o abastecimento ou novos investimentos, como dizem, mas apenas aumentar a distribuição de lucros aos acionistas, invertendo a lógica da empresa de servir ao país e aos consumidores”.

Avanço sobre a Caixa e a Eletrobrás

Do mesmo modo que na Petrobras, mais de uma centena de entidades representativas dos bancários divulgaram um manifesto contra a Medida Provisória 995, que permite à Caixa Econômica Federal criar novas subsidiárias, com a abertura de capital próprio. “Até que ponto a Caixa será capaz de cumprir seu papel social, se ela será despida dos meios que dão capacidade financeira?”, questiona o “Manifesto contra MP 995/2020 que possibilita a privatização da Caixa”.

O documento reforça que a MP irá enfraquecer a Caixa e o desenvolvimento regional induzido pelo banco “porque pretende privatizar justamente as áreas mais rentáveis da Caixa, que contribuem significativamente para a capilaridade do banco e seu efetivo papel social, seja no benefício aos mais carentes ou no financiamento da infraestrutura”.

A Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae) encaminhou cartas a senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos e vereadores alertando sobre os danos irreparáveis que a MP 995/2020 trará ao país, caso não seja revogada ou anulada.

Assinadas pelo presidente da entidade, Sérgio Takemoto, as cartas alertam para o comprometimento de ações e programas sociais financiados pelo banco e as perdas que municípios, estados e o país terão caso a Caixa seja privatizada — via aberta pela MP.

“Para burlar decisão do STF, que veta a venda de estatais sem autorização do Poder Legislativo, o governo Bolsonaro promove o fatiamento da Caixa, a exemplo do que vem fazendo com a Petrobras, para posteriormente consolidar a privatização da empresa-matriz”, continua a entidade em seu manifesto.

“Por meio do banco, foi possível a implementação de políticas sociais fundamentais para conter a desigualdade em nosso país, como o Minha Casa Minha Vida e o Bolsa Família, além dos investimentos na infraestrutura de todas as regiões do Brasil”, pontua a Fenae.

Em outra frente, os eletricitários questionam a forma como a Eletrobrás vem sendo administrada. O Sindicato dos Engenheiros do Rio Grande do Sul (SingeRS) denunciou o negócio envolvendo o controle do Complexo Eólico Campos Neutrais, no qual a Eletrobras investiu R$ 3,1 bilhões, e que foi vendido à empresa mineira Omega por R$ 500 milhões.

Não bastasse a venda ter sido feita por apenas 17% do valor investido, ocorreu em 30 de julho, em plena pandemia. O escândalo se completa quando se tem a informação de que a usina obteve, em 2017, lucro líquido de R$ 345 milhões.

Considerado o maior complexo eólico da América Latina, Campos Neutrais tinha seus parques instalados nos municípios de Santa Vitória do Palmar e Chuí. Foi implantando pela Eletrosul em 2011, com 583 MW e alta performance, segundo o sindicato.

A operação joga luz sobre a intenção de Guedes e Bolsonaro de privatizar a Eletrobras. A expectativa do mercado financeiro é que a venda do controle da empresa responsável pela energia elétrica brasileira arrecade entre R$ 12 bilhões e R$ 16 bilhões. Porém, só nos últimos dois anos a estatal lucrou R$ 24 bilhões – apenas no segundo trimestre de 2020, o lucro atingiu R$ 4,6 bilhões. A empresa tem a receber R$ 44,5 bilhões até 2028 e tem R$ 15 bilhões em caixa.

Celso Cunha, presidente da Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Atividades Nucleares, disse à agência Sputnik que o governo ‘terá muita dificuldade’ de aprovar a privatização da Eletrobrás no Congresso. “Acho que o governo terá muita dificuldade de passar isso no Congresso, que olha a importância da empresa para o país, olha a questão estratégica de energia para o país. Não consigo ver o governo fazer a privatização como um todo da Eletrobrás”, disse o engenheiro eletricista.

Sinal de que os planos de venda da empresa persistem é o orçamento de 2021, que reservou R$ 4 bilhões para a criação de uma estatal para reunir parte das operações da companhia após a sua venda. A nova empresa estatal seria a controladora da Eletronuclear, que administra as usinas de Angra dos Reis (RJ), e sócia da hidrelétrica Itaipu Binacional, em Foz do Iguaçu (PR), dividida entre Brasil e Paraguai.

A privatização da área de energia começou nas empresas de distribuição, a partir de 1997, no governo de Fernando Henrique Cardoso, que, assim como Paulo Guedes, queria “privatizar tudo”. Na época, a forte resistência, principalmente dos trabalhadores das empresas públicas, inviabilizou a privatização das usinas de geração, que era a intenção também. Mas hoje a geração já é 60% privada. Algumas distribuidoras também se mantiveram públicas, em boa parte graças à luta dos trabalhadores, que impediu a entrega total das empresas para o setor privado.

Segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), após 2016 houve mais de 15 operações de fusões no setor elétrico, que somaram quase R$ 86,2 bilhões em valor de empresa. Desse total, R$ 80,5 bilhões (mais de 93%) representaram aquisições em que os compradores eram empresas estrangeiras. Este dado mostra a relação direta entre privatização e desnacionalização. As taxas históricas de lucro líquido da Eletrobrás são elevadas, e por isso despertam a cobiça do capital sem nação.

Mas não se vê nos Estados Unidos, Alemanha, ou China abertura desse setor para o estrangeiro. Ao contrário do que ocorre no Brasil, Estados Unidos, China e Canadá mantêm o domínio do setor elétrico. Nos Estados Unidos, a maior parte é controlada publicamente e pelo governo federal.

Da Redação

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