A repressão ao ato anti-Bolsonaro e a perigosa politização da PM

Documento mostra que repressão da PM a ato de 29 de maio, no Recife, partiu do comando-geral. Especialistas alertam para tentativa de Bolsonaro de cooptar policiais

Mídia Ninja

Homem ferido em ação da PM no Recife. Vereadora Liana Cirne (PT) lembra que é preciso evitar generalização: "Não são todos assim, violentos"

Relatório interno da Polícia Militar de Pernambuco (PMPE), obtido pelo Jornal do Comércio, comprovou que a decisão de reprimir a manifestação contra Jair Bolsonaro, em 29 de maio, no Recife, partiu mesmo do então comandante-geral, Vanildo Maranhão, já afastado pelo governador Paulo Câmara (PSB). O documento, porém, mostra ainda que a decisão passou por outros integrantes da cúpula da corporação, o que explica por que outros 15 oficiais foram afastados e reforça a necessidade para que se apure e se combata a politização da Polícia Militar, não só em Pernambuco.

Há sinais cada vez mais evidentes de que, assim como ocorre com as Forças Armadas, o bolsonarismo se infiltra nos batalhões da PM na tentativa de transformar as forças de segurança em defensores da política do atual presidente. Algo que, se concretizado, significaria a transformação da polícia em milícia.

Um claro exemplo dessa tentativa, vale lembrar, ocorreu em março passado, quando um policial militar da Bahia acabou morto após, durante um surto psicótico, fazer ameaças e disparar diversas vezes no Farol da Barra, um dos principais pontos turísticos de Salvador. Após a tragédia, apoiadores de Jair Bolsonaro, como a deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), tentaram promover um levante de PMs contra o governador Rui Costa (PT).

Tal movimento é uma grave ameaça à democracia e ao estado democrático de direito, pois pode levar a um cenário de insubordinação e anarquia, multiplicando os episódios como o ocorrido no Recife. Naquele dia, a PM agiu à revelia do governo estadual e atacou uma manifestação pacífica, que terminou com prisões e várias pessoas feridas. Duas delas perderam a visão de um dos olhos após serem atingidas por bala de borracha.

Resistência

Como demonstrou o fracasso do motim estimulado por Bia Kicis e outros bolsonaristas na Bahia, a maioria dos policiais militares é ciente de seu papel e dos riscos que a politização dos quartéis representa. A vereadora pelo PT Liana Cirne, que foi agredida com gás de pimenta no rosto durante a repressão ocorrida no Recife, ressalta que não se pode generalizar a violência de maus policiais. “Já dei aula para centenas de policiais. E não são todos assim, violentos”, lembra Liana, professora de direito há 25 anos.

É necessário, porém, frear tais tentativas urgentemente. Pesquisa realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e divulgada pelo Correio Braziliense aponta que 41% dos perfis públicos de praças da PM endossam as pautas de Jair Bolsonaro, enquanto 25% adotam um discurso mais radicalizado.

De acordo com especialistas ouvidos pelo jornal, a politização das PMs parece ser um projeto de Jair Bolsonaro. David Magalhães, professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e coordenador do Observatório da Extrema Direita, lembra que Olavo de Carvalho tem ministrado “cursos de filosofia” para PMs. “Por que ele está dando um curso gratuito para a Polícia Militar? O que ele quer com isso? É uma doutrinação ideológica pura e simples”, afirma.

Já o cientista político André Pereira César enxerga uma tentativa de Bolsonaro de desestabilizar governadores, com os quais tem mantido frequentes embates. “O Bolsonaro trabalha nisso. É um jogo que tem um cálculo político e é muito perigoso”, alerta. Aviso semelhante faz Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do FBSP. “O Fórum tem feito alertas desde 2017 e, de lá para cá, houve várias manifestações de excesso de policiais que soaram a posicionamento político-partidário”, observa.

Da Redação

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