Após acabar com reforma agrária, Bolsonaro entrega títulos de terra
Entrega de 1.128 títulos ocorreu, nesta sexta (14), no assentamento Santa Mônica, fundado pelo MST. Polícia impediu acesso e usou gás lacrimogênio para dispersar manifestantes contrários a Bolsonaro
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Só mesmo o desespero político para fazer com que Jair Bolsonaro, que já classificou assentados como “marginais” e “terroristas”, entregasse nesta sexta-feira (14) 1.128 títulos de posse de terra em assentamento no Mato Grosso do Sul.
Equipes do Choque da Polícia Militar, Polícia Federal e PRF (Polícia Rodoviária Federal) montaram bloqueio em estrada vicinal a 40 km do assentamento Santa Mônica, em Terenos, onde a agenda “controlada” estava sendo realizada.
O presidente chegou ao local de helicóptero, promoveu aglomeração e, sem máscara, insinuou que quem tem medo de Covid-19 é frouxo. O Brasil já registra mais de 430 mil mortes por Coronavírus.
Trabalhadores que saíram de Campo Grande protestaram contra a hipocrisia de Bolsonaro, sendo impedidos de ultrapassar a barreira em direção ao assentamento fundado pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). A polícia reprimiu a manifestação com uso de gás lacrimogênio. (Veja no vídeo abaixo, postado pelo site MídiaMax).
Oportunismo eleitoreiro
O desprezo de Bolsonaro pelos sem-terra não é restrito as suas palavras, está refletido também no corte de orçamento e emissão de decretos de desapropriação de terra para reforma agrária, em flagrante desrespeito à Constituição de 1988, que determina ao governo executar política fundiária tendo como objetivo a implementação efetiva de uma reforma agrária no território brasileiro.
A Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultores Familiares) apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (nº 769) por conta da praticamente extinta política de acesso à terra, executada pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), na gestão de Bolsonaro.
Segundo dados informados pelo Incra, durante os anos de 2019 e 2020, o governo Bolsonaro praticamente zerou a emissão de decreto para desapropriação de terra para reforma agrária. Em contrapartida, durante os governos Lula e Dilma (2003-2016), foram publicados 2.225 decretos de desapropriação de terra para fins de reforma agrária. Na gestão Temer (2017-2018), esse número caiu para 5 decretos, chegando a 0 com Bolsonaro.
O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2021 prevê que sejam investidos R$ 50.733 para aquisição e indenização inicial de imóveis rurais para a reforma agrária. O significa dizer, praticamente zero. Em 2011, a presidenta Dilma Rousseff (PT) destinou R$ 930 milhões para a política do governo federal de promoção e distribuição da terra. Em 2016, ano em que foi destituída da Presidência da República, em um dos maiores golpes à democracia brasileira, o orçamento de reforma agrária foi de R$ 320.735.361. Caindo com Bolsonaro, em 2020, para R$ 12.282.327.
Em seus dois mandatos, Lula assentou 614.088 famílias no campo, com acesso à moradia, enquanto Bolsonaro, em seus dois anos de governo, 13.202 famílias e não desapropriou nenhum latifúndio.
Desprezo pelo povo
O deputado federal Vander Loubet (PT-MS) não se surpreende com a forma como os trabalhadores foram recebidos pelas forças policiais. “Estamos falando de um presidente que tem desprezo pelo povo e que só se preocupa em atender aos interesses daqueles que o cercam”, disse.
Loubet também questiona o isolamento promovido a uma agenda oficial ainda mais se tratando de um assentamento que foi fundado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. “Esta visita é estranha, para não dizer hipócrita”, diz ele.
“Primeiro, porque Bolsonaro não tem compromisso com a reforma agrária e com a agricultura familiar. Neste desgoverno, o Incra foi sucateado e o processo de desapropriações segue paralisado; o investimento do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) e dos programas voltados para os agricultores familiares foi reduzido a valores pífios”.
“Segundo, porque Bolsonaro e seus apoiadores sempre acusaram os movimentos de luta pela terra de terroristas, como se lutar pelo direito a um pedaço de chão para produzir e sobreviver fosse algum crime”, afirma o deputado.
O deputado Loubet diz que estas e outras agendas de Bolsonaro são tentativas de evitar o seu, cada vez maior, derretimento político, assim como o crescimento da reprovação a sua gestão como presidente da República.
“Não é fácil ser patrão”
O presidente da República reclamou, durante a cerimônia oficial, desta sexta-feira (14), das dificuldades em governar o país. “Não é fácil ser ‘patrão’ no Brasil. Queremos igualdade e que todas as decisões que servem de jurisprudência para os tribunais estaduais sejam justas”, afirmou.
A alegada “vida dura” contrasta com o noticiário desta semana dando conta que, com apenas uma canetada, o governo autorizou reajustes salariais de até 69% para ele próprio e generais de seu governo.
Na saída de Brasília para Mato Grosso do Sul, Bolsonaro voltou a ameaçar indiretamente a democracia e disse que pode acionar o “Exército daqui para frente”. A sua declaração foi em resposta a apoiadores no Palácio da Alvorada que reclamaram das regras impostas por prefeitos e governadores no combate à pandemia.
Da Redação