Artigo: Por que eu apoio Lula, por Lúcia Helena Issa

Decidi apoiar o rosto do Brasil que é amado na Palestina , na Itália, na Síria e em tantos países em que estive!

Lúcia Helena Issa é jornalista e escritora

Naquela noite de vitória do fascismo no Brasil, em 2018, eu estava na França e havia acabado de receber o título de embaixadora da paz por meus artigos dando voz às refugiadas palestinas e por meu trabalho humanitário em um campo de refugiados sírios e palestinos.

Alguns dias depois, ainda em Paris, fui almoçar com um querido jornalista francês que havia morado em Roma na mesma época que eu, e ele me levou ao lindo Quartier Latin. Pierre parecia perplexo com a vitória de Jair Bolsonaro no país que ele amava desde sempre e considerava ” o mais acolhedor do mundo” .

“Como os brasileiros puderam eleger alguém que tem como herói um torturador? ” , me perguntava ele com indignacao nos grandes olhos negros como os meus. ” Cono puderam escolher um sujeito racista no Brasil? ” Como puderam permitir que Moro agisse dessa forma sem provas ?”

Pierre me explicara que, pelas leis franceses, Moro jamais poderia ser ministro da Justiça do presidente que ele ajudou a chegar ao poder, tirando da disputa o homem que liderava todas as pesquisas eleitorais.

Eu estava arrasada.

A alegria pelo lindo prêmio que eu recebera em Paris fora contaminada por uma tristeza visceral, uma desesperança gigantesca pelos anos de horror que nos aguardavam.

Voltando ao Brasil, descobri que os meses estavam sendo engolidos por um oceano de ódio, incêndios nas florestas, mortes de indígenas e feminicidios. O imenso dano ao meu país estava concretizado, o ódio aos mais pobres, a xenofobia contra refugiados, a intolerância religiosa, a misoginia, as armas fáceis , a militarização do Brasil eram agora uma realidade feita de fatos e números assustadores.

Enquanto isso, Lula estava encarcerado em Curitiba, sem que houvesse sido apresentada jamais por Moro uma única prova contra ele, e lutava, com imensa dignidade e dentro da lei, contra a injustiça cometida por um sujeito hoje reconhecido até pela ONU como parcial e desonesto.

No dia em que Lula foi libertado do cárcere, de uma condenação sem provas, eu chorei.

Chorei por ver o Brasil dominado por pessoas como Olavo de Carvalho, que sequestraram o cristianismo para criar uma guerra civil em meu país, pelos torturadores agora idolatrados, pela ditadura militar que voltava a nos assombrar, pelas refugiadas sírias agora proibidas de entrar no Brasil e pelas meninas e mulheres que estavam sendo assassinadas em quantidade jamais vista em um Brasil cujo presidente legitimava a misoginia.

Chorei por todos os meninos negros mortos pelas armas israelenses que o Brasil passara a comprar agora e por milhares de pessoas que morreriam nos anos seguintes nas comunidades..

Chorei porque queria jamais ter voltado da Europa e jamais ter visto uma menininha negra agredida com uma pedrada na cabeça por sua fé religiosa.

Mas a absolvição do gigante Lula e o reconhecimento da desonestidade do anão Sergio Moro trouxeram uma certa paz ao meu coração.

Naquele dia, assim como em tantas outras vezes e em outros momentos de minha juventude eu decidi estar com Lula.

Decidi apoiar o rosto da esperança e não o do ódio e do medo. Apoiar um Brasil que criou o Ciência Sem Fronteiras, que criou o Luz Para Todos, PROUNI, FIES, o Farmavia Popular e deu dignidade para os meus irmãos brasileiros que não tiveram as mesmas chances que eu tive ao nascer!

Decidi apoiar o rosto da solidariedade aos refugiados palestinos, da generosidade que levou ajuda concreta a um hospital para crianças palestinas. Decidi apoiar o rosto do Brasil que é amado na Palestina , na Itália, na Síria e em tantos países em que estive!

Decidi apoiar o rosto da vivência cristã real , de quem já cometeu muitos erros , mas de alguém que tenta todos os dias fazer do Brasil um lugar menos injusto e repleto de esperança!

Lucia Helena Issa é jornalista com especialização em Linguagem e Semiótica, pela Università di Roma, na Itália. É autora do livro-reportagem ” Quando amanhece na Sicília…”, premiado no Brasil e na Itália, sobre a luta das mulheres e da sociedade civil italiana contra a.Máfia. Já morou em Londres, Havana e Roma por seis anos, de onde fez reportagens para a Folha de São Paulo, revista Istoé e Jornal do Brasil. Esteve em mais de 80  países do mundo, alguns deles devastados por guerras recentes e reportados por ela, tais como Síria, Palestina, Sérvia e Líbano. Atualmente mora no Rio de Janeiro, onde está terminando um  novo livro-reportagem, sobre refugiadas do Oriente Médio que lutam pela paz e é colunista do site britânico Middle East Monitor.

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