Bolsa Família e auxílio emergencial acabam; abandono e incerteza assumem
A partir da próxima semana, 22 milhões de famílias serão excluídas do auxílio emergencial. Já 17 milhões receberão ajuda por meio do Auxílio Brasil, que nem recursos garantidos tem ainda
Publicado em
Se a medida provisória que extinguiu o Bolsa Família for aprovada pelo Congresso Nacional nos próximos dias, o maior e melhor programa de combate à pobreza do mundo terá chegado ao fim nesta sexta-feira (29), data do último pagamento previsto para este mês. E, embora Jair Bolsonaro diga que colocará no lugar outro programa, chamado Auxílio Brasil, o que ele está na verdade fazendo é lançar a população mais vulnerável do país ao abandono e à incerteza.
Isso porque não é só o Bolsa Família que está acabando. Em outubro, chega ao fim também o auxílio emergencial, que hoje atende 39 milhões de pessoas. Como, segundo o próprio governo, o Auxílio Brasil deve beneficiar até 17 milhões de pessoas, a conta é muito simples: daqui a alguns dias, 22 milhões de famílias serão jogadas à própria sorte, durante uma das mais graves crises da história do país.
“Vinte e dois milhões de famílias provavelmente vão ser excluídas de programas de transferência de renda. Esse é o dado que eles estão escondendo e de que ninguém fala. Esse é o principal dado da conjuntura”, alertou a ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome Tereza Campello, em entrevista à TvPT na semana passada (assista abaixo).
Segundo Tereza, a exclusão dessas famílias não poderia ocorrer de forma alguma, uma vez que a situação da economia só piorou desde que o benefício foi implementado. De acordo com a ex-ministra, o número de pessoas passando fome hoje no país é muito maior que os 19 milhões calculados em dezembro de 2020. Afinal, naquele mês, eram 60 milhões os que recebiam o auxílio, e num valor mais alto (R$ 300). No começo de 2021, o benefício foi suspenso para ser retomado apenas em abril, para 39 milhões de pessoas.
“A situação é muito pior que a de dezembro. Quanto pior, não sabemos, mas, certamente, deve haver mais de 30 milhões de pessoas passando fome e muito mais de 50 milhões que não comem o suficiente, porque a insegurança alimentar afeta mais de 120 milhões de brasileiros”, explicou a ex-ministra.
Claramente eleitoreiro
E os problemas não param por aí. As famílias que derem a sorte de serem incluídas no Auxílio Brasil terão de conviver com a incerteza, pois, no desespero de acabar com o Bolsa Família, Bolsonaro está colocando no lugar um programa feito de improviso, que até agora não tem definidos aspectos básicos, como os critérios de seleção e a fonte de recursos.
A desorganização é tão grande que o novo programa já começa quebrando promessas. Na semana passada, o governo anunciou que o valor mínimo a ser pago a cada beneficiário seria de R$ 400. Na noite dessa quinta-feira (28), porém, o governo admitiu que não conseguirá pagar esse valor, comprometendo-se, apenas, com um reajuste de 20% no valor que cada beneficiário recebe. Assim, uma família que hoje ganha R$ 200 no Bolsa Família, não receberá, em novembro, os R$ 400 prometidos, mas R$ 240. E terá de torcer para que a nova promessa, de que os R$ 400 virão em dezembro, seja cumprida.
O motivo dessa quebra de promessa logo no início é justamente a incapacidade do governo de definir de onde virão os recursos para o novo programa. A PEC dos Precatórios, que prevê um verdadeiro calote na dívida que o governo federal tem com os estados, está empacada na Câmara, deixando o governo sem garantia da verba necessária. “O governo está armando um quadro de caos. Por razões eleitorais, estão extinguindo um programa premiado internacionalmente e exitoso no combate à desigualdade, sem ter clareza de como botar outro no lugar”, afirma o economista Bruno Moretti, assessor da Bancada do PT no Senado.
Ver essa foto no Instagram
Moretti destaca que o governo definiu o Auxílio Brasil como um programa temporário, com validade apenas até o fim de 2022, porque a Lei de Responsabilidade Fiscal exige que programas permanentes tenham compensação em alguma fonte de receita. Ou seja, a partir de janeiro de 2023, nada garante que o Auxílio Brasil terá condições de existir como foi criado. Quer prova maior das intenções eleitoreiras de Bolsonaro?
De acordo com o economista, além de armar uma bomba para 2023, a definição do Auxílio Brasil como temporário trouxe outra nefasta consequência. “Como não precisa mais da compensação, o governo está, na prática, abandonando o projeto de lei que tributa dividendos das pessoas físicas. Ele abandona a tributação dos super-ricos, que são os grandes beneficiados por essa isenção e poderiam financiar a transferência de renda para os mais pobres”, critica Moretti.
Assim, Bolsonaro mais uma vez alivia para os ricos enquanto finge se preocupar com os mais pobres. O mais triste é que a solução para atender a população mais necessitada está à mão, ressalta Tereza Campello. “A melhor solução para a população pobre brasileira é aumentar o valor do Bolsa Família e aumentar o número de pessoas atendidas pelo programa. Isso seria simples, seria fácil, seria eficiente e não trocaria o certo por essa aventura eleitoreira”, disse a ex-ministra à TvPT.
Da Redação