Bolsonaro tenta surfar em queda no desmatamento das gestões de Lula e Dilma
Responsável por devastação das florestas tropicais e do pantanal desde 2019, Planalto agora usa redução de 83% no desmatamento entre 2004 e 2012 para se defender de críticas. Na semana passada, França suspendeu negociações do acordo entre Mercosul e União Europeia com base em um relatório com dados sobre impacto do desmatamento na Amazônia Legal. Medidas de preservação nas administrações do PT eram consideradas pelas ONU uma contribuição “sem precedentes” na diminuição do aquecimento global e um exemplo para o mundo
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O descaso do governo brasileiro com o meio ambiente, refletido no aumento explosivo do desmatamento e de incêndios criminosos na Amazônia a partir de 2019, constitui o principal entrave para o avanço do acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul. Na semana passada, a França suspendeu as negociações com base em um relatório que alerta para os altos índices de desmatamento na região. Para se defender das acusações de Paris, Bolsonaro, mais uma vez surfando em uma onda que não é dele, usou dados da queda no desmatamento de 83% entre 2004 e 2012, período que cobre as gestões dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Exemplo internacional na área de meio ambiente, as medidas de preservação das florestas adotadas nas administrações petistas foram consideradas pela Organização das Nações Unidas uma contribuição “sem precedentes” na diminuição do aquecimento global. Sob Lula, o desmatamento anual na Amazônia caiu de 27.772 km², em 2004, para 7.000 km² em 2010, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (INPE). Em 2014, já com Dilma na Presidência, a redução do índice caiu ainda mais, para 5.891 km².
“De 2004 a 2012, o desmatamento da região chamada de Amazônia Legal caiu 83%, enquanto que a produção agrícola subiu 61%. Nesse mesmo período, o rebanho bovino cresceu em mais de 8 milhões de cabeças, chegando a 212 milhões em 2012. Esses dados inserem-se em tendência histórica de intensificação da agropecuária brasileira e dos decorrentes ganhos de produtividade, em sintonia com a preservação ambiental”, diz nota dos ministérios das Relações Exteriores e da Agricultura.
Desmatamento recorde em 10 anos
Segundo reportagem do UOL, as pastas escondem a alta na devastação da Amazônia de 2019 e o aumento explosivo das queimadas.“Os números acompanham a agenda de política ambiental do governo, que tem como base de apoio ruralistas, latifundiários e organizações patronais ligadas ao agronegócio”, aponta a reportagem.
O site lembra ainda que, entre agosto de 2018 e de julho de 2019, o INPE registrou o maior desmatamento na região em 10 anos, uma alta de 29,5% em comparação ao ano anterior. Foram derrubados 9.762 km² de vegetação nativa. Já em julho de 2020, o desmatamento na Amazônia subiu 278%, em relação ao mesmo mês do ano passado, segundo o INPE.
Pantanal em chamas
A região do Pantanal vem sofrendo a maior devastação da história, resultado do desmonte completo do setor de meio ambiente operado por Bolsonaro e pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Mais de 15% da região, uma área de 2,2 milhões de hectares – o equivalente ao território de Israel –, foram consumidos em chamas. Os dados são do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo). Desde o início do ano, 16 mil focos de incêndio foram detectados pelo INPE na região.
De acordo com reportagem do El País, as queimadas representam uma “tragédia devastadora para um dos biomas até então mais preservados do país”. A extensão territorial situada entre Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e as divisas com Bolívia, Argentina e Paraguai perdeu boa parte de sua fauna. A área cobre o Parque Estadual Encontro das Águas, a Terra Indígena Perigara, em Mato Grosso, e parte da Serra do Amolar, em Mato Grosso do Sul.
Ameaça para a economia
As queimadas e o desmatamento históricos ameaçam a economia do país na medida em que ferem critérios de segurança ambiental de empresas e investidores. Soma-se a isso o intenso processo de desgaste do governo no exterior. Em abril, divulgação da reunião ministerial que envergonhou o país desmascarou de vez a falta de compromisso do governo com o meio ambiente. À época, o ministro Ricardo Salles afirmou que o governo deveria aproveitar a pandemia para “passar a boiada” no relaxamento de regras de proteção ambiental.
Além disso, houve a extinção do Comitê Orientador do Fundo Amazônia (Cofa), o que levou à suspensão de repasses de Alemanha e Noruega ao fundo criado no governo Lula. O desgoverno de Bolsonaro tornou, enfim, a situação insustentável. Na semana passada, o vice-presidente Hamilton Mourão recebeu uma carta assinada por embaixadores de oito países da Europa, alertando para a gravidade do quadro ambiental e suas consequências.
“O Brasil está tornando cada vez mais difícil para empresas e investidores atender a seus critérios ambientais, sociais e de governança”, diz a carta assinada pelos chanceleres de Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Holanda, Noruega, Dinamarca e Bélgica. Ao mesmo tempo, mais de 200 organizações e empresas internacionais também aumentaram a pressão sobre Bolsonaro, cobrando medidas urgentes para evitar uma catástrofe maior.
Relatório de Paris
É nesse contexto que ocorre a paralização das conversas sobre o acordo comercial entre os blocos sul-americano e europeu. As negociações, que já duravam duas décadas, pareciam ter chegado a um desfecho no ano passado. O tratado chegou inclusive a ser antecipadamente comemorado pelo governo como a primeira grande vitória de Bolsonaro na política externa. Como se viu, no entanto, o desastre ambiental de seu governo passou a ser um entrave para o sucesso do entendimento.
Após designar um comitê independente para produção de um relatório sobre os impactos ambientais na Amazônia decorrentes do acordo, e à luz do descaso atual do governo Bolsonaro com a região, a França freou as negociações. “O projeto de acordo não contém nenhum dispositivo que permita disciplinar as práticas dos países do Mercosul no que se refere à luta contra o desmatamento”, disse um integrante do governo à France Presse. “É a principal falha desse acordo, e esse é o principal motivo pelo qual as autoridades francesas se opõem ao projeto em seu estado atual”, afirmou a fonte ouvida pela agência.
De acordo com dados do relatório, obtidos pela France Presse, o desmatamento na região do Mercosul pode aumentar 5% ao ano em função do aumento da produção de carne bovina destinada ao bloco europeu, estimado entre 2% a 4%. A expansão da área de pasto está diretamente ligada ao desmatamento. Ainda de acordo com o documento, haveria um aumento considerável das emissões de gases de efeito estufa.
Da Redação, com informações de UOL, El País e BBC