Chile cresce nos últimos dois anos e inspira organizações de mulheres em todo Brasil

Exemplo de país vizinho demonstra como a organização popular e a pauta feminista podem beneficiar a sociedade como um todo, não apenas as mulheres.

O Chile registrou um crescimento de 12% em 2020 e foi uma das economias que mais cresceu em 2021, surpreendendo todos os cenários. Economistas atribuíram o fenômeno principalmente a políticas de transferência de renda e saques de fundos de pensão, medidas de emergência da crise da Covid-19. 

Mas não para por aí. 

O sucesso na condução da gestão da pandemia, aliado a um programa eficaz de vacinação; a continuação das minerações, que possui forte impacto no PIB; e a exportação de cobre também foram fatores que influenciaram o desempenho do país no último período – explica a internacionalista Andiara Valloni dos Santos, Mestra em Governança e Políticas de Desenvolvimento pelo Instituto Internacional de Estudos Sociais da Universidade Erasmus de Rotterdam. 

O recém-empossado presidente Boric foi eleito a partir de uma plataforma que “aprofunda” essas medidas atribuídas ao crescimento do Chile, como o investimento público em políticas sociais e de distribuição de renda. Essas, por sua vez, vão na contramão de medidas de austeridade, reajuste fiscal e tributário e outras soluções neoliberais para países em crise econômica. 

A médio prazo, especialistas apontam um pequeno crescimento do Chile ainda em 2022, no entanto demonstram preocupação caso o governo decida insistir na política de saque dos fundos de pensão. “O aceno mais moderado do governo eleito, em relação à indicação do Ministro Mario Marcel, reflete bastante sobre escolhas, se necessárias, de medidas menos ortodoxas para solucionar as questões econômicas”, adianta Andiara. A longo prazo, o governo Boric tem pela frente a superação de desafios como o aumento da inflação, a agenda laboral, desaceleração iminente e, principalmente, a questão da reforma tributária

O papel das mulheres

Outro aspecto importante que constrói esse contexto ascendente é a série de mobilizações sociais e populares que atravessaram a história política recente do Chile, sobretudo as organizações feministas que compõem o movimento de mulheres. 

Os grupos feministas no Chile vêm atuando de forma incisiva principalmente na convocação das greves gerais feministas de 2016, 2017 e 2018, com demandas atreladas à segurança, migração, direito à água, moradia, sistema de saúde pública, entre outros.

Andiara explica que elas têm exigido o cumprimento dos direitos fundamentais para população chilena, realçando a negligência e a falta de políticas sociais que atendam principalmente às populações menos privilegiadas e minoritárias do país. 

“Essa agenda “contra a precarização da vida” é um exemplo muito explícito de como a pauta feminista traz consigo mudanças estruturais necessárias para o país como um todo”, afirmou a especialista. 

Andiara Valloni dos Santos, Mestra em Governança e Políticas de Desenvolvimento pelo Instituto Internacional de Estudos Sociais da Universidade Erasmus de Rotterdam.

Hoje, a equipe ministerial do governo Boric é composta por 14 mulheres e 10 homens, uma proporcionalidade de composição inédita na história da América Latina – com chilenas ocupando ministérios estratégicos como a Ministra Camila Vallejo, Secretária Geral do Governo; Antonia Urrejola, das Relações Exteriores; Marcela Alejandra do Ministério da Justiça e Direitos Humanos; Javiera Toro, do Ministério de Bens Nacionais, entre tantas outras.

“É importante ressaltar também as votações para a nova Constituinte que têm como principal líder uma acadêmica feminista e de origem Mapuche, Elisa Loncon, bem como um número expressivo de mulheres que foram escolhidas para compor esse processo. É muito simbólica a resposta da população sobre quem deveria ditar os novos rumos do país e isso se dá sobretudo pela luta das mulheres em reestruturar uma sociedade patriarcal”, ressaltou a internacionalista. 

Bons ares para o Brasil

O recado das mudanças na política chilena são evidentes: não existe mais política sem a participação de mulheres e povos originários em pontos chaves do governo e na tomada de decisões.

“Estamos atingindo patamares significativos na participação de mulheres na política brasileira, mas ainda falta a presença feminina nos mais altos cargos da política e isso se dá sobretudo, pela falta de alavancagem de tantas figuras femininas geniais que temos no nosso país”, afirmou Andiara.

É sobretudo a partir dessa constatação que o Partido dos Trabalhadores e das Trabalhadoras aposta e investe no projeto Elas Por Elas, coordenado pela Secretaria Nacional de Mulheres do PT. Um projeto que abrange formação política, comunicação, incentivo e assistência às mulheres que desejam ocupar cargos públicos eletivos ou não – tendo como principal objetivo a ampliação da participação política das brasileiras. 

Anne Moura, secretária nacional de mulheres do PT, aponta que o exemplo da mobilização das mulheres chilenas e da resistência contra o conservadorismo é a prova de que apostar na maior participação das mulheres é construir um mundo melhor para todos e todas. 

“A organização das mulheres chilenas foi crucial não só para eleger um governo de esquerda, mas também para pautar as urgências da classe trabalhadora como um todo como o direito à saúde, educação, moradia e uma vida com dignidade. É dessa água que a gente bebe, é esse exemplo que nos referencia para organizar a nossa batalha pela eleição de Lula em 2022”, concluiu Anne. 

Ana Clara Ferrari, Agência Todas

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