Escola é destruída em comunidade quilombola de Santa Catarina
Deputada Luciane Carminatti (PT) pediu providências ao Ministério Público e explicações da Secretaria de Educação sobre a brutal ação em área onde vivem 330 famílias, em Campos Novos
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O sonho de pelo menos 330 famílias da Comunidade Remanescente de Quilombo Invernada dos Negros, em Campos Novos (SC), foi destruído na última quinta-feira (1), véspera do feriado de Páscoa. Uma escola de educação básica, que atendia 100 alunos de 18 a 90 anos, foi demolida sem aviso prévio.
A unidade de ensino José Faria Neto pertencia ao Estado e contemplava estudantes da comunidade quilombola e comunidades vizinhas ao distrito de Ibicuí, no interior de Santa Catarina.
A deputada estadual, Luciane Carminatti (PT), protocolou ações junto ao Ministério Público e à Secretaria de Estado da Educação (SED) nesta segunda-feira (5) pedindo providências e a construção de um novo espaço escolar para a comunidade.
“A brutalidade que foi a demolição deste investimento público revela a falta de civilidade e respeito com as pessoas. Portanto, quem autorizou a demolição precisa ser responsabilizado”, ressalta a deputada.
Carminatti afirma que recebeu a notícia com muita indignação e considera a destruição da escola como um ato de desrespeito ao povo quilombola e ao patrimônio público.
“A comunidade tinha um vínculo com a escola e não foi em nenhum momento informada de que o prédio seria destruído. Ninguém foi chamado para discutir sobre a decisão dessa demolição. Quando um prédio público é desativado, há todo um procedimento legal a ser instaurado, pois ele pertence a um patrimônio público estadual. Queremos explicações”.
Ouça a sonora da deputada Luciane Carminatti.
Sonho de gerações
Édson Camargo, líder na comunidade e integrante do Movimento Negro Unificado (MNU), relata o acontecimento como um “ataque golpista”.
“Na tentativa de destruição da história dos povos quilombolas, pessoas e instituições de indivíduos que consideramos fascistas estão tentando apagar a memória da comunidade Invernados Negros. Eles demoliram em pouco mais de uma hora um sonho de gerações e gerações. Estamos indignados e buscamos amigos e parceiros para que o Brasil se manifeste e que todos os companheiros de luta abracem essa causa e venham nos ajudar nessa luta. Infelizmente, aos poucos as minorias estão a cada dia sendo massacradas por esse governo que não nos representa”, alega o líder comunitário.
Ouça o líder comunitário, Édson Camargo.
Nota de Repúdio
Movimentos populares, professores, associações, a Central Única dos Trabalhadores de Santa Catarina (CUT/SC) e o Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Santa Catarina (SINTE/SC) protestaram por meio de uma nota de solidariedade e de repúdio, exigindo a punição dos responsáveis, a reconstrução da escola e a reconstituição dos direitos educacionais da comunidade nos marcos da Educação Quilombola, da Educação das Relações Étnico Raciais e Indígenas e, da Educação do Campo.
No texto, a demolição da escola é vista como um ataque aos direitos dos povos quilombolas, de seus territórios e territorialidades específicas, e como uma transgressão de direitos humanos e, em particular, de direitos educacionais previstos na Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho – OIT sobre povos Indígenas e Tribais, regulamentado no Brasil pelo Decreto Nº 5.051, de 19 de Abril de 2004; na Lei Nº 8.069, de 13 de Julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente; na Resolução CNE/CEB Nº 8, de 20 de Novembro de 2012, que define Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Quilombola na Educação Básica e; na Resolução CEE/SC nº 86, de 16 de Julho de 2019, que instituiu as Diretrizes para organização da Educação Escolar Quilombola no Estado de Santa Catarina.
A nota ressalta ainda que no âmbito das legislações da Educação do Campo, o Art. 28 da LDB 9.394/96 prevê que o “fechamento de escolas do campo, indígenas e quilombolas será precedido de manifestação do órgão normativo do respectivo sistema de ensino, que considerará a justificativa apresentada pela Secretaria de Educação, a análise do diagnóstico do impacto da ação e a manifestação da comunidade escolar”.
Além disso, o Art. 3º, da Resolução CNE/CEB Nº 2, de 28 de Abril de 2008, estabelece diretrizes complementares, normas e princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação Básica do Campo. “A Educação Infantil e os anos iniciais do Ensino Fundamental serão sempre oferecidos nas próprias comunidades rurais, evitando-se os processos de nucleação de escolas e de deslocamento das crianças”.
Leia, na íntegra, a nota de repúdio.
Demolição não foi autorizada pelo governo
Em nota oficial, a Secretaria de Estado da Educação (SED) de Santa Catarina, esclarece que não autorizou a demolição da estrutura física antiga da EEB José Faria Neto, em Campos Novos, ocorrida na última quinta-feira. Entretanto, reforça que há uma escola nova, construída a cerca de 500 metros da antiga, que está atendendo toda a comunidade local, inclusive a comunidade quilombola.
“A comunidade quilombola não será prejudicada com essa mudança. Pelo contrário, já está sendo atendida em uma escola com infraestrutura nova para seguir com os estudos. Ambas as escolas não ficam dentro do território quilombola, apenas fazem o atendimento escolar da comunidade. A SED está apurando as informações e documentos a respeito da demolição e, caso necessário, tomará as medidas cabíveis”, afirma a secretaria.
Moradores da região afirmam que a escola foi destruída pelas empresas Imaribo S.A Indústria e Comércio e Iguaçu Celulose Papel S.A. Houve um manifesto na frente das empresas.
Da Redação