Intelectuais e artistas da América e da Europa alertam sobre Bolsonaro

Questionados por jornal, alguns dos principais intelectuais e artistas dos dois continentes fizeram alertas e críticas sobre o candidato do PSL

Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr

Jair Bolsonaro

Jair Bolsonaro e seu discurso extremista de direita, que não admite oposição e estimula a violência, é visto como ameaça por diversas camadas da sociedade e tem atraído olhares de todo o mundo. O jornal El País, da Espanha, entrevistou alguns dos principais nomes da intelectualidade e da cultura do continente americano e da Europa, questionando sobre suas visões a respeito do candidato do PSL. As respostas foram unânimes: ele representa o retrocesso e uma ameaça real.

Para o cineasta brasileiro Walter Salles, com uma eventual eleição de Bolsonaro, “estaríamos entrando em um período de escuridão, que teria consequências não só para o Brasil. Seria a vitória do preconceito e da intolerância. Seria também o fim da agenda ambiental do país, a saída do Brasil do acordo climático de Paris, o fim do sistema de cotas nas universidades e outros mecanismos de inclusão social”.

Salles ainda afirma que “a retórica bolsonarista o coloca mais perto de Duterte do que de Trump, com as consequências desastrosas que se veem no regime ditatorial filipino”.

“Em relação a seu programa econômico, vale lembrar que o ultraliberalismo da escola de Chicago coexistiu apenas com regimes ditatoriais na América Latina, como no Chile de Pinochet”, finaliza.

Para o escritor mexicano Juan Villoro, “Bolsonaro representa um risco extraordinário para a América Latina e para o mundo inteiro. Estamos vendo a ascensão nas eleições de um candidato que não podemos hesitar em classificar como fascista.

Villoro ainda diz que “é um candidato discriminatório e racista que, paradoxalmente, conseguiu, seja pelo medo num sentido pragmático de conveniência, obter o apoio dos setores que ele próprio repudia”.

“É realmente vergonhoso que ele seja um candidato que nega a participação comunitária, a tolerância, e que, aparentemente, será o homem forte do Brasil. É muito perigoso que este exemplo, semelhante ao de Trump, embora mais agudo, possa estimular respostas semelhantes no continente”.

“Estamos diante de uma ascensão da irracionalidade política que nos obriga a lembrar que Hitler chegou democraticamente ao poder”, acrescentou o mexicano.

Segundo a atriz Alice Braga, filha de Sônia Braga, “se Jair Bolsonaro vencer o segundo turno das eleições será uma fissura profunda em nossa sociedade, no país e no mundo. Ele espalhou o ódio de tal forma que causa vergonha em Marine Le Pen e faz Donald Trump parecer um republicano moderado.

“Há um pico imprevisto nos crimes de ódio e não devemos esquecer que o Brasil tem o maior número de assassinatos a sangue frio de ativistas LGBT e ambientalistas”, destaca a atriz.

Braga ainda aponta que “ele quer tirar o Brasil do acordo climático de Paris, das Nações Unidas. Além disso, abrirá caminho para que o setor rural marche pela Amazônia armado com pistolas, pesticidas e motosserras. Isso não é apenas um problema do Brasil, é um assunto de todos, para que se tenha um futuro mais seguro”.

Na visão da jornalista e escritora mexicana, Alma Guillermoprieto, uma eventual eleição de Bolsonaro talvez seja “a coisa mais perigosa que aconteceu na América Latina nos últimos tempos”.

“Não só pelo modo como sua capacidade de gerar ódio vai afetar os brasileiros, nem pela impraticabilidade de suas políticas econômicas, mas porque sua promessa de abrir a região amazônica à exploração comercial põe em perigo a saúde de todo o planeta.”

“Estou terrivelmente preocupada com o discurso homofóbico, anti-mulheres e pró-ditadura de Bolsonaro, e que isso não seja suficientemente pesado para que não votem nele”, afirma a escritora argentina Claudia Piñero.

“Como alguém pode votar dizendo “não importa o que ele diga sobre os homossexuais, porque vamos ter uma taxa de juros melhor”? No que estamos nos transformando? Como pode uma pessoa sensata dizer semelhante barbaridade?”, questiona ela.

Para o escritor colombiano Juan Gabriel Vásquez, “Jair Bolsonaro é um fascista: e seria um erro, um novo erro na longa cadeia de erros que nós, democratas, cometemos nos últimos dois anos, acreditar que é desproporcional chamá-lo por esse nome”.

“O que acontece é que o fascismo dele é um fascismo de um novo cunho, que ainda não nos assusta como deveria, talvez porque ele age de dentro, minando a democracia por meio da exploração de suas próprias liberdades, das suas próprias garantias”, explica o colombiano.

“Seus traços são inconfundíveis: o elogio ao autoritarismo militarista, a violência verbal mais cínica e direta que se viu na política latino-americana em décadas, o grotesco assédio moral de todas as minorias e, acima de tudo, o uso eficaz do discurso de confrontação e da divisão (do nós contra eles: primeira página do manual do populismo extremista)”, completa Vásquez.

O jornalista mexicano Jorge Ramos, avalia que “o crescimento de Bolsonaro no Brasil reflete, infelizmente, o pior do Brasil e da América Latina. Não há dúvida. Em nosso hemisfério há uma enorme desilusão com a democracia”.

Como a democracia não se come, nem evita que te matem, nem reduziu significativamente a distância entre ricos e pobres, há um retorno à ideia do homem forte. Em toda a América Latina temos tido uma selvagem variedade de tiranos e ditadorzinhos”, relembra Ramos, acrescentando que “agora no Brasil reaparece como um monstro de mais cabeças: machista, homofóbico, xenófobo, misógino e racista”.

Outro colombiano, Héctor Abad Faciolince, afirma que “o que está ocorrendo no Brasil não pode ser entendido com o velho esquema do enfrentamento entre esquerda e direita. O outro esquema binário de compreensão, autoritarismo versus liberalismo, aproxima-se mais, mas também não esgota a análise”.

O argentino Adolfo Pérez Esquivel, ganhador do Nobel da Paz em 1980, afirma categoricamente que “Lula está preso para que o PT não ganhasse no primeiro turno. Aqueles que foram cúmplices do golpe contra Dilma Rousseff e da proscrição de Lula hoje se lamentam por abrir uma possibilidade incrível para o terrorismo fascista no Brasil”.

Ele ainda desafia: “Se são verdadeiramente democráticos, todos os partidos políticos devem se unir e conclamar a votar em Haddad, que não só significa o retorno da democracia e do republicanismo ao Brasil, como também da capacidade do Governo de proteger o povo da fome, do desemprego, do analfabetismo e da violência do crime organizado”.

“Muitos que estão em silêncio ainda estão a tempo de que a história não os recorde como covardes, como recorda aqueles que deixaram o terrorismo fascista avançar em outras épocas”, completa Esquivel.

O linguista norte americano Noam Chomsky avalia que “Bolsonaro não é apenas um desses líderes vergonhosos de extrema direita que degradam a política contemporânea. Vai muito além disso”.

Ele destaca como Bolsonaro enalteceu o torturador Ustra. “Talvez seu momento mais vil − e há muitos − tenha sido durante o grotesco “golpe suave” da direita, quando um Parlamento formado por notórios criminosos destituiu a presidenta Dilma Rousseff baseando-se em motivos irrisórios. Bolsonaro dedicou seu voto ao chefe da espantosa unidade de tortura da ditadura que foi responsável pela feroz tortura de Rousseff”.

“Talvez não seja surpreendente, vindo de alguém que critica a ditadura só porque esta não assassinou 30.000 pessoas, como na Argentina. Uma lista de declarações horrendas encheria muitas páginas. Seus programas para o país, caso postos em prática, seriam muito benéficos para os investidores e para os super-ricos, à custa da população considerada sem valor, uma categoria ampla, enquanto o país decai para uma caricatura lamentável”, completa o linguista.

De acordo com o filósofo e escritor francês Bernard-Henri Levy, “Sem dúvida, a crise está aí. E a extensão da corrupção. E o aumento da violência urbana. Mas nenhuma solução pode vir de um populista que não faz senão prometer novas violências e o esfacelamento de seu povo”.

“É preciso recordar as inumeráveis declarações racistas, misóginas, homofóbicas, belicistas e, às vezes, criminosas do candidato que hoje encabeça as pesquisas? E não é evidente que as declarações desse sujeito, assim como o programa que as acompanha, vão contra tudo aquilo do que o Brasil pode se orgulhar: sua multietnicidade, sua tradição e suas práticas de acolhida, seu liberalismo verdadeiro e a coabitação, em suas cidades imensas e belas, de múltiplas crenças?”, questiona

“O Brasil deve extrair forças de sua memória sofrida e da lembrança dos horrores da ditadura militar que tomou o país como refém entre 1964 e 1985. Deve dizer #EleNão ao candidato de extrema direita que exibe abertamente seu desprezo pelas regras democráticas”, acrescenta o francês.

“Todos sabemos que o nacionalismo exacerbado, o desprezo pelos direitos humanos e as minorias e a agitação do ódio como estratégia de campanha são as armas dos populistas. E a História, incluída a brasileira, transborda de exemplos dramáticos que indicam aonde isso pode conduzir”, finaliza Levy.

Da redação da Agência PT de notícias, com informações do El País

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