Juiz que manobrou contra Lula é amigo íntimo de general
Em clima familiar, presidente do TRF-4, desembargador Thompson Flores, rasga elogios a candidato a vice de Bolsonaro durante evento do Clube Militar
Publicado em
O juiz de primeira instância Sérgio Moro nunca se privou de deixar clara sua relação de proximidade com os tucanos de alta plumagem. Mas o curitibano não é o único que atropela princípios éticos da magistratura em nome das próprias amizades. Nesta segunda-feira (20), o presidente do TRF-4, desembargador Carlos Thompson Flores, que já acumulara uma série de irregularidades para manter o ex-presidente preso político naquele 8 de julho, mostrou de que lado está ao escancarar intimidade com o “estimado amigo” Hamilton Mourão (PRTB), general da reserva e candidato a vice de Jair Bolsonaro (PSL).
A troca de gentilezas aconteceu durante evento público no Clube Militar, no Rio de Janeiro, onde Flores foi convidado a dar palestra – mesmo ciente de que a participação pudesse levantar questionamentos sobre sua “imparcialidade”. Ao final de sua explanação, o juiz de 2ª instância fez questão de ir até Mourão para, em tom familiar, o classificar como “meu dileto amigo”. Ao final, ainda recebeu um presente do militar.
Embora Mourão tenha, em vão, dito não se tratar de um evento político, a simples troca de elogios entre o magistrado e o candidato durante as eleições sugere justamente o contrário. E mais: a simples presença de Flores é uma clara afronta ao Código de Ética da Magistratura – em vigor desde 2008, o documento lista uma série de deveres e princípios aos profissionais do Judiciário e serve de “instrumento essencial para os juízes incrementarem a confiança da sociedade em sua autoridade moral”.
O Artigo 16 do Capítulo V, por exemplo, deixa claro que “o magistrado deve comportar-se na vida privada de modo a dignificar a função, cônscio de que o exercício da atividade jurisdicional impõe restrições e exigências pessoais distintas das cometidas aos cidadãos em geral”.
No artigo seguinte, o documento vai além ao explicitar que “é dever do magistrado recusar benefícios ou vantagens de ente público, de empresa privada ou de pessoa física que possam comprometer sua independência funcional.” Ao participar de um evento com um candidato a vice-presidente e ainda aceitar um presente, Flores destruiu ambos os princípios.
Não li e adorei
Esta, no entanto, não foi a primeira vez que Thompson Flores colocou a própria imagem em xeque ao atuar politicamente, sobretudo contra Lula. Às vésperas do julgamento que confirmou a prisão política do ex-presidente, o desembargador veio a público dizer que não leu o processo, desconhecia os autos, mas mesmo assim julgava a sentença condenatória do juiz Sérgio Moro como irretocável. Ainda cometeu o disparate de dizer que a referida sentença “vai entrar para a história”.
Ao se manifestar publicamente sobre um processo que não leu e que é contestado por centenas de juizes mundo afora, Flores novamente agiu contra o Código de Ética da Magistratura, desta vez contrariando o artigo 12 que ordena ao magistrado, “na sua relação com os meios de comunicação social, comportar-se de forma prudente e equitativa, e cuidar especialmente para que não sejam prejudicados direitos e interesses legítimos de partes e seus procuradores”.
Para os inimigos, a rapidez
Outra prova de que o juiz já mostrara a que veio antes mesmo de Lula ser condenado foi a rapidez fora do comum no andamento do recurso do ex-presidente Lula junto ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Em 2017, apenas dois processos públicos por corrupção foram decididos pelo órgão em menos de 150 dias.
Entre os 1.263 processos públicos (63 estão em segredo de Justiça) relacionados por Flores, apenas os dois por corrupção –menos de 0,2%– tratam dos mesmos crimes da ação contra o petista, que ainda tem réus como o ex-líder da OAS Léo Pinheiro e o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto.
O processo de Lula já segue uma trajetória de rapidez incomum mesmo em fases anteriores. O ex-presidente foi condenado na primeira instância, pelo juiz Sergio Moro, a nove anos e seis meses de prisão em julho e o recurso chegou em 42 dias no TRF-4, tempo recorde na Lava Jato.
Torcida nas redes
Flores também parece eleger ideologicamente seus funcionários. Isso é o que deixa a entender Daniela Tagliari Krelin Lau, chefe de gabinete do presidente o TRF-4. A funcionária usou, com a frequência de uma militante ferrenha, as redes sociais para pedir a prisão de Lula . Em mais um capítulo que mostra a total falta de parcialidade e desrespeito à lei orgânica da magistratura, pediu aos seus seguidores que assinassem uma petição para que o mesmo tribunal onde trabalha condenasse Lula.
Mais do que gerar revolta naqueles que denunciam a parcialidade do Judiciário, as postagens de Daniela só corroboravam como Lula seria tratado pelo tribunal de exceção criado para condená-lo. Na época, a presidenta nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann, rechaçou a postura da chefe de gabinete do desembargador. “O que Lula pode esperar do TRF4? Parcialidade e perseguição dentro do Tribunal Regional Federal”.
Ele mandou PF não soltar Lula
A mais recente arbitrariedade do desembargador aconteceu em julho, quando o desembargador teria mandado a Polícia Federal descumprir a ordem de soltura do ex-presidente Lula no dia 8 de julho. A informação foi confirmada pelo diretor-geral da Polícia Federal, Rogério Galloro, que disse ao Estado de S. Paulo ter sido orientado por Flores a não dar cumprimento ao Habeas Corpus concedido pelo desembargador Rogério Favreto. “O telefonema dele veio antes de expirar uma hora. Valeu o telefonema”, disse Galloro.
Em nota, o magistrado negou as acusações, mas esqueceu de dizer que o despacho de Sergio Moro (feito enquanto estava de férias) citou seu nome como orientador. O juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba deixou claro que foi instruído pelo presidente do TRF-4 a não obedecer à decisão de Favreto.
Por Henrique Nunes da Agência PT de Notícias