Lula está há 90 dias como preso político; resistência continua

Ex-presidente está desde 7 de abril na Polícia Federal em Curitiba após condenação sem provas. Local virou símbolo de luta por democracia e liberdade

Ricardo Stuckert

Vigília Lula Livre é local de resistência em Curitiba

Há três meses, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu se apresentar à Polícia Federal (PF) para cumprir o mandado de prisão expedido pelo juiz de primeira instância Sérgio Moro após a condenação sem provas pelo caso do triplex no Guarujá, confirmada em segunda instância pelo TRF-4.

Desde então, o pré-candidato do PT à Presidência da República aguarda que o Poder Judiciário aprecie os diversos recursos que sua defesa interpôs para garantir que Lula possa lutar para provar sua inocência em liberdade, até a última instância. Faltam 40 dias para o registro das candidaturas e início oficial das eleições, em 15 de agosto.

O ex-presidente está sozinho na sala de 15 m² que foi adaptada para recebê-lo na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba. Mas, todos os dias, pode ouvir o coro de centenas de vozes, com sotaques de todo o Brasil, que lhe desejam “bom dia” e “boa noite”. Ao longo desses 90 dias, a Vigília Lula Livre, acampamento de militantes de esquerda em protesto permanente pela liberdade de Lula, não arredou pé, mesmo sob ameaça policial e judicial.

Regina Cruz, liderança da Central Única dos Trabalhadores (CUT) do Paraná, diz que a Vigília Lula Livre é um marco da história de lutas e resistência do estado. Nos últimos meses, grupos de militantes de todo o país se revezaram para manter o espaço sempre vivo, e realizaram diversos atos políticos e rodas de conversas para discutir assuntos de interesse do povo brasileiro, como a privatização de patrimônios por parte do governo golpista de Michel Temer (MDB), a psicologia do ódio e do fascismo que toma as ruas contra a esquerda e a distribuição de notícias falsas pela internet, entre outros.

A cada visita que Lula recebe, a Vigília se enriquece com novos depoimentos e recados do ex-presidente. Regina vê com bons olhos a construção coletiva que se dá no bairro Santa Cândida.

“A unidade dos movimentos sociais está cada vez mais fortalecida dentro da Frente Brasil Popular. Passamos por dias de chuva, garoa, geada. São dias de muita luta, passamos por muitas coisas, brigas com vizinhos, visitas de monges, atores. Acho que avaliação é muito positiva. Nós dos movimentos sociais saímos cada vez mais fortalecidos. É um aprendizado de vida estarmos reunidos há 90 dias. Todas as nossa mídias alternativas tem furado a bolha para falar que esta Vigília existe, já que a grande mídia tenta nos excluir”, ressalta a dirigente.

Os nomes da resistência

Atividade das mulheres no Acampamento Democrático Lula Livre, em Curitiba (PR).

A Vigília Lula Livre é um ponto de encontro de histórias, culturas, idéias, sonhos e regionalidades; e permeando as novas relações que florescem no bojo da luta democrática, a certeza de que só a mobilização popular é capaz de enfrentar o autoritarismo instalado nas instituições brasileiras.

Para apresentar alguns dos protagonistas da resistência em Curitiba, a reportagem do Brasil de Fato conversou com militantes que se encontram neste momento na capital paranaense exercendo sua cidadania.

Josemir José Dallacosta, o Kiko, é bancário e originário de Guaíra, cidade do interior do Paraná. Ele conta que, em meados da década de 80, começou a frequentar grupos de jovens da Igreja Católica, e lá começou sua militância, principalmente pela Pastoral da Juventude.

“Dei sorte que tinham dois padres recém vindos do ABC paulista e eles tinham um evangelho baseado na teologia da libertação”, relembra o bancário. “Eu ouvi falar do Lula nesse momento de efervescência dos movimentos socais, ligados, principalmente, no meu caso, à Igreja Católica”, completa.

Segundo ele, esse foi um canal direto para o PT, que estava no início em sua cidade natal. Ele relembra que, à época, Lula realizava as caravanas da cidadania, percorrendo o país para apresentar o novo partido e recolher reivindicações populares.

“Lá se vão 30, 35 anos. Essas coisas você jamais esquece. Isso mudou a minha personalidade, mudou a minha militância, a minha crença. Hoje eu ainda sou um resultado disso, dessa minha crença religiosa que se transformou em uma crença política”, completa.

Luana Lustosa Rodrigues, é formada em Serviço Social e militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Ela conta que sua vida se cruzou com a de Lula ainda aos 12 anos de idade, quando o ex-presidente tomou posse de seu primeiro mandato e o governo voltou sua atenção ao trabalhador.

“Acho que de maneira mais efetiva, quando eu criei consciência disso foi quando eu ingressei na universidade pública”, relembra a militante, que estudou a vida toda em instituições públicas. Ela foi beneficiada por programas de auxílio a moradia, alimentação e também a estágios que, para ela, contribuíram para sua formação de uma maneira mais ampla.

“Teve também a consciência politica que consegui construir durante o processo da universidade”, ressalta.

Luana acredita que este é o momento mais significativo de sua militância, pois vê a diferença entre o momento do Brasil durante o governo do PT e este momento pós-golpe, em que o trabalhador se vê com menos direitos a cada dia. Para ela, Lula é um projeto político em que acredita.

José Lusardo Cruz Brum é militante da luta por moradia e também iniciou sua militância na Igreja Católica, por meio da Pastoral da Juventude e das Comunidades Eclesiais de Base em Santa Maria, no Rio Grande do Sul.

“Por ser uma região central do estado, a direita colocou um presídio lá, ao invés de uma escola. Muitas famílias dos detentos foram para a comunidade, que fica a três quilômetros da cadeia. Eu dou aulas de futebol pra essa gurizada e trabalho com famílias”, conta.

Brum, que iniciou sua militância através das escolas, acha que não é normal que hoje ele esteja aqui lutando pelo direito do povo de escolher o candidato que melhor o represente. “A primeira vez que minha vida se cruzou com a do Lula foi no movimento pelas Diretas Já. Depois, Caras pintadas no centro de Santa Maria em 93. De lá pra cá a gente nunca saiu desse movimento”, relembra.

Por Brasil de Fato

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