Natália Bonavides pede CPI para investigar Abin paralela de Bolsonaro
Deputada petista quer apuração do Congresso Nacional sobre denúncias de uso do aparato federal de inteligência para atender a interesses de Bolsonaro e seus filhos. Ministra Carmen Lúcia, do STF, determinou investigação da PGR sobre a colaboração da Abin com a defesa de Flavio Bolsonaro. “As instituições do Estado não podem ser um puxadinho da família Bolsonaro”, afirmou Bonavides. “É essencial que os órgãos que têm a atribuição de investigar e fiscalizar tomem para si a responsabilidade de buscar provas, pois é notório que há indícios do uso ilegal da inteligência por parte da família Bolsonaro”
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A deputada federal Natália Bonavides (PT/RN) apresentou pedido de abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar denúncias sobre o uso do sistema de inteligência federal para finalidades ilegais e para atender aos interesses particulares da família do presidente Jair Bolsonaro. Natália também quer investigar a existência de uma estrutura não oficial de informações atuando dentro da Agência Brasileira de Inteligência, como uma Abin paralela.
Para Natália, é inadmissível que o presidente esteja usando órgãos públicos na defesa do filho, como afirmam reportagens da revista ‘Época’. As matérias trouxeram à tona reuniões e relatórios de agentes do governo para auxiliar a defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) no processo que envolve “rachadinhas” na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) e o laranja Fabrício Queiroz. Apontado como operador do esquema, o ex-PM foi preso em junho num sítio de Frederick Wassef, ex-advogado e uma espécie de conselheiro de Bolsonaro.
“Iniciamos a coleta de assinaturas para a instalação da CPI porque as instituições do Estado não podem ser um puxadinho da família Bolsonaro. É essencial que os órgãos que têm a atribuição de investigar e fiscalizar tomem para si a responsabilidade de buscar provas, pois é notório que há indícios do uso ilegal da inteligência por parte da família Bolsonaro”, pontuou a parlamentar.
Natália lembra que já há investigação em curso na Procuradoria Geral da República (PGR), aberta após Notícia-Crime protocolada por ela, que investiga se a família Bolsonaro mobilizou órgãos do Governo Federal para obter elementos que embasassem o pedido de anulação das investigações contra o senador. “Também pediremos ao STF o afastamento do diretor-geral da Abin e a investigação de Jair e Flávio. O povo brasileiro merece que essa investigação seja realizada”, conclui a deputada.
Na semana passada, o líder da Bancada do PT na Câmara, Enio Verri (PR), protocolou na PGR representação cobrando apuração sobre o papel de Alexandre Ramagem, diretor-geral da Abin, e do general da reserva Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), ao qual a Abin é subordinada, no caso.
Além de Verri, a representação é assinada pela presidenta do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), pelos líderes da Minoria na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), e da Minoria no Congresso, Carlos Zarattini (PT-SP), e todos os demais 50 deputados e deputadas do partido. A petição requer a responsabilização dos agentes envolvidos e a verificação de ato de improbidade administrativa e crime contra a administração. Flávio também é arrolado na representação, que foi encaminhada ainda ao chefe do Ministério Público estadual do Rio de Janeiro.
“Não se pode compactuar com aqueles que, alçados aos mais altos cargos dos poderes da República, passam a fazer uso criminoso das instituições que deveriam dignificar na nobre missão de agentes públicos e políticos, fazendo das suas prerrogativas constitucionais caminhos para a realização de seus desejos e objetivos pessoais ou de terceiros, em detrimento da sociedade brasileira, das instituições democráticas e da Constituição Federal”, diz um trecho do documento.
Supremo manda PGR investigar
Nesta sexta (18), a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Carmen Lúcia determinou uma investigação da PGR sobre o caso. Na avaliação dela, os fatos “pelo menos em tese, podem configurar atos penal e administrativamente relevantes (prevaricação, advocacia administrativa, violação de sigilo funcional, crime de responsabilidade e improbidade administrativa)”.
Após a ministra conceder, no início da semana, um prazo de 24 horas para que Heleno e Ramagem dessem explicações sobre os relatórios, o chefe da Abin se pronunciou. Ele negou que a agência tenha produzido relatórios e confirmou apenas que participou de uma reunião com os advogados do filho do presidente, mas que o encontro não gerou nenhum resultado formal ou uso da estrutura pública que justifique ação judicial.
Já o general sustentou que o STF deve intimar o jornalista Guilherme Amado, da revista ‘Época’, para que ele apresente os relatórios mencionados. Ambos defenderam que a reunião com os advogados de Flávio não é ilegal, já que cabe ao GSI zelar pela segurança do presidente e seus familiares.
Na edição da sexta passada (11), a reportagem da ‘Época’ informava que os relatórios da Abin tiveram a autenticidade confirmada pela defesa de Flávio. Na edição desta sexta (18), a revista mostra que uma das advogadas do filho de Bolsonaro, Luciana Pires, agora garante que não seguiu as recomendações dos arapongas.
“Não fiz nada. Não vou fazer nada do que ele (Ramagem) está sugerindo. Vou fazer o quê? Não está no meu escopo. Tem coisa que eu não tenho controle”, disse Luciana. Ela afirmou que não tem conhecimento se outros documentos foram produzidos. A reunião citada pela advogada ocorreu em agosto entre o presidente, os advogados, Heleno e Ramagem. Os relatórios são resultado do encontro no Palácio do Planalto.
Na terça (15), o procurador-geral da República, Augusto Aras, anunciou que pediu informações à Abin sobre os relatórios. Aras afirmou que as suspeitas são graves, mas que ainda não há elementos que justifiquem uma investigação formal. E possível que após a determinação da ministra do STF, ele resolva se mexer.
No mesmo dia, Bolsonaro disse que a investigação envolvendo o filho não é feita de forma “justa”. Em entrevista por telefone ao programa ‘Brasil Urgente’, Bolsonaro destacou que a “pressão” contra seu filho mais velho ocorre para atingi-lo politicamente. Também garantiu que os repasses de dinheiro promovidos por Queiroz eram destinados a ele, e não ao então deputado estadual no Rio de Janeiro.
Abin paralela
Outra revista, a ‘Crusoé’, aponta nesta sexta a existência de uma “bolsonarista central” dentro da Abin, como suspeita a deputada Natália Bonavides. “Criada extraoficialmente e alheia ao procedimento da agência padrão para ‘levantar antecedentes’ e ‘montar dossiês’ a pedidos expressos do governo, uma estrutura foi batizada de Coordenação-geral de Credenciamento de Segurança e Análise de Segurança Corporativa e tem como chefe o agente da Polícia Federal (PF) Marcelo Bormevet”, revela a reportagem.
Segundo a matéria, Bormevet é um defensor aguerrido do presidente nas redes sociais e amigo do vereador Carlos Bolsonaro, o filho 02. Policial integrado com a equipe de segurança de Bolsonaro durante a campanha de 2018, quando atuou subordinado a Ramagem, ele seria conhecido na Abin como o “homem do capitão”.
A reportagem aponta que foi para fugir do procedimento legal e agir às escuras, longe dos olhos do aparato oficial do Estado e das autoridades, que Ramagem nomeou Bormevet e outro policial federal para coordenação sob o guarda-chuva do Centro de Inteligência Nacional (CIN). O órgão foi criado pelo decreto presidencial 10.445, assinado por Bolsonaro e por Heleno, e publicado no ‘Diário Oficial da União’ de 30 de julho.
Na época, o senador Jaques Wagner (PT-BA) e o deputado José Guimarães apresentaram projetos de decreto legislativo para sustar os efeitos do ato, mas a base de apoio bolsonarista evitou que as propostas prosperassem. “Desde então, pedidos, muitos deles nada republicanos, passaram a ser enviados diretamente e sem intermediários do gabinete de Ramagem para o ‘homem do capitão’, que ocupa uma sala no primeiro andar da sede da Abin, em Brasília”, afirma a matéria da ‘Crusoé’.
Outra reportagem, publicada nesta terça pela ‘Agência Pública’, apresenta em detalhes como Bolsonaro tem usado a Abin para fortalecer a espionagem sobre áreas críticas do governo, contra adversários, organizações não-governamentais (ONGs) críticas às políticas ambiental, indigenista e de direitos humanos.
Segundo a matéria, o general Heleno é alvo de mais de uma dezena de requerimentos que, desde o início da pandemia, vêm se acumulando na Comissão Mista de Controle de Atividades de Inteligência (CCAI) do Congresso pela sua atuação no GSI. Membro da CCAI pela liderança da Minoria na Câmara, o deputado Carlos Zarattini (PT-SP) diz que o uso de órgãos oficiais para espionar serve para Bolsonaro identificar inimigos políticos, monitorar ONGs e movimentos sociais, mas também alimenta grupos fascistas que tentam se articular a reboque da extrema direita governista.
“A Abin está se expandindo e representa uma ameaça à ordem democrática pior do que foi o SNI. Está agindo sob a égide do ‘tudo pode’. Os requerimentos são enviados, nada é respondido e o governo faz o que quer na CCAI”, dispara José Guimarães, titular da comissão como líder do bloco da minoria na Câmara.
Guimarães afirma que há um avanço claro da espionagem sobre políticos, servidores, ONGs, jornalistas ou qualquer outro segmento que Bolsonaro enxerga como inimigo. “Quem produz já está cansado de tantos requerimentos não respondidos. Gasta-se recursos públicos para espionar. A comissão se mantém em silêncio diante das ameaças constantes de um governo que a todo momento desrespeita a Constituição e os direitos da sociedade”, diz o deputado. “Vamos à Justiça”, garante.
Leia a reportagem da ‘Agência Pública’ na íntegra: https://apublica.org/2020/12/governo-bolsonaro-implanta-agentes-da-abin-em-diversos-ministerios/
Da Redação, com informações de ‘Época’, ‘Crusoé’ e ‘Agência Pública’