Nova lei do gás não vai garantir a retomada do crescimento

Em artigo, o deputado Carlos Zarattini adverte que Bolsonaro e Paulo Guedes mentem sobre “eficácia” da nova lei do gás. “Guedes ignora a importância dos gasodutos e ainda apresenta mais uma das suas ideias mirabolantes sem qualquer estudo técnico sério: transportar o gás pelas ferrovias e caminhões. Mais uma vez o ministro se enche de discurso vazio”, diz Zarattini

Gustavo Bezerra

Deputado Federal Carlos Zarattini (PT-SP)

O Brasil tem grandes reservas de gás natural e produção suficiente para atender todo o mercado nacional. Entretanto, importamos gás liquefeito da Bolívia e de outros países porque não temos estrutura de escoamento nas plataformas e gasodutos para transporte, especialmente no interior do país. Hoje, quase 50% da nossa produção em poços de exploração do pré-sal é reinjetada no subsolo. Ou seja, a produção nacional é descartada por falta de infraestrutura de escoamento sem gerar arrecadação e royalties.

Todo mundo sabe que a exploração do gás natural tanto no sistema offshore (alto-mar nas camadas do pré-sal) como onshore (exploração em terra) é importante para o desenvolvimento econômico do Brasil e pode gerar emprego e renda. Mas seguimos importando gás e desperdiçando uma riqueza extraordinária por falta de uma política nacional de desenvolvimento.

Na contramão das necessidades do setor de gás, o desgoverno Bolsonaro privatizou a nossa já escassa rede de gasodutos (só falta um gasoduto ser vendido) e agora aprovou na Câmara dos Deputados a falaciosa “Nova Lei do Gás” como solução para os problemas. A proposta que tramita no Congresso prevê o fim do monopólio das distribuidoras de gás nos estados e joga para a iniciativa privada a infraestrutura de transporte. Porém, até hoje, só quem investiu na construção de gasodutos foi a Petrobras, ou seja, investimento estatal. Com dimensões continentais, o Brasil tem apenas 9.400 km de dutos, enquanto a Argentina, por exemplo, tem 16 mil km.

Desde que assumiu como ministro da Economia, Paulo Guedes repete o mantra de que a iniciativa privada iria assumir as obras de infraestrutura no Brasil, onde, sob a gestão de um ultraliberal, os investimentos jorrariam. Mas a verdade é que o governo até agora foi incapaz de atrair o setor privado.

Concessões seguem paradas diante da incapacidade do governo de articular e promover propostas atraentes, fora a crise política constante, que afugenta os investidores. Então, por que agora Guedes vai conseguir a façanha de garantir que empresas façam investimentos milionários no sistema de gás sem qualquer garantia de retorno e de lucro?

Guedes ignora a importância dos gasodutos e ainda apresenta mais uma das suas ideias mirabolantes sem qualquer estudo técnico sério: transportar o gás pelas ferrovias e caminhões. Mais uma vez o ministro se enche de discurso vazio.

Para garantir apoio no Congresso, o governo comercializa a ideia de que a nova legislação vai gerar R$ 60 bilhões em investimentos, quatro milhões de empregos, gás mais barato para a indústria e botijão a preço melhor para o consumidor final. Mas tudo isso é conversa mole.

A verdade é que a Lei do Gás não responde como será solucionado o problema de falta de gasoduto de transporte e a ausência de estrutura de escoamento nas plataformas; e não traz, também, uma política de desenvolvimento no médio e longo prazo para o setor. A proposta apenas vende a falsa sensação de que uma nova legislação vai garantir retomada do crescimento e investimentos privados. Mas não existe no projeto nenhuma política pública que incentive a universalização do gás.

Esse é mais um discurso mentiroso da dupla Guedes e Bolsonaro e que precisa ser combatido. A Lei do Gás é mais do mesmo e não resolve nenhum dos problemas do setor. Só com um projeto de infraestrutura robusto seremos capazes de colocar fim às limitações logísticas e usufruir dessa riqueza nacional tão abundante.

Economista formado pela USP, é deputado federal (PT-SP) e líder da Minoria no Congresso

Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo, neste sábado, 5.

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