Reparação histórica: Lula sanciona pensão para filhos de vítimas de hanseníase

Aproximadamente 15 mil pessoas podem ser beneficiadas diretamente pela nova lei. Valor da pensão vitalícia não pode ser inferior a um salário mínimo

Ricardo Stuckert

Lula: "Estender aos filhos o direito à pensão especial é dar mais um passo importante para a reparação de uma dívida enorme que o Brasil tem"

O presidente Lula sancionou na tarde desta sexta-feira (24) a lei que institui indenização em formato de pensão vitalícia aos filhos das pessoas que ficaram isoladas em colônias de pessoas acometidas pela hanseníase no século passado e foram separados de seus pais.

Durante a cerimônia, o presidente ressaltou que estender o direito à pensão é estender aos filhos e filhas a reparação de uma dívida histórica do Brasil.

“Nenhum dinheiro do mundo é capaz de compensar ou apagar as marcas que a segregação provocou na alma e no coração das pessoas portadoras de Hanseníase e suas famílias”, declarou o presidente. “Mas, estender aos filhos o direito à pensão especial é dar mais um passo importante para a reparação de uma dívida enorme que o Brasil tem com aqueles que durante anos foram privados dos cuidados e carinhos dos seus pais”.

Lula relembrou o isolamento obrigatório que homens e mulheres com o diagnóstico da doença tiveram de suportar, vivendo isolados em hospitais e colônias espalhadas pelo país. “O Estado brasileiro criava uma geração de órfãos de pais vivos. Crianças abandonadas, levadas para crescerem em locais segregados, muitas vezes vítimas também de preconceitos e maus tratos, privadas de amor e de oportunidades. Certamente, nenhuma delas, muitas das quais presentes aqui hoje, já adultas, têm lembranças boas dos locais para onde foram levadas”, observou.

“Fui o primeiro presidente da República do Brasil a abrir as portas do Palácio do Planalto para os afetados pela Hanseníase”, lembrou Lula. “Em 2007, antes de assinarmos a medida provisória da indenização, recebemos uma comitiva de representantes de hansenianos para ouvir diretamente suas demandas. Lembro da mobilização do nosso querido companheiro Gilberto Carvalho, que não está aqui conosco, para que esse encontro acontecesse. E lembro da atuação importante do Morhan, o movimento de reintegração dos acometidos pela Hanseníase como voz potente dessas famílias na defesa dos seus direitos”.

O presidente Lula reforçou seu compromisso na construção de políticas públicas com participação social. “Construímos no passado e continuaremos construindo nossas políticas com participação social. E é muito importante que vocês, como demais setores da sociedade, apontem prioridades e nos cobrem o cumprimento das nossas políticas”.

Complexo econômico industrial da saúde

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, destacou o desenvolvimento de inovações estratégicas como o complexo econômico industrial da saúde, que é um dos eixos centrais do presidente Lula.

“Eu afirmo aqui, não se tratam de doenças negligenciadas, se tratam de pessoas e grupos da sociedade discriminados por várias condições sociais e pelo preconceito”, destacou a ministra.

15 mil beneficiadas

Conforme estimativa do Movimento de Reintegração dos Acometidos pela Hanseníase (MORHAN), aproximadamente 15 mil pessoas podem ser beneficiadas diretamente pela nova lei. Há cerca de 5,5 mil pessoas acometidas pela hanseníase que chegaram a ser isoladas compulsoriamente e ainda estão vivas.

A nova legislação é uma reparação histórica à decisão do Estado brasileiro que vigorou desde a década de 1920, época em que pessoas com a doença recebiam determinação de isolamento compulsório, o que perdurou por mais de meio século.

Um salário mínimo

A lei também estabelece novo parâmetro de valor para a indenização das pessoas que foram isoladas compulsoriamente na época. O valor não poderá ser inferior a um salário mínimo por mês. Esse mesmo parâmetro mínimo resguarda os filhos das pessoas isoladas, que agora passam a ter direito a pensão. A regulamentação dos valores de indenização e dos trâmites burocráticos para recebê-la ocorrerá em decreto posterior.

O isolamento de pessoas com hanseníase ocorreu de forma mais intensa até a década de 1950, sendo reduzida a partir dos anos 60. Mas até 1976 era respaldada oficialmente pelo Estado e durou na prática até 1986, em casos mais raros, como revelaram apurações sobre o assunto. O grupo de pacientes mantido naquela mesma época em isolamento domiciliar nas florestas e seringais – e não em colônias – acaba de ser incluído na nova legislação, que sucede a Lei 11.520, de 2007. São pessoas especialmente da região Norte do país, com especial destaque para moradores do município de Cruzeiro do Sul, no Acre.

Doença determinada socialmente

Tanto o diagnóstico quanto o tratamento da hanseníase são totalmente gratuitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O Ministério da Saúde contabiliza em média 21 mil novos casos de hanseníase por ano no país. A hanseníase é uma das 11 doenças que fazem parte do Comitê Interministerial para Eliminação da Tuberculose e de Outras Doenças Determinadas Socialmente (CIEDDS), que atua para eliminação enquanto problema de saúde pública. De forma inédita, nove ministérios se reuniram para elaborar estratégias de eliminação de doenças que acometem, de forma mais intensa, as populações de maior vulnerabilidade social.

Coordenado pelo Ministério da Saúde, o grupo irá funcionar até janeiro de 2030. Dados da pasta apontam que, entre 2017 e 2021, as doenças determinadas socialmente foram responsáveis pela morte de mais de 59 mil pessoas no Brasil. O plano de trabalho inicial inclui enfrentar 11 dessas enfermidades – como malária, esquistossomose, Doença de Chagas e hepatites virais – além da transmissão vertical da sífilis, hepatite B e do HIV. Essa estratégia está prevista nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.

Assista a íntegra da cerimônia:

Meta

De acordo com o Ministério da Saúde, a meta é que a maioria dessas doenças sejam eliminadas como problema de saúde pública – são elas: Doença de Chagas, malária, hepatites virais, tracoma, filariose, esquistossomose, oncorcercose e geo-helmintíases.

Para outras enfermidades, como tuberculose, HIV e hanseníase, o objetivo é atingir as metas operacionais de redução e controle propostas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) até 2030. Já para doenças como HIV, sífilis e hepatite B, a meta é eliminar a transmissão vertical, ou seja, quando a doença é passada de mãe para filho.

Da Redação, com informações do Ministério da Saúde

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