Sampaio, Aguilera e Borges: Fazer do presente o nosso futuro
Não basta o discurso: é necessário criar já vivências e experiências coletivas de reflexão, de cuidado e de construção de um novo mundo possível
Publicado em
Cada dia fica mais evidente a que veio o golpe de 2016. Com a agenda de temeridades que o governo golpista tenta aprovar no Congresso, estamos presenciando um retrocesso de décadas na luta por igualdade e por direitos sociais.
Resistimos e lutamos. Há mais de 500 anos, a nossa história é de resistência em defesa das nossas vidas, nossos corpos, nossas culturas, nossas línguas, nossas terras, nossas matas, nossas águas, nossa natureza. Resistência contra o colonialismo e a escravidão. Resistência à morte, à violência, ao estupro, ao roubo e à exploração.
Agora, mais uma vez resistimos, quando querem nos impor uma receita que nos desconsidera a tal ponto que ficaremos sem nos aposentar e trabalhando em condições cada vez piores.
O PT nasceu, nos início dos anos 80, da necessidade sentida pela classe trabalhadora de intervir na sociedade e na política para transformá-las. Quando mais da metade do Brasil vivia na pobreza extrema, o PT surgiu como o sonho de uma realidade diferente, sem exclusão. E foi esse sonho que, nas últimas três décadas, moveu nosso partido a transformar, na prática, a vida das pessoas.
As políticas públicas dos governos Lula e Dilma reduziram a pobreza extrema a 2,4%, incluíram milhares de jovens negras e periféricas no ensino superior e deram protagonismo à classe trabalhadora. Apesar de ter mudado materialmente a vida de muitas pessoas, faltou na prática do PT a ênfase à construção partidária, já que ações de governo não bastam para disputar corações e mentes e colocar em movimento o projeto de transformações estruturais.
Mesmo com as limitações, a experiência de governo trouxe aprendizados e contribuiu para despertar novas energias sociais, como as mobilizações da juventude e da cultura, a primavera feminista e as ocupações de estudantes, que propõem questionamentos até então ausentes e novas bandeiras de luta, assim como formas inovadoras de diálogo, de construção colaborativa, de vivência e de relacionamento entre as pessoas. São movimentos descentralizados e horizontais, que se organizam em redes, à semelhança da Internet.
O PT sempre valorizou a riqueza dos movimentos sociais e organizações populares. É preciso compreender o impulso da juventude e dos novos movimentos para refazer o nosso Partido em torno dos nossos sonhos, que queremos colocar em prática.
Sonhamos com uma sociedade em que possamos viver, e não apenas lutar para sobreviver. Em que a natureza também somos nós, e não o outro. Em que o cuidado coletivo esteja em primeiro plano. Em que nosso corpo possa nos dar prazer, e não seja motivo de vergonha ou culpa.
Queremos passar mais tempo nos relacionando com outras pessoas e com a natureza do que no ônibus, no trem, no metrô. Queremos trabalho decente, livre para criar e recriar a nossa vida, e não para sustentar o lucro e o privilégio de alguns. Queremos uma sociedade que integre e respeite as crianças, assim como os nossos ancestrais e as pessoas mais experientes, em vez de mesquinhamente tentar tirar sua aposentadoria.
O mundo em que queremos viver deve ser assunto prioritário de todas as nossas conversas, dentro do PT e fora dele. E deve ser mais do que um horizonte distante, repleto de mediações. Nosso Partido precisa refletir dentro de si como queremos nos relacionar entre nós e o que queremos da sociedade.
Fazer do presente o nosso futuro. Não basta o discurso: é necessário criar, já agora, vivências e experiências coletivas de reflexão, de cuidado e de construção de um novo mundo possível. Essa é uma síntese fundamental das lutas sociais da juventude no último período.
Por isso, o principal desafio do nosso PT não é o de (a direção) “voltar às bases”. Ao contrário, é passar por um processo amplo e aberto de reformulação do seu programa e organização, que devem ser decididos coletivamente por todas nós que, em meio a tantas dificuldades, ainda acreditamos no nosso Partido como instrumento de luta.
O futuro não tem respostas prontas, mas a grandeza do nosso desafio exige responsabilidade. Por isso, devemos dizer em alto e bom som que no PT não pode haver espaço para projetos pessoais, para o oportunismo e para o carreirismo. O PT não pertence aos dirigentes de ocasião, iludidos com o cargo, mas negligentes com as tarefas. O PT não pertence a nenhuma das tendências, ou ao autor “iluminado” do melhor texto de balanço. O PT não pertence aos mandatos, parlamentares ou executivos, e portanto não pode ser loteado, ou, em outras palavras, privatizado.
O PT é das milhares de filiadas, de todas e todos os militantes que lutam e alimentam diariamente a esperança no nosso sonho coletivo e de milhões de pessoas que vivem neste país e que depositam nele a sua fé. Temos responsabilidade, coletivamente, perante cada uma dessas pessoas, em todos os cantos do Brasil e do mundo.
Para que o nosso sonho resista, o 6º Congresso do PT deve inaugurar um novo ciclo na história do Partido, abrindo caminho para que novos sonhos floresçam e inspirem nossa luta por muitos anos mais.
Tamires Sampaio, Maia Aguilera e Gabriel Borges, militantes da JPT de São Paulo, para a Tribuna de Debates do 6º Congresso. Saiba como participar.
ATENÇÃO: ideias e opiniões emitidas nos artigos da Tribuna de Debates do PT são de exclusiva responsabilidade dos autores, não representando oficialmente a visão do Partido dos Trabalhadores