Sem terrinhas defendem a educação pública de qualidade no campo

Ato no Memorial do Legislativo do Rio Grande do Sul foi marcado por muita emoção e simbolismos. As crianças protagonizaram uma pequena peça teatral

Giulia Cassol/Sul21

A educação no campo é um direito, não uma esmola. Essa frase atravessou todo o ato em defesa do direito das crianças à escola do campo pública e de qualidade, realizado na manhã desta sexta-feira (11), no Memorial do Legislativo do Rio Grande do Sul, pelo Setor de Educação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O salão localizado no primeiro andar no prédio do Memorial ficou lotado de sem terrinhas que estão participando do 19° Encontro Regional das Crianças Sem Terrinha, no Assentamento Capela, em Nova Santa Rita, na Região Metropolitana de Porto Alegre. Os sem terrinha que participam desse encontro já representam a terceira geração de sem terra desde que o movimento começou a se organizar no Rio Grande do Sul.

O ato no Memorial foi marcado por muita emoção e simbolismos. As crianças protagonizaram uma pequena peça teatral na abertura do encontro, onde um cabo de guerra opôs representantes do capital que tentavam destruir as escolas públicas do campo e alunos e professoras das escolas defendendo as escolas e o direito de as crianças terem uma educação pública de qualidade no campo. Os sem terrinha participaram ativamente da disputa e celebraram a vitória das escolas. Em seguida, as crianças ouviram o testemunho de Zoia Prestes, convidada especial para o evento. Filha de Luiz Carlos Prestes, Zoia é professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF), mestre em pedagogia e psicologia pré-escolar pela Universidade Estatal de Pedagogia de Moscou e doutora em educação pela Universidade de Brasília (UnB).

A educadora contou para as crianças a origem do seu nome, pouco usual para os padrões da língua portuguesa. “Foi uma homenagem que meus pais decidiram fazer a uma guerrilheira soviética de 18 anos que morreu na Segunda Guerra Mundial. Ela explodiu um depósito de munições dos alemães, foi presa, torturada e enforcada pelos alemães. Ela se chamava Zoia, um nome que é comum na Rússia”. Zoia viveu muitos anos na antiga União Soviética, onde Luis Carlos Prestes e Maria Prestes viveram anos exilados, e foi alfabetizada em russo. Ela também contou um pouco da história da Coluna Prestes, da qual seu pai foi principal protagonista. “Uma das demandas da Coluna era justamente a educação pública, gratuita e de qualidade. E nossa luta pela educação não está desvinculada da luta pela terra. Uma das lições que trago da minha trajetória é nunca desistir da luta. Estudar e conhecer é fundamental para essas lutas e para as nossas vidas”.

Em seguida, sem terrinha de vários assentamentos do Estado falaram um pouco dos problemas que enfrentam em seu cotidiano escolar. Em praticamente todos os relatos, um problema apareceu de modo recorrente: as más condições das estradas no interior e como isso impacta o transporte escolar. Felipe, de Nova Santa Rita, disse que uma das principais dificuldades que sua escola enfrenta são as estradas ruins para o ônibus do transporte escolar. Vitor Angelo de Bortoli, de Pontão, contou que sua escola está organizada em núcleos de pesquisa e núcleos de trabalho que têm na agricultura familiar um dos principais temas de atuação. Além dos problemas envolvendo o transporte escolar, as crianças expressaram sua vontade de seguir vivendo no campo e defenderam a melhoria das condições gerais de infraestrutura e de equipamentos das suas escolas.

Maria, do Assentamento Ibicuí, fez a leitura da carta dos sem terrinha, por “Terra, Escola e Dignidade”, que foi entregue para representantes da Assembleia Legislativa (deputado Edegar Pretto e deputada Sofia Cavedon, ambos do PT), representantes do Ministério Público Estadual, da Defensoria Pública, do Conselho Estadual de Educação, do CPERS Sindicato e de outras entidades que participaram do ato. Na carta, as crianças defendem o direito a uma educação pública de qualidade no campo, a melhoria das condições das estradas e da infraestrutura para o funcionamento das escolas, acesso à internet, instalação de laboratórios, melhores salas de aula e o direito a ter um currículo que dialogue com a realidade do campo. Segue abaixo a íntegra da carta:

Carta das Crianças Sem Terrinha

 

“Nessa historia nos somos os sujeitos, lutamos pela vida e o que é de direito!”

Nós, crianças Sem Terrinha do Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra/RS, juntamente com toda a família do MST, neste 19º Encontro Estadual, debatemos o Direito à Infância, a educação pública de qualidade e a realidade das Escolas do Campo nas áreas de Reforma Agrária.

Somos filhos e filhas de uma história de luta. Nossos pais nos ensinaram que a terra onde produzimos nossos alimentos, a casa onde moramos a escola onde estudamos foram conquistados com muita luta coletiva. Completamos 25 anos de realização de Encontros das Crianças Sem Terrinha.

Ainda não temos as condições necessárias nos nossos assentamentos; nosso direito a escola de qualidade é negado!

Nossa vida escolar é prejudicada pelas más condições das estradas que quando chove o transporte escolar não circula. Por vezes ficamos 3 dias da semana sem aulas em vista das situações das estradas. Também faltam infraestrutura nas escolas e não temos biblioteca, laboratórios e até sala de aula; não temos rede de internet, chove dentro da escola.

Os nossos assentamentos não recebem manutenção nas estradas o que acarreta a perca da produção; faltam incentivo a espaços culturais, esportivos, postos de saúde, bem como, falta incentivo para a produção orgânica e agroecológica.

Queremos viver no campo e para isso a escola precisa ter condições de estudo e ensino com qualidade e que o trabalho e a produção do campo seja valorizado.

Nossas escolas necessitam ter melhores condições:

– Reformar os prédios existentes e construir quadras de esportes (cobertas) para termos espaço para diversas atividades; refeitórios; aumentar as salas de aula pois não dão conta da demanda

– Garantir um currículo que dialogue com a realidade do campo, que valorize o trabalho camponês e que desenvolva as diversas linguagens artístico- culturais;

– Ter formação para os educadores das escolas do Campo;

– Garantir a contratação de professores para suprir a demanda de o trabalho nas escolas, bem como o quadro de funcionários: secretária, bibliotecário;

– Rever o valor de contrato de transporte escolar com as prefeituras municipais; Fiscalizar as condições do transporte escolar; aumentar a linhas de transporte;

– subsidiar projetos de experiência agroecológica e cuidado com o meio ambiente;

Sem Terrinha em Movimento: por terra escola e dignidade!

Por Sul21

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