STF reafirma direito da gestante à estabilidade; Bolsonaro é contra
Enquanto o candidato do PSL diz que contratar mulher custa caro para empresários, decisão da Justiça reforça direito previsto na Constituição
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Os ataques aos direitos trabalhistas, em especial aos das mulheres, fizeram uma empresa questionar até um direito previsto na Constituição brasileira: a concessão à estabilidade do emprego de uma trabalhadora que descobriu a gravidez após ser demitida.
Em decisão praticamente unânime, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu por 8 a 1, na última quarta-feira (10), que a gestante tem, sim, o direito de ter estabilidade a partir da confirmação da gravidez, e não somente após a comunicação ao empregador.
“Essa decisão do STF demonstra que a gente está no momento de ataques aos nossos direitos fundamentais. Depois da reforma Trabalhista, os magistrados tomaram lados, os mais conservadores saíram do armário”, diz Mariana Salinas Serrano, advogada trabalhista e sindical e mestre em direito do trabalho pela PUC-SP.
“Ter uma decisão a favor do direito da gestante num momento em que temos um candidato a presidência da República, como Jair Bolsonaro, que defende que mulher deve ganhar menos porque engravida é um indicativo de valores democráticos”, completa a advogada.
Mulheres e a economia
Bolsonaro disse no começo do ano, em entrevista ao Zero Hora, que não é justo a mulher ganhar igual ao homem, já que ela engravida.
“Eu tenho pena do empresário no Brasil, porque é uma desgraça você ser patrão no nosso país, com tantos direitos trabalhistas”, disse o presidenciável citando a mulher que começa a trabalhar, depois engravida e ainda tem licença maternidade, disse o candidato ao jornal gaúcho.
Para a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT, Juneia Batista, além do machismo institucional, esta posição de Bolsonaro mexe diretamente com a economia do país e exclui milhares de mulheres do mundo do trabalho.
“Como é que um cara que quer ser presidente da República quer aumentar ainda mais a desigualdade entre homens e mulheres?”, indaga Juneia.
As mulheres são a maioria da população, estudam mais e ganham 42% menos do que os homens. Essa desigualdade entre homens e mulheres prejudica a economia nacional, de acordo com pesquisa da Insper.
Segundo o levantamento, a cada 10% de aumento da diferença salarial entre os gêneros, significa uma redução de 1,5% na expansão do PIB per capita dos municípios do Brasil.
STF constata direito já existente
Para Juneia, a decisão do STF “é uma constatação do que já tínhamos na legislação trabalhista, na Constituição Federal de 1988 e de vários acordos internacionais, como a convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata da eliminação de toda forma de discriminação no trabalho por motivos de raça, cor, sexo, religião, opinião política, ascendência nacional ou origem social, e promoção da igualdade de oportunidades e de tratamento”.
De acordo com a Constituição, lembra Juneia, é “vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto”.
Direito é fundamental para saúde
Segundo a diretora executiva da CUT, Juliana Salles, a estabilidade da gestante é fundamental para a saúde da mãe e do bebê. Como médica, ela diz que uma trabalhadora que engravida precisa de suporte emocional e físico para que possa lidar com a transformação do corpo e de sua vida.
“Ela precisa desta tranquilidade econômica de poder contar com o salário para manter seu filho e até mesmo a gestação. O risco de estresse de não ter condição de sustentar o filho, pode causar transtornos piores para a mãe, complicação na gestação e até na vida desta criança”, alertou Juliana.
Contratos alternativos não garantem direito de estabilidade
Os novos contratos de trabalho que a reforma trabalhista garantiu para os empresários, como intermitente, autônomo e o temporário não garantem o direito da estabilidade da gestante para as trabalhadoras. Também existem profissões que não têm vínculos empregatícios e são consideradas liberais, como é o caso de médicas.
É uma profissão que geralmente é terceirizada ou pessoas jurídicas (PJs) ou autônomas. Juliana disse à reportagem do PortalCUT que ela tem várias colegas de trabalho que passam por problemas com a gestação ou com os próprios bebês por não terem esses direitos garantidos. Ela contou a própria experiência com a primeira gravidez.
“Como profissional liberal e pessoa jurídica eu precisei fazer residência e trabalhar 60 horas por semana e já sabia que não ia ter a estabilidade e o estresse desta insegurança trouxe sequelas para o meu primeiro bebê”, contou emocionada a médica que tem dois filhos.
“Ele não ganhava peso e meu desespero era ele nascer fraquinho e ter complicações por causa disso. Como mãe gerou uma ansiedade grande de não ter feito o melhor para o meu filho. Foi só eu ficar de repouso que ele se recuperou. Com os nove meses de idade ele já tinha o tamanho que precisava ter ”, contou Juliana.
Sindicatos também podem garantir direitos
Uma alternativa de algumas categorias é colocar o direito de estabilidade das gestantes na Convenção Coletiva ou no Contrato de Trabalho, negociados entre sindicatos e empresas. Segundo Juneia, é fundamental ter mulheres na direção dos sindicatos para que elas possam representar os direitos femininos nas mesas de negociação.
O Sindicato dos Bancários de São Paulo é um exemplo. As bancárias conquistaram uma ampliação da estabilidade no Acordo Coletivo de Trabalho (ACT).
“Só com mulheres no movimento sindical é que iremos garantir estes e outros direitos específicos para as mulheres, porque são elas que vivem esta realidade. As trabalhadoras precisam estar nas mesas de negociação para a desigualdade entre homens e mulheres acabarem”, destacou a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT.
Por CUT