Trabalho, no Brasil de Bolsonaro, só precarizado e com salário baixo
Alta do emprego contrasta com a queda da renda e com a informalização em patamar histórico. Pelo quarto ano seguido, Brasil está entre os dez piores países para trabalhar
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A lenta recuperação dos postos de trabalho no país continua ocorrendo às custas da precarização das vagas oferecidas e da queda da renda de trabalhadores e trabalhadoras. É o que mostram os números divulgados nesta semana – tanto os da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua quanto os do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
Os dados da Pnad Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam que a taxa de desemprego brasileira atingiu 9,8% no trimestre encerrado em maio, ante 10,5% no período encerrado em abril. Há um ano, a taxa de desemprego estava em 14,7%. O total de desempregados foi estimado em 10,6 milhões, enquanto os ocupados somam 97,5 milhões.
Já o rendimento médio anual acumula perda de 7,2% em 12 meses, em relação direta com o avanço da precarização. O número de empregados no setor privado sem carteira assinada cresceu 23,6% em 12 meses e chegou a 12,8 milhões de pessoas. O ritmo é praticamente o dobro do apresentado pelos trabalhadores com carteira: alta de 12,1%, para 35,5 milhões de pessoas.
No setor público, o emprego sem carteira cresceu 25% em um ano. O trabalho por conta própria subiu 6,4%, enquanto o número de empregados sem CNPJ aumentou 29,4%. A taxa de informalidade corresponde a 40,1% da população ocupada (39,1 milhões de trabalhadores informais), ante 40,2% no trimestre anterior e 39,5% no mesmo período de 2021. A cada dez trabalhadores no país, quatro atuam sem qualquer proteção legal.
“Essa queda do rendimento no anual é puxada, inclusive, por segmentos da ocupação formais, como o setor público e o empregador” destaca Adriana Beringuy, coordenadora de Pesquisas por Amostra de Domicílios do IBGE. “Até mesmo dentre os trabalhadores formalizados há um processo de retração.”
Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, também revelam perdas salariais. A despeito da alta de 40% do número de vagas com carteira assinada em comparação a abril, o salário médio de admissão caiu 0,94% em comparação ao mês anterior.
Em um ano, a queda é ainda mais acentuada. Em maio do ano passado, o salário médio de admissão era 5,5% maior. Nos cinco meses de 2022, apenas em abril o salário de admissão registrou aumento. Em 2022, o rendimento registra queda de 2,6%.
Já o número de trabalhadores brasileiros, com e sem carteira assinada, que recebiam até um salário mínimo no primeiro trimestre de 2022, chegou a 38,22% do total da força de trabalho. Os dados são de um levantamento do economista Lucas Assis, da Tendências Consultoria, divulgados pelo portal Uol. Há quatro anos sem aumento real (acima da inflação), o salário mínimo em 2022 está fixado em R$ 1.212.
Conforme o levantamento, houve alta na comparação com o mesmo período de 2018, fim da gestão do usurpador Michel Temer, quando 30,09% dos trabalhadores ganhavam o mínimo. No último trimestre de 2015, sob a presidenta legítima Dilma Rousseff, apenas 27,6% dos trabalhadores recebiam um salário mínimo.
Das 4,6 milhões de vagas de trabalho criadas entre 2016 e 2022, afirma o economista, 76% são informais. “Essa geração de vagas deu-se pela criação de 7 milhões de vagas com rendimento mensal de até um salário mínimo e destruição de 2,4 milhões com rendimento superior a um salário mínimo”, explica Assis.
Entre os que têm carteira assinada, o total de trabalhadores que ganham o mínimo foi de 14,1% em 2018 para 22,5% no primeiro trimestre deste ano. Para os trabalhadores informais, o salto foi de 53,5% para 61,7%.
País dos “bicos” para sobreviver
“Faltam políticas adequadas de proteção aos desempregados, além de intermediação da mão de obra pública para atender esses trabalhadores”, diz a técnica da subseção da Central Única dos Trabalhadores do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (CUT-Dieese), Adriana Marcolino, no Portal da CUT.
“Parte significativa dos desempregados são trabalhadores informais que não tiveram acesso ao seguro-desemprego e muitos sofrem com o desemprego de longa duração”, prossegue Adriana. “Por isso, eles buscam qualquer tipo de ocupação, particularmente a chamada ‘viração’, o bico, algo que gere algum tipo de renda para a sobrevivência dos trabalhadores, trabalhadoras e suas famílias.”
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Não à toa, há quatro anos seguidos o Brasil está entre os 10 piores países do mundo para se trabalhar, em uma lista de 148 países divulgada nesta semana pela Confederação Sindical Internacional (CSI). Em 2022, o país está lado a lado com Bangladesh, Belarus, Colômbia, Egito, Filipinas, Miamar, Guatemala e Suazilândia, na África Central.
Conforme o levantamento, a “reforma trabalhista” de Michel Temer fez a negociação coletiva entrar em colapso no Brasil, com uma redução drástica de 45% no número de acordos coletivos celebrados. Durante o evento online de apresentação da pesquisa, a representante da CUT, Rosana Sousa Fernandes, fez um relato da situação no Brasil.
“O Brasil nunca esteve entre os melhores países para se trabalhar, mas nunca estivemos entre os 10 piores. A deterioração a gente percebe desde 2017, com a perda da qualidade do trabalho desde o processo que passamos com o golpe de 2016 contra a ex-presidenta Dilma Rousseff, com ataques fortes aos nossos direitos que haviam sido conquistados com muita luta, e que agora vêm sendo retirados com muita facilidade”, conta Rosana, também secretária-Adjunta de Combate ao Racismo da central sindical.
À “reforma” de Temer, que autorizou a terceirização de qualquer atividade, sem restrições, somaram-se os ataques bolsonaristas às organizações dos movimentos sindicais. As tentativas de enfraquecer a luta dos trabalhadores, limitando as formas de financiamento, fizeram desabar o número de reajustes reais conquistados em convenções coletivas.
“Da pandemia para cá, só em 15% das negociações coletivas os trabalhadores conseguiram aumentos reais de salários, e ainda assim foram as mais organizadas, como a do sistema financeira, que tem uma organização nacional”, afirma a dirigente sindical.
Para Rosana, a melhoria das condições do trabalho no Brasil passa pela eleição de um novo governo e de um novo Congresso Nacional. “É super importante que sejam eleitos políticos com alguma responsabilidade com os direitos trabalhistas”, defendeu. “Nós também precisamos nos organizar, enquanto classe trabalhadora, para reivindicar e pressionar pelo fim dessa reforma, que enfraquece a luta dos trabalhadores.”
Lula: mais empregos e menos inflação e fome
Nesta quarta-feira (29), ao ser questionado sobre as primeiras ações no governo caso seja eleito mais uma vez presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva disse que tem, como obsessão, acabar com a fome, o desemprego e a inflação, os flagelos de Jair Bolsonaro e seu ministro-banqueiro Paulo Guedes.
“Para mim, é obsessão a gente vencer o desemprego. Reduzir a inflação é uma obsessão. A gente fazer com que as pessoas tenham comida é uma obsessão. Quem tem fome não pode esperar”, disse em entrevista à Rádio Educadora AM, de Piracicaba (SP).
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Divulgado há duas semanas, o plano de governo da chapa Lula-Alckmin prevê a retomada da indústria nacional, a implantação de uma política de reforma agrária com o estímulo à economia solidária, criativa e verde, além de uma reformulação do Bolsa Família e da valorização do salário mínimo, como forma de retomar o crescimento econômico do Brasil.
“O Brasil precisa criar oportunidades de trabalho e de emprego”, destaca o documento Diretrizes para o Programa de Reconstrução e Transformação do Brasil. “Para isso, propomos a retomada dos investimentos em infraestrutura e em habitação; a reindustrialização em novas bases tecnológicas e ambientais; a reforma agrária e o estímulo à economia solidária, à economia criativa e à economia verde inclusiva, baseada na conservação, na restauração e no uso sustentável da nossa biodiversidade.”
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Da Redação, com informações da CUT e do IBGE