Trump fecha EUA para vôos do Brasil e dá mais um golpe em Bolsonaro

Presidente norte-americano atropela o aliado brasileiro, preocupado com perda de popularidade devido ao descontrole da pandemia no país. Aos poucos, nosso país consolida a imagem de pária mundial da Covid-19

Arte sobre foto de Alan Santos/PR

Trump e Bolsonaro, submissão e prejuízo.

“Brasil acima de tudo, mas America’s first” (América primeiro). Assim o presidente norte-americano, Donald Trump, se comporta sempre que pesa seus interesses em relação ao “aliado número um”, Jair Bolsonaro. Neste domingo (24), a Casa Branca anunciou o que Trump antecipara durante a semana: a proibição da entrada no país de pessoas chegadas do Brasil, por conta do risco de contágio pelo coronavírus.

“Hoje, o presidente tomou uma ação decisiva para proteger nosso país suspendendo a entrada de estrangeiros que estiveram no Brasil durante o período de 14 dias antes de buscarem admissão nos EUA… A ação vai ajudar a garantir que estrangeiros que estiveram no Brasil não se tornem uma fonte adicional de infecções em nosso país”, disse o comunicado da secretária de imprensa da Casa Branca, Kayleigh McEnany.

Mais cedo, o conselheiro de segurança nacional norte-americano, Robert O’Brien, antecipara a medida ao programa ‘Face the Nation’, da rede CBS: “Esperamos que seja temporário, mas, devido à situação no Brasil, tomaremos todas as medidas necessárias para proteger o povo americano”.

Em 28 de abril, Trump já havia mandado um recado para Bolsonaro. “Eles [os brasileiros] estão tendo problemas… Não desejamos que pessoas venham aqui e infectem outras pessoas. O Brasil está tendo problemas, sem dúvida”, afirmou em reunião aberta à imprensa. Na mesma ocasião, chegou a sugerir que o governador da Flórida, Ron DeSantis, presente na entrevista, adotasse medidas para restringir a entrada de brasileiros pelo aeroporto de Miami.

Há alguns dias, Trump insinuou que teria batido o martelo. “Eu me preocupo com tudo, eu não quero pessoas vindo para cá e infectando nosso povo”, disse o americano a jornalistas na Casa Branca, referindo-se ao caso brasileiro.

Abatido pela realidade do descontrole da pandemia nos Estados Unidos, com mais de 22 mil mortos e 360 mil infectados, Trump recebeu uma dura notícia na sexta (22): pesquisa da Fox News Poll mostrou que 48% dos eleitores americanos pretendem votar no democrata Joe Biden, e apenas 40% no republicano, em um cenário com apenas 11% de indecisos. Trump teve que decidir por sacrificar seu aliado mais subserviente para evitar um desgaste ainda maior no ano em que disputa a reeleição.

Política de submissão fracassada

No fim da noite de domingo, o Ministério das Relações Exteriores divulgou nota a respeito da decisão americana. No comunicado, mencionou “critérios técnicos” e afirmou que “Brasil e Estados Unidos têm mantido importante cooperação bilateral no combate à Covid-19”, citando a doação de equipamentos médicos. Mas apesar da calculada tranquilidade no Itamaraty, o Brasil se isola mais a cada dia como país sem voz de comando no combate à pandemia.

Para o ex-ministro de Relações Exteriores Celso Amorim, novamente o presidente brasileiro foi passado para trás pelo homólogo americano. “É a demonstração cabal do total fracasso de uma política externa de absoluta submissão à Washington. Nenhuma recompensa. Nenhum toma lá, da dá. É só toma lá e não dá cá”, resumiu o chanceler do governo Lula na coluna ‘Radar’ da revista ‘Veja’.

Outro ex-embaixador, Rubens Ricupero, já havia alertado que o Brasil se tornava um país pária. “Parece cada vez mais claro que o Brasil se encaminha celeremente para se tornar o epicentro mundial da pandemia”, declarou em entrevista.  “Epicentro no sentido de país onde o crescimento da curva de aumento de casos, de mortes e colapso do sistema hospitalar será de longe o mais grave, em comparação aos demais países”.

Servil submissão a Washington

Desde a posse, Bolsonaro faz gestos ostensivos de submissão a Washington. Alinhou-se à pauta internacional dos Estados Unidos, liberou os vistos de entrada no Brasil para os cidadãos do país e forçou a aproximação entre as famílias presidenciais. Chegou a sonhar com os filhos trocados como embaixadores dos respectivos países.

Ao longo desta pandemia, o brasileiro espelhou discurso e prática de Trump, caminhando com ele ao triste posto de país mais incompetente no controle da doença. O Brasil já ocupa o segundo lugar em número de casos desde sexta (22), quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a América Latina como o epicentro mundial da Covid-19 e fez especial menção ao país.

Mas apesar da propalada amizade entre os dois, Trump, que sempre agiu frontalmente contra os interesses do Brasil quando necessário, comporta-se da mesma forma nesse momento. Ainda no fim de março, os Estados Unidos enviaram 23 aviões cargueiros para retirar, na China, milhões de equipamentos de proteção individual (EPIs) para abastecer seus hospitais. A reação do então ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta foi de perplexidade.

“As nossas compras, que tínhamos expectativa de concretizar para poder fazer o abastecimento, muitas caíram. Entregaram a primeira parte. Na segunda parte, mesmo com eles contratados, assinados, com o dinheiro para pagar, quem ganhou falou: não tenho mais os respiradores, não consigo te entregar. Então, nós voltamos de algo que a gente achava que a gente já tinha, demos um passo para trás”, comentou o agora ex-ministro com jornalistas em entrevista coletiva.

Em 14 de abril, o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, disse que o povo brasileiro poderia contar com os Estados Unidos, mas apenas quando ‘virarmos a esquina’, uma expressão americana referente à melhora do quadro depois de uma situação difícil. “Quando chegarmos lá, o Brasil deveria saber que faremos tudo o que pudermos para ter certeza de que eles têm o que precisam”, comentou Pompeo, reafirmando o “America’s first”.

Tópicos:

LEIA TAMBÉM:

Mais notícias

PT Cast