Meus pais só estão vivos graças a ele, diz estudante no Festival Lula Livre

Na Praça da República, no Centro de São Paulo, mais de 80 mil pessoas participaram do Festival Lula Livre unidas na luta por justiça para o ex-presidente

Ricardo Stuckert

Festival Lula Livre em SP

Albiery Oliveira chorou. Depois de ouvir mais um “Lula livre” do alto do palco montado na Praça da República, já no fim da tarde, não se conteve. “Meus pais só estão vivos e vivendo bem na Paraíba, graças a esse homem”, bradou, em agradecimento à transposição do São Francisco – a obra de integração das águas do Velho Chico com regiões do sertão nordestino expostas a longos períodos de seca.

Albiery, formado em Engenharia Ambientar e Sanitária na Universidade Estadual da Paraíba, é um típico fruto dos tempos de bonança do Brasil governado por Luiz Inácio Lula da Silva. E era um entre os mais de 80 mil cidadãos que com alguma história de reconhecimento desse legado passaram pelo Festival Lula Livre, realizado no domingo (2), em São Paulo.

Renata e Simone também estavam lá. Chegaram cedo de Belo Horizonte e encontraram a praça ainda cheia do lixo acumulado do dia anterior. Não tiveram dúvidas. Procuraram a produção para pedir vassouras e sacos de lixo e, ao lado de companheiros do Coletivo Alvorada – responsável pela faixa amarela gigante que marca os atos por Lula Livre Brasil afora – limparam a praça.

Durante as cerca de oito horas de duração do festival foram encontradas carteiras, celulares e outros objetos que eram entregues à produção. “Esse é o povo de Lula”, afirma Camila Victor, que participou da organização do evento. “Eu queria contar várias histórias sobre o Festival Lula Livre, mas escolhi essa porque ilustra bem o que somos e o que é fazer parte desse momento histórico do nosso país”, relata, emocionada.

“Essa senhora, que saiu de Belo Horizonte para o festival, veio até mim e disse: ‘Moça, estou com um grupo grande e queremos limpar a praça, pode nos ajudar disponibilizando vassouras e sacos de lixo? Não queremos que pensem que fomos nós, apoiadoras do Lula, que fizemos isso com o lugar’.”

O grupo de 10 pessoas pessoas limpou a praça inteira. “E eu chorei. Chorei de emoção por ver como é a nossa gente. Se tem um resumo do que rolou ontem na Praça da República, esse é o mais perto da realidade. É a nossa realidade, a realidade que importa. A realidade que não permite que esse país se torne o país do ódio. A realidade cheia de empatia, de amor, de generosidade. Foi lindo.”

Quem esteve na praça viu alegria, solidariedade, organização. Muita organização. A troca de músicos no palco – cada artista ou grupo conduzia duas ou três músicas – parecia uma bem treinada equipe de revezamento, só que com dezenas de integrantes. Não importava se vinha samba ou rap, baião ou funk, baladas ou hard core, as duas bandas que se revezavam no palco do festival acompanhava tudo com virtuosismo.

“Foi um evento que reuniu milhares de pessoas. Gente do país inteiro. Muitas vieram em caravanas e caronas que saíram vários locais do país”, conta Igor Felipe, coordenador do Comitê Lula Livre. “Não teve registro de ocorrências graves. Teve, sim, arrecadação de alimentos, teve alegria e combatividade nessa forma de luta que é o festival. Milhares de pessoas passaram o dia, se divertiram, trocaram ideias e deram novo impulso para a campanha Lula livre, mas também pela educação e saúde públicas, pela cultura, pelo respeito ao nosso povo e por tudo que estamos perdendo e não aceitamos perder.”

Não por acaso, um dos gritos que ecoavam pela Praça da República era também o de “greve geral”, marcada pelas centrais sindicais, movimentos populares e estudantil para 14 de junho. A greve promete parar o Brasil contra a reforma da Previdência, o desemprego, os cortes de recursos na educação, a retirada de direitos.

O amor inclusivo de Lula

Do palco, era essa mesma energia que emanava. Foram 38 atrações musicais para os mais variados gostos. Teve samba, teve rock, MPB, música romântica, rap, a força dos ritmos nordestinos, da arte feminista, negra, LGBT, do vanguardismo ao popular.

Do outro lado da praça, na Avenida São João, a bailarina Sandra Miyazawa fazia performances aéreas, suspensa por um guindaste, com faixas pedindo Lula livre.

Tocador de vídeo

Uma grande produção montada em cerca de tries meses em nome da luta em defesa de Lula livre, da democracia. E que deixou muita gente sem dormir.

“Ainda estou sobre fortes emoções de ontem”, contou nesta segunda (3) uma das diretoras do evento, a baterista e percussionista Michelle Abu. “Foi realmente muito lindo tudo que aconteceu, toda a movimentação para que tudo acontecesse. E quanto tudo estava dando certo, pra gente foi muito emocionante mesmo.”

Abu acredita que todo o amor envolvido explica o sucesso de um evento desse porte. “Desde o pessoal que estava montando o palco, o pessoal que estava no camarim, aos músicos, aos técnicos de som, todo mundo tinha muita vontade que tudo desse certo”, avalia. “Isso é fundamental. A gente virou madrugada, sempre pensando no que era melhor, no público, em todos que estavam participando. Uma vibração de coisas positivas, de amor.”

O momento, avalia a percussionista, torna ainda mais importante esse tipo de movimento. “Poder levar cultura para a praça, de graça, para as pessoas, uma cultura de altíssima qualidade, é o que o povo está precisando”, diz. “Cultura e política não tem como se separar, é uma coisa só. E pra mim é um prazer imenso fazer isso. Venho de Salvador, de uma cultura onde a música está na rua o tempo inteiro. É como se estivesse realizando um dos meus sonhos: poder fazer arte de graça. Se os artistas pudessem fazer isso sempre, a gente alcançaria mais os pensamentos e os corações de todo mundo. Pra mim foi uma honra e um prazer.”

A luta por Lula, “preso político e o melhor presidente que esse país já teve”, ressalta Abu, explica toda essa energia, todo esse amor. “O Lula mostrou pra gente o quanto é possível um Brasil inclusivo. Eu que venho do Nordeste e trabalho com cultura, senti muito a diferença dos governos dele para os anteriores, para o de agora. Todo mundo que estava ali e muita gente que não estava acredita e precisa de um Brasil mais amoroso, mais inclusivo.”

O muro virou arame farpado

Os artistas que participaram do Festival Lula Livre não receberam cachê. Foram convidados para participar pela causa que, para Daniel Ganjaman, também diretor do evento, deveria ser a pauta de unificação da esquerda no Brasil desde que Lula foi preso.

O produtor musical conta que está acostumado a fazer eventos com essa natureza, em torno de uma causa, seja ela política, social. “Meus amigos artistas estão até acostumados a receber esse tipo de telefonema meu convidando. E é sempre muito delicado quando se trata de causas especialmente políticas e especialmente agora quando estamos vivendo um momento de polarização absurda, super intensa e super radical”, afirma, considerando normal que alguns artistas, por mais que sejam simpáticos à causa, muitas vezes não se sintam à vontade em função de tudo que acontece, como linchamentos em redes sociais.

“O convite é onde consigo desenhar. A partir do time que vai participar você começa a desenhar o que vai ser. Minha ideia era formar uma super banda, num ambiente que artisticamente achasse que iria funcionar.” E conseguiu.

“O lance de chamar artistas de diferentes vertentes musicais e tentar agregar tudo isso dentro de um único evento em prol da causa de Lula livre foi um acerto muito grande tanto da produção quanto da gente que foi atrás dos artistas”, avalia Ganjaman. “A frente que se formou se mostrou muito representativa e isso é o mais importante.”

O produtor relata que viu muito post em redes sociais de gente que não era simpático ao Lula e que iria ao show para ver os artistas. “É um momento que se tem para hackear um pouco o imaginário desse cara e trabalhar isso de uma forma não tão agressiva. Ou talvez tão anacrônica, como a coisa muitas vezes é tratada”, diz.

“As pessoas estão cansadas do formato palanque, caminhão de som em passeata. A gente tem de tentar entrar, acessar o imaginário das pessoas por um outro caminho. E nós que fazemos arte e estamos sendo brutalmente atacados nesse momento pelo governo atual, tem quase o dever de estar se posicionando. Não existe mais um muro pra estar em cima. O muro é uma arame farpado. Se você está em cima do muro, está sujeito a se dar muito mal”, avisa, ressaltando que o Brasil não vive no momento uma normalidade democrática.

Para ele, todo esse caos está diretamente ao fato de Lula estar preso. “É o que o obscurantismo precisa para fazer o que bem entender. Ter o Lula preso diante de um processo absolutamente questionável, sob o ponto de vista de diversos juristas, é algo que abre as porteiras para o inferno que a gente está vivendo.”

O otimismo e o ânimo que estavam no palco por Lula livre, no entanto, fazem parte da perspectiva de Ganjaman. “Acredito que no curto e médio prazo a coisa vai tomar um corpo. A gente está vivendo um momento em que a classe artística está acuada, está tudo sendo destroçado. Mas é sempre nesses ambientes mais críticos que a gente consegue ter uma articulação mais sólida e movimentar a coisa em prol de um bem comum, que atenda todo mundo.”

Quem foi

  1. Aíla
  2. André Frateschi e Banda
  3. Anelis Assumpção
  4. Arnaldo Antunes
  5. BaianaSystem
  6. Bia Ferreira e Doralyce
  7. Bixiga 70
  8. Chico César
  9. Chico Chico e Duda Brack
  10. Criolo
  11. Dead Fish
  12. Drik Barbosa
  13. Ekena
  14. Emicida
  15. Everson Pessoa
  16. Fernanda Takai
  17. Filipe Catto
  18. Francisco El Hombre
  19. Ilu Obá De Min
  20. Isaar
  21. Jorge du Peixe e Lúcio Maia
  22. Junio Barreto
  23. Junu
  24. Lirinha
  25. Márcia Castro
  26. Mc Pôneis
  27. Mistura Popular
  28. Mombojó
  29. Odair José
  30. Otto
  31. Preta Rara
  32. Rael
  33. Slam da minas
  34. Soledad
  35. Thaíde
  36. Tulipa
  37. Unidos do Swing
  38. Zeca Baleiro

Por Rede Brasil Atual

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