Artigo: Privatização da Eletrobras, tiro no programa nuclear, por Íkaro Souza

“A equipe de Bolsonaro trabalha arduamente para concretizar aquele que poderá vir a ser o crime do século, a privatização da Eletrobras”, denuncia Souza, em artigo

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Usinas Termonucleares de Angra I e Angra II, além de Angra III, estão sob ameaça, aponta Souza

No ano em que se comemora o bicentenário da independência do Brasil os brasileiros e brasileiras travam uma luta decisiva contra o projeto de recolonização em curso no país. Movimentos populares, democratas e patriotas se unem em uma ampla frente tendo como núcleo o ex-presidente Lula, visando isolar e derrotar o governo de traição nacional de Jair Bolsonaro nas eleições de outubro. Porém, é preciso lembrar que Bolsonaro ainda governa o país e que a oligarquia financeira e a maioria fisiológica no congresso nacional aproveitarão até o último minuto de seu mandato para saquear o país tornando ainda mais difícil a reconstrução nacional.

Incapaz de apresentar qualquer solução para os graves problemas do país e do povo, sem nenhum projeto de retomada do crescimento econômico, sem nenhuma proposta de superação da estagnação e da desindustrialização que jogam no desemprego e na precarização a maioria da população, sem organização política nem mesmo para dar prosseguimento a sua agenda ultraliberal de reforma administrativa e tributária no parlamento, a equipe de Bolsonaro trabalha arduamente para concretizar aquele que poderá vir a ser o crime do século, a privatização da Eletrobras.

Mesmo com o ministro Vital do Rego demonstrando, com fatos e dados, que a privatização da Eletrobras, além de todos os prejuízos ao país e aos consumidores, significaria um desfalque de, no mínimo, R$ 63 bilhões, o Tribunal de Contas da União chancelou a primeira parte do processo da privatização. Diante dos argumentos irrefutáveis apresentados pelo Ministro Vital do Rego os demais integrantes da corte não tiveram outra opção que não concordar que o governo havia simplesmente desconsiderado uma componente fundamental na precificação do Valor Adicionado à Concessão. Porém o tribunal inovou, pois ao constatar uma irregularidade, ao invés de simplesmente determinar que esta fosse sanada, preferiu apenas “recomendar” que o Ministério das Minas e Energia corrigisse o erro.

Mas os danos da privatização da Eletrobras vão muito além do “erro” apontado pelo TCU. A Eletrobras é a responsável pela operação das únicas usinas nucleares brasileiras, as Usinas Termonucleares de Angra I e Angra II, além de Angra III, cujas obras estão paralisadas desde 2017, através de sua subsidiária Eletronuclear. Como a constituição estabelece que as atividades nucleares são monopólio da União a Eletronuclear, responsável pela geração de cerca de 2% da energia produzida no país deverá permanecer estatal. Para isso seria necessário que a União indenizasse a Eletrobras em R$ 12,5 bilhões pela perda daquele ativo.

Diante dessa tremenda dificuldade o governo elaborou uma esdrúxula engenharia societária onde a Eletrobras privada permanecerá como detentora de quase 70% do capital da Eletronuclear e será responsável pela maior parte do investimento necessário para a conclusão da usina de Angra III, estimados em pelo menos mais R$ 16 bilhões.

Ou seja, para privatizar a Eletrobras o governo Bolsonaro coloca a única empresa de geração de energia nuclear do país, responsável pelo financiamento de todo o programa nuclear brasileiro, nas mãos de um ente privado, provavelmente controlado por capital estrangeiro. Por mais que a Eletronuclear formalmente continue como uma empresa estatal, o fato inescapável é que a maior parte do capital dessa empresa será de propriedade privada, algo terminantemente vedado pela constituição.

Mas os riscos não param por aí. A modelagem do governo para a Eletronuclear prevê que todo o processo de contratação das obras e equipamentos para Angra III passem por um órgão chamado COANGRA, com participação paritária da União e da Eletrobras privatizada e que essa mesma Eletrobras privatizada tenha o direito de indicar o diretor financeiro da Eletronuclear. Ou seja, uma empresa privada, provavelmente controlada pelo capital estrangeiro terá acesso a todo o projeto e poderá mesmo definir os fornecedores da maior usina nuclear brasileira, além de subtrair dos próximos presidentes da república o direito de indicar nada menos que o diretor financeiro da Eletronuclear, sustentáculo do programa nuclear brasileiro.

O Brasil construiu, apesar de todo o boicote das grandes potências internacionais, um programa nuclear próprio, autônomo, completo e pacífico. Gerações de cientistas e engenheiros brasileiros, sob o comando da marinha e do Brasil e com inestimável e insubstituível participação da Eletrobras colocaram o Brasil no seleto grupo de nações que dominam todo o ciclo nuclear, da mineração do urânio à produção do combustível nuclear e a produção de energia, fármacos e outros produtos fundamentais para a sociedade moderna.

Tudo isso está ameaçado pelo governo de destruição nacional de Bolsonaro. Mesmo segredos industriais cobiçados, como as ultracentrífugas desenvolvidas pelo Brasil estão ameaçados, além da própria continuidade do programa nuclear brasileiro, pois se a Eletrobras privatizada resolver simplesmente abandonar sua participação na Eletronuclear não haverá nenhuma garantia de sustentabilidade econômica para nossas usinas nucelares e para nosso programa nuclear. A própria segurança das instalações nucleares brasileiras estará em risco.

Ainda há tempo de parar essa loucura. A sociedade civil organizada, a academia, as Forças Armadas e a cidadania não podem deixar que o programa nuclear brasileiro seja simplesmente entregue ao capital internacional ou mesmo que seja destruído. É preciso parar Bolsonaro, é preciso parar a destruição da nossa soberania e evitar que tragédias de proporções nucleares venham a atingir o Brasil.

Íkaro Chaves Barreto de Sousa, diretor da Associação dos Engenheiros e Técnicos do Sistema Eletrobras -AESEL

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