Ex-diretor da Conab explica por que a fome voltou no Brasil

Silvio Porto mostra que fome está relacionada ao fim da política de valorização do salário mínimo e ao desmonte de políticas como o Programa de Aquisição de Alimentos

Reprodução

O ex-diretor da Conab Silvio Porto

Em novembro de 2021, quando Jair Bolsonaro anunciou que colocaria um programa chamado Auxílio Brasil no lugar do Bolsa Família, o ex-presidente Lula fez um alerta: o Brasil saiu do Mapa da Fome em 2014 não só por causa do Bolsa Família, mas devido a um grande conjunto de políticas públicas.

O alerta era necessário porque, enquanto criava o Auxílio Brasil, Bolsonaro destruía todas as outras ações que garantiam comida  para os brasileiros. E qual foi o resultado? Hoje, sete meses depois de o atual presidente lançar seu programa, a fome no Brasil está mais alta do que a média mundial, como mostrou estudo do Instituto Gallup. 

Nesta segunda-feira (6), em entrevista ao Jornal PT Brasil, Silvio Porto, ex-diretor da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), explicou quais foram as principais ações que Bolsonaro destruiu e, assim, permitiu que a fome voltasse a castigar o país (assista à íntegra da entrevista no vídeo abaixo).

1. Valorização do salário mínimo  

Segundo Silvio Porto, a principal medida a ser tomada para garantir comida na mesa dos brasileiros é a valorização do salário mínimo. E a razão é simples: com dinheiro no bolso, o trabalhador não passa fome.

Nos governo Lula e Dilma, o salário mínimo teve aumento real (acima da inflação) em todos os anos, chegando a crescer mais de 70%. Já no governo Temer, isso só aconteceu de 2018 para 2019. E, no governo Bolsonaro, isso não aconteceu nenhuma vez (veja gráfico abaixo).

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2. Estoques de alimentos

Essa foi outra ação destruída por Bolsonaro. Com o início do governo Lula, a Conab foi fortalecida e passou a executar importantes ações para a política de combate à fome. Uma delas era a formação do estoque de alimentos.

Quando o preço dos alimentos caía muito, a Conab comprava o trigo, arroz, milho e feijão que os agricultores tinham produzido e, assim, evitava que eles tivessem prejuízo. 

Esses alimentos eram, então, estocados para, quando os preços subissem, o governo colocá-los no mercado, fazendo os preços abaixarem. “Claro que tivemos algumas altas, mas nada comparado ao que se vê hoje”, explicou Silvio Porto.

3. Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)

Outra tarefa que a Conab ganhou nos governos do PT foi o de executar, junto com o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), o PAA, que Bolsonaro rebatizou de Alimenta Brasil em 2021.

Pelo PAA, o MDS (por meio de repasses a estados e municípios) e a Conab (por meio de acordos com associações e cooperativas) compravam alimentos de agricultores familiares e distribuem gratuitamente para creches, escolas, programas sociais e famílias que recebiam o Bolsa Família. Bolsonaro praticamente acabou com os recursos dessa ação.

O programa, que executou R$ 840 milhões em 2012, no ano passado não chegou a R$ 60 milhões. Essa é a situação do PAA hoje, exatamente no momento em que este programa poderia ser parte das soluções em relação ao combate à fome e à insegurança alimentar”, informou Porto.

O que o Brasil precisa fazer para vencer a fome novamente?

Ao ouvir essa pergunta, o ex-diretor da Conab disse que duas ações seriam prioritárias. “Primeiro, a revalorização do salário mínimo e a criação de uma política de emprego no sentido de acabar com a precarização do trabalho”, disse. 

A segunda seria um programa de transferência de renda que atenda às necessidades da população. Bolsonaro gosta de dizer que o benefício da Auxílio Brasil, de no mínimo R$ 400, é maior que o pago antes pelo Bolsa Família. Mas a situação no país até 2015 era outra. 

Hoje, R$ 400 são totalmente insuficientes, em função do custo de vida e da carestia dos alimentos”, ressaltou Silvio Porto.

Além disso, disse Porto, o Brasil precisa fazer com que a produção de alimentos como verduras, frutas, legumes, arroz, feijão, mandioca seja vantajosa. Caso contrário, as plantações de soja, que só servem para exportação, ocuparão cada vez mais espaço, e a produção de alimentos básicos cairá, gerando desabastecimento e preços muito altos.

Por fim, é preciso retomar a reforma agrária. “No nosso país, é escandaloso o nível de concentração fundiária. Um por cento dos estabelecimentos rurais brasileiros detém quase 50% da área, e 50% dos estabelecimentos vinculados à agricultura familiar tem 2,5% da área. Essa é a magnitude do problema e, portanto, não há uma política para tratar da questão seriamente em relação à produção de alimentos no país que não incorpore a temática da reforma agrária como centro da solução”, defendeu.

Da Redação

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