Márcia Lopes: o Brasil precisa debater o desmonte da assistência social

Leia aqui a entrevista da série de reportagens do projeto ‘O PT Faz’ com a ex-ministra de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) do governo de Lula

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O PT Faz é um projeto conjunto entre a Presidência do Partido, a Secretaria Nacional de Assuntos Institucionais, a Secretaria Nacional de Comunicação e a Escola Nacional de Formação do PT com o objetivo de dar visibilidade à atuação dos representantes do PT nos governos e nos parlamentos, estimular e aprofundar a reflexão sobre a atual conjuntura e contribuir para qualificar o necessário debate do partido com a sociedade.

Para municiar os mandatos e filiados do Partido dos Trabalhadores frente aos novos desafios que surgirão nos próximos anos – principalmente nos próximos meses – O PT Faz traz uma série de reportagens com discussões de diversos temas pertinentes à agenda social do Brasil.

O tema desta quinzena é Assistência Social. Para comentar os desmontes, os cortes de recursos públicos e as possíveis estratégias para minimizar esses problemas, conversamos com a ex-ministra de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) do governo Lula e assistente social, Márcia Lopes, que está percorrendo o Brasil apresentando palestras nas Conferências Estaduais de Assistência Social.

Confira a entrevista

 

Quais são os principais desafios da área de assistência social para os próximos anos?

O principal desafio é conseguir manter o que a gente já tinha conquistado. Nos governos Lula e Dilma, nós expandimos o orçamento do ministério do Desenvolvimento Social de R$ 8 milhões em 2003 e para R$ 84 milhões. Agora, o orçamento que deveria ser de R$ 100 milhões está em apenas R$ 52 milhões. Então, houve um corte violento no orçamento. Com isso, já saiu mais de um milhão de famílias do Bolsa Família, tem centros de Referência de Assistência Social (CRAS) sendo fechados, tem Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP) sendo fechado, os restaurantes populares estão sendo fechados, os programas dos governos Lula e Dilma estão paralisados.

Márcia Lopes e Fátima Bezerra

A gente nem tem expectativa de ampliar, porque a gente sabe que esse governo, com a Emenda 95 já congelou por 20 anos o orçamento, mas a gente tem a expectativa e a luta para, no mínimo, manter as nossas conquistas, o que não está fácil.  A gente já tem dados, como os da Fiocruz, por exemplo, que mostram que a pobreza voltou ao índice de 2006 e que a próxima medida talvez volte a 2002. É contra isso que estamos lutando.

Por exemplo, a demanda de cesta básica do CRAS, que era um benefício eventual, agora voltou a ser a grande demanda das famílias. Ou seja, é a alimentação, uma situação que nós já tínhamos superado. A questão da fome voltando. Quem trabalha na área declara que é isso que estamos vivendo de novo, a volta da fome, da pobreza, da insegurança alimentar, da insegurança de renda. O Bolsa Família, por exemplo, é uma renda complementar, mas estamos em um país com quase 13 milhões de desempregados, só quando você tem um salário é que ele faz uma complementação importante de renda.

Qual o contexto e o objetivo das conferências de assistência social que estão ocorrendo pelo Brasil?

As conferências como espaço de controle social e deliberação de futuras propostas para cada política pública estão garantidas na Constituição de 1988 e na Lei Orgânica. No caso da política pública de assistência social, a cada dois anos em nível federal, estadual e municipal, são realizadas as conferências para avaliar o que foi feito, o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), avaliar os impactos e resultados e deliberar sobre novas propostas para os próximos dois anos.

O que acontece é que, no nível federal, o órgão máximo de deliberação é o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), vinculado ao atual Ministério da Cidadania, que era o antigo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), onde eu trabalhei no governo Dilma por cinco anos. Então, 2019 é ano de conferência, mas o Ministério e o governo federal se negaram a participar, a financiar e a cumprir a responsabilidade deles em relação à realização da Conferência Nacional.

A questão da fome voltando. Quem trabalha na área declara que é isso que estamos vivendo de novo, a volta da fome, da pobreza, da insegurança alimentar, da insegurança de renda.

A 12ª Conferência que deveria ser convocada pelo CNAS foi desconvocada. Nós, militantes da área, temos uma Frente Nacional em defesa do SUAS e da Seguridade Social, e junto com a sociedade civil do CNAS, junto com mais de 300 entidades, chamamos e convocamos uma Conferência Nacional Democrática de Assistência Social. Ela vai acontecer nos dias 25 e 26 de novembro, em Brasília, na UNB. Assim, nós passamos a estimular que os estados e municípios fizessem suas conferências, e, de fato, todos vão fazer.

Por ter sido ministra e uma das coordenadora da implantação do SUAS no Brasil, eu fui chamada para fazer a palestra em onze estados. Eu já fui pra Sergipe, Rio Grande do Norte, estou em Tocantins, semana que vem vou para o Espírito Santo, depois Alagoas, Piauí, Amazonas, Bahia, Maranhão, entre outras. O tema da conferência é “Assistência Social: direito do povo com financiamento público e participação social”. Nós estamos discutindo nas conferências o que aconteceu depois do golpe de 2016, o impacto dos desmontes nas políticas públicas, e como é para gente enquanto sociedade e trabalhadores como a gente tem que reagir, se organizar e resistir, que estratégias a gente tem que montar. É esse o contexto das conferências.

O governo federal já extinguiu o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), agora fez diversas mudanças no Conselho Nacional dos Direitos da Criança (Conanda) na área da infância. Ele tem essa postura de não reconhecer o controle social e a participação da população nas decisões em relação às políticas públicas, por isso é importante levar essas discussões pelo Brasil.

Como os governos municipais e estaduais podem ajudar na questão de minimizar os efeitos dos desmontes?

Em nível nacional, existe uma lei federal, a própria LOAS, a lei do SUAS, que estabelece que as conferências aconteçam a cada 4 anos como ordinário e a cada 2 anos como extraordinário. Mas isso nos governos Lula e Dilma, a gente nunca questionou se era ordinário ou extraordinário, era a cada 2 anos e pronto. Agora, o governo federal disse que não tinha obrigação de chamar, por ser extraordinário.

Já no nível municipal e estadual existem as leis próprias da assistência social e são leis que dizem que devem realizar as conferências. Alguns estados resistiram, mas a sociedade civil teve um papel muito importante nesse processo. E nós, junto com o Fórum Nacional dos Trabalhadores, o Fórum Nacional de Usuários, a Frente em Defesa do SUAS, o Conselho Federal de Serviço Social, o Conselho Federal de Psicologia e uma série de entidades opinamos e defendemos a realização das conferências. Nós temos representantes em cada estado e fomos organizando isso, porque enxergamos a necessidade dessas discussões. Uma grande parte dos municípios também estão chamando as conferências. E também temos os campos de esquerda que estão sempre apoiando essas iniciativas.

Da Redação da Agência PT de Notícias

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